As Nações Unidas apresentaram um novo relatório que alerta para a urgência de medidas de proteção e conservação das florestas no mundo. O “Global Forest Goals 2021 Report” traça a evolução das metas globais das florestas 2030, definidas há quatro anos, e alerta para as consequências que a atual pandemia por Covid-19 poderá ter na gestão florestal.
Os tempos que vivemos estão a colocar novos desafios à gestão florestal, decorrentes de ameaças como a pandemia por Covid-19. O alerta foi deixado pelo Secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, num relatório lançado no recente Fórum das Nações Unidas sobre as Florestas, o “Global Forest Goals 2021”, que faz uma avaliação do progresso efetuado em relação às metas globais das florestas, traçadas há quatro anos.
Antes da pandemia, muitos países realizaram grandes esforços para reverter a perda de florestas nativas e aumentar as áreas protegidas destinadas à conservação da biodiversidade, mas alguns desses ganhos estão agora em risco, com tendências preocupantes de aumento da desflorestação em áreas de florestas tropicais primárias, refere o responsável no prefácio do relatório.
O “Global Forest Goals 2021”, disponível online, é, assim, a primeira avaliação sobre a forma como o mundo está a implementar o Plano Estratégico das Nações Unidas para as Florestas 2030, que pretende criar um “futuro mais verde” para todos. O documento, que prevê o aumento da área florestal em 3% até 2030 e indica seis metas globais das florestas rumo a uma gestão mais sustentável, tem o seu progresso avaliado neste relatório.
Apesar dos progressos registados em todas as áreas, a mensagem é muito clara: para cumprir as metas de 2030, os esforços terão de ser ampliados e acelerados. Com efeito, será necessário reforçar medidas para proteger e restaurar as florestas e apoiar os meios de subsistência das comunidades que delas dependem. O Secretário-geral da Organização das Nações Unidas lembra que as florestas têm sido uma “tábua de salvação” para milhões de pessoas durante a pandemia de Covid-19 e que 1,6 mil milhões em todo o mundo dependem diretamente das florestas para obter alimentos, abrigo, energia, medicamentos e rendimento.
Lançado no dia 26 de abril, o “Global Forests Goals Report 2021” baseia-se em 52 relatórios nacionais e 19 contribuições voluntárias que representam 75% das florestas do mundo. Esta informação sobre o progresso para as metas globais das florestas foi complementada com outros dados, principalmente provenientes do “Global Forest Resources Assessment 2020” (FRA 2020).
Ao longo de 98 páginas, o “Global Forests Goals Report 2021” apresenta o panorama das ações em curso em matéria florestal para alcançar as seis metas globais das florestas, desde iniciativas para a inversão da perda de cobertura florestal até ações colaborativas para uma gestão sustentável. Fique a par de alguns dos progressos globais registados em cada área.
1. Reverter a perda de cobertura florestal em todo o mundo através de gestão florestal responsável, incluindo proteção, restauração e reflorestação, aumentar os esforços para prevenir a degradação florestal e contribuir para os esforços globais de enfrentar as alterações climáticas.
Segundo o relatório, Ásia, Oceânia e Europa parecem estar no caminho certo para aumentar a área de floresta. Neste grupo de regiões, esta área cresceu 1,1% entre 2010 e 2020. Do lado oposto, em África e na América do Sul, a área florestal global caiu 1,2%, no mesmo período, regiões em que a desflorestação gerou um decréscimo do contributo das florestas enquanto sumidouro de carbono.
Anualmente, mais de 2 mil milhões de toneladas de dióxido de carbono são absorvidas pelas florestas. O “Global Forests Goals Report 2021” refere que o stock total global de carbono florestal caiu de 668 gigatoneladas em 1990 para 662 gigatoneladas em 2010, principalmente devido à perda de área florestal, valor que se manteve em 2020.
O relatório destaca ainda que vários países implementaram medidas para proteger as florestas, travar a desflorestação e expandir a área florestal legalmente protegida com vista à preservação da biodiversidade, das florestas autóctones e dos serviços dos ecossistemas. Contudo, os dados disponíveis não são suficientes para determinar o progresso alcançado.
2. Aumentar os benefícios económicos, sociais e ambientais baseados na floresta.
Muitas ações estão a ser implementadas para reduzir, ou até mesmo erradicar, a pobreza das pessoas que dependem da floresta, com os governos a tomarem medidas para promover o emprego rural. Contudo, ainda há muito a fazer. Estima-se que 252 milhões de pessoas que vivem em florestas e savanas – na sua maioria (63%) em África, e as restantes na Ásia (34%) e América Latina (3%) – ganhem atualmente menos de 1,25 dólares por dia.
Vários países, como a Alemanha, a Suíça, a Turquia e os Estados Unidos, tomaram medidas que proporcionaram apoios financeiros para fortalecer a silvicultura comunitária e reduzir a pobreza das pessoas dependentes da floresta.
De acordo com os números do FRA 2020, em 2015, o emprego total no sector florestal foi estimado em 12,5 milhões de pessoas. Destes, quase 90% da força de trabalho formal do sector estava na Ásia e em África. Mas, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho, os números globais de emprego no sector florestal provavelmente subestimam o verdadeiro nível de emprego associado à floresta devido à natureza informal de muitas atividades.
3. Aumentar significativamente as áreas de floresta protegidas em todo o mundo e outras áreas de florestas geridas de forma sustentável, assim como a proporção de produtos florestais de florestas geridas de forma responsável.
A maioria das regiões estará no caminho certo para aumentar significativamente a área de floresta protegida até 2030. África, Ásia e América do Sul já ultrapassaram o Objetivo da Biodiversidade de Aichi 11 (proteger pelo menos 17% da área terrestre a nível global até 2020).
Em 2020, quase 18% das florestas do mundo estavam em áreas protegidas legalmente estabelecidas, em comparação com pouco mais de 14% em 2000, embora a parcela de florestas protegidas varie significativamente entre as regiões. O relatório indica ainda que a área de florestas protegidas cresceu em média 3 milhões de hectares por ano, entre 2010 e 2020, embora abaixo dos cerca de 10 milhões de hectares anuais na década anterior. Muitos países, incluindo a Argélia, a Guiné-Bissau, o Sri Lanka e a Tailândia, criaram novas áreas protegidas.
Entre 2010 e 2020, a área florestal ao abrigo de planos de gestão de longo prazo aumentou em 135 milhões de hectares, com especial destaque para regiões como a Europa, mas também a Ásia e a América do Norte e Central. Pelo contrário, em África, na Oceânia e na América do Sul menos de 20% das florestas dispunham dessas estratégias, apesar das recentes melhorias.
Destaque também para o aumento da área certificada da floresta, que se cifrou em quase 700 milhões de metros cúbicos – o equivalente a 38% da produção industrial global de troncos de madeira (rolaria) -, assim como o fornecimento de madeira a partir de florestas certificadas e outras florestas geridas de forma sustentável.
4. Mobilizar mais recursos financeiros para implementar uma gestão florestal responsável e fortalecer a cooperação técnica e científica entre parceiros.
A maioria dos países mobilizou recursos financeiros para implementar uma gestão florestal sustentável. Apesar dos resultados alcançados, o relatório sublinha que o financiamento permaneceu abaixo do necessário para atingir as metas globais das florestas, especialmente nos países em desenvolvimento.
O “Global Forests Goals Report 2021” indica que foram lançadas diversas iniciativas para reforçar o financiamento nesta área, mas “os dados globais sistemáticos sobre fluxos nacionais, privados e filantrópicos para o financiamento das florestas são extremamente limitados”, dificultando as conclusões. Apesar destas limitações, dados compilados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) mostram que a ajuda oficial ao desenvolvimento florestal aumentou gradualmente, passando de menos de 400 milhões de dólares em 2002 para quase o dobro em 2014. O incremento desde 2007 deveu-se em grande parte ao financiamento relacionado com as alterações climáticas.
A cooperação internacional foi fundamental para promover uma gestão sustentável da floresta, fomentar a inovação e as parcerias em tecnologia e ciência. Por exemplo, 44 países relataram que cooperaram diretamente com outros governos e número semelhante indicou que trabalhava por via de processos e organizações intergovernamentais.
5. Promover estruturas de governança para implementar a gestão florestal responsável, incluindo o instrumento florestal das Nações Unidas e melhorar a contribuição das florestas para a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
O “Global Forests Goals Report 2021” destaca também que diversas medidas foram implementadas para melhorar a coerência das políticas e envolver as partes interessadas, as comunidades e os povos indígenas.
Este enquadramento é essencial para os países fazerem cumprir as suas políticas e leis, nomeadamente no combate ao tráfico ilegal de madeira. Um relatório do Banco Mundial de 2013 estimou que o valor anual de mercado das perdas resultantes da exploração ilegal de madeira a nível global ultrapassava os 10 mil milhões de dólares por ano. Mas o potencial destas perdas é bastante maior se considerarmos o valor dos serviços dos ecossistemas, como o armazenamento de carbono, a conservação da biodiversidade ou a filtragem da água.
6. Reforçar a cooperação, a coordenação, a coerência e as sinergias em questões relacionadas com a floresta a todos os níveis, assim como de forma transversal aos sectores florestais e parceiros relevantes.
Dos 52 países envolvidos, 47 declararam que as florestas foram integradas nos seus planos nacionais de desenvolvimento sustentável e/ou estratégias de redução da pobreza. Em quase todos os relatórios nacionais é comum os governos afirmarem que implementaram atividades relacionadas com as florestas em estreita colaboração com a sociedade civil, o sector privado e as autoridades locais.
O trabalho da Collaborative Partnership on Forests (CPF) também contribuiu para os avanços nesta área a um nível internacional. De acordo com o documento, “alcançar a coerência e complementaridade das políticas florestais a um nível internacional dependerá em grande parte da orientação e dos recursos fornecidos pelos órgãos de governo das entidades da ONU e das organizações da CPF, muitas das quais compostas pelos mesmos Estados-membros”. Porém, mais estudos são necessários para explorar áreas adicionais que melhorem as desejadas coordenação e colaboração.