A floresta deve ser considerada como um “ativo crucial” de Portugal, com um papel estratégico na recuperação económica do país e no desenvolvimento do interior. Esta é uma das mensagens realçadas na Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030, um documento elaborado pelo consultor do Governo, António Costa Silva, e apresentado no final de julho.
O documento considera a “Coesão do Território, com a inclusão do interior na economia nacional, a dinamização da Agricultura e da Floresta e a transformação da Paisagem” como um dos 10 eixos estratégicos para a retoma económica. Neste âmbito, a valorização da floresta, com a remuneração pelos diferentes bens e serviços do ecossistema, é apontada como uma aposta de futuro para aumentar o rendimento dos proprietários e a proteção destas áreas – tendo em conta, sobretudo, que a floresta portuguesa é maioritariamente privada.
“A essência da política florestal em Portugal deve ser baseada numa simbiose entre a floresta de conservação e a floresta de produção, sendo que a prioridade é a conservação, a sustentabilidade ambiental e a minimização de riscos de incêndio”, pode ler-se na Visão Estratégica. É ainda sublinhada a necessidade de “criar uma floresta para o futuro, mais ordenada, biodiversa e resiliente, conjugada com um mosaico agrícola, agroflorestal e silvopastoril, capaz de prestar diversos serviços ambientais e de sustentar as atividades económicas que lhes estão associadas, para além de reduzir significativamente a severidade da área ardida”.
Esta Visão Estratégica visa orientar um futuro Plano de Recuperação do Governo a ser apresentado à Comissão Europeia, como forma de alocar os fundos europeus disponíveis. Nesse sentido, uma das linhas de investimento propostas no documento está direcionada para a dinamização de clusters no Interior do país. Vários destes clusters – que cruzam investigação, empresas e desenvolvimento económico local – estão ligados diretamente à valorização do território e da floresta:
– Bragança, Douro, Castelo Branco, Santarém e Évora: rede de valorização de culturas agrícolas e polos de investigação de riscos biológicos (agrícolas e florestais);
– Elvas: centro de desenvolvimento, promoção e valorização de novas culturas e produtos naturais;
– Montesinho: projeto sustentável de valorização dos recursos naturais da região;
– Vale do Côa: polo de valorização da paisagem e do território;
– Madeira e Açores: promoção como paraísos da biodiversidade, ligados à diferenciação da oferta turística.
O documento defende também investimentos que permitam criar mecanismos de remuneração dos serviços de ecossistemas florestais e agrícolas, sobretudo em áreas de elevado valor ambiental e mais vulneráveis a incêndios rurais e à desertificação. São ainda recomendados incentivos ao restauro de ecossistemas de referência (p. ex. Rede Nacional das Áreas Protegidas) e a ocupações sustentáveis do território (que contribuam para a diversidade e resiliência das paisagens) em zonas áridas, semiáridas e sub-húmidas.
Em termos da revitalização industrial, outro eixo fundamental identificado para a recuperação económica, a floresta tem também um papel a desempenhar. O documento lembra o potencial da valorização da biomassa florestal residual e da bioeconomia de base florestal, a partir de fluxos residuais da indústria da floresta, transformados em matéria-prima à escala regional e local.
O documento de Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030 dá ainda destaque à necessidade de um projeto de investimento alocado especificamente à implementação do Programa de Transformação da Paisagem (PTP). De recordar que o PTP foi criado a 24 de junho deste ano (Resolução do Conselho de Ministros n.º 49/2020), com o objetivo de valorização da paisagem, revitalização dos territórios florestais e aumento da resiliência de territórios sob elevado risco de incêndio rural.
O PTP divide-se em quatro áreas fundamentais de intervenção, com diferentes tipologias e valores de financiamento:
– Programas de Reordenamento e Gestão da Paisagem
Instrumento de ordenamento do território através da paisagem, a aplicar a 20 territórios potenciais, previamente identificados (ver mapa). Cabe à Direção-Geral do Território promover os estudos de apoio a estes 20 Programas de Reordenamento e Gestão da Paisagem (incluindo operações de cadastro), com apoios do Fundo Ambiental. Estes programas pretendem revitalizar atividades que trazem valor aos territórios e identificar novos potenciais a partir dos recursos endógenos de cada região, valorizando produtos, serviços dos ecossistemas, atividades turísticas e de lazer.
Programas de Reordenamento e Gestão da Paisagem
20 territórios potenciais
– Áreas Integradas de Gestão da Paisagem
Modelo de gestão comum para territórios com uma estrutura de propriedade altamente fragmentada, de forma a obter uma escala viável para a gestão e ordenamento. Estas áreas integradas têm como objetivo a gestão e exploração comum dos espaços agroflorestais em zonas de elevado risco de incêndio. Estarão disponíveis instrumentos financeiros (na forma de contratos-programa) para as entidades gestoras destas áreas integradas, o que permitirá garantir uma rentabilidade estável a médio-prazo.
– Programa “Condomínio de Aldeia”
Vocacionado para os pequenos aglomerados populacionais em territórios de floresta e altamente vulneráveis a incêndios, este programa pretende assegurar a gestão de combustíveis (vegetação) em redor dos aglomerados. O objetivo é que os proprietários encarem a gestão de combustível não como mera obrigação, mas como um meio de obtenção de rendimento adicional. Para tal, existirão apoios financeiros (no limite máximo de 25 mil euros por candidatura) aos proprietários que façam a reconversão de áreas florestais para novos fins (desde que sejam projetos comunitários de reconversão, envolvendo todo o aglomerado – “Condomínio de Aldeia”).
– Programa “Emparcelar para Ordenar”
Programa de incentivos ao aumento da dimensão física dos prédios rústicos, com o objetivo de aumentar o grau de gestão e de ordenamento, assim como a viabilidade e a sustentabilidade económica das explorações desenvolvidas nessas áreas.
A Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020-2030 estará sob consulta pública até 21 de agosto. Se tiver uma sugestão sobre as opções de investimento na floresta ou sobre outros temas relevantes para o Plano de Recuperação Económica poderá enviar o seu contributo para o endereço de e-mail plano.recuperacao@pm.gov.pt