Notícias e Agenda

08.07.2021

Estudo constata que pinhal consome mais água que eucaliptal na zona centro-norte de Portugal

Estudo constata que pinhal consome mais água que eucaliptal na zona centro-norte de Portugal

Um estudo sobre os impactes da floresta na disponibilidade de água na bacia hidrográfica do rio Vouga, que comparou duas pequenas bacias experimentais com povoamentos florestais – uma dominada por eucalipto (Eucalyptus globulus Labill.) e outra com prevalência de pinheiro-bravo (Pinus pinaster Aiton.), acompanhadas ao longo de seis anos (2010-2016) – revelou que, nas condições em análise, o pinhal consome mais água do que o eucaliptal.

Entre as conclusões deste estudo, realizado pela ESAC – Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Coimbra, pode ler-se que em termos de evapotranspiração (água libertada por transpiração das plantas, perdida por interceção e evaporada) a média anual da área onde predominam pinheiros com mais de 20 anos de idade foi de 907 mm, valor superior aos 739 mm registados como média anual para a área ocupada por eucaliptos de várias idades. Considerando os anos mais chuvosos e o ano mais seco, as taxas de evapotranspiração anuais variaram entre 37% e 78% na zona de pinhal e entre 34% e 73% na de eucaliptal, respetivamente.

O estudo revela variações significativas na quantidade de chuva que caiu anualmente – de 1000 a 2000 mm – e ainda maiores diferenças na disponibilidade de água nos caudais, que variaram entre os 200 e 1400 mm entre os anos mais secos e os mais húmidos, relevando um aumento da evapotranspiração em ambas as zonas florestais durante os períodos mais secos.

Ao analisar a percentagem de água nos caudais dos cursos de água que correm nas duas zonas florestais face à precipitação ali registada (coeficiente de escoamento), também aqui as variações são expressivas, com cerca de 60% nos anos mais chuvosos e apenas 20% nos anos mais secos. Os valores de escoamento foram, em média, ligeiramente mais elevados na bacia ocupada maioritariamente com eucaliptos (68%), relativamente à ocupada maioritariamente com pinheiro-bravo (64%).

Além de revelar que, nas condições em análise, os eucaliptos de idade mista podem ter menos impacte na disponibilidade de água desta bacia comparativamente aos pinheiros adultos, uma vez que o pinhal consome mais água do que o eucaliptal, este estudo liderado pela investigadora Anne-Karine Boulet, alerta para a necessidade de considerar o impacte das alterações climáticas na disponibilidade de água em zonas de montanha da região mediterrânica.

 

A importância de conhecer o impacte da floresta na disponibilidade da água

 

No último século, verificaram-se grandes alterações no uso do solo das bacias hidrográficas mediterrânicas, com acréscimo de vegetação, resultante, em grande parte, do abandono de terras antes ocupadas pela agricultura. Como resposta à procura crescente de matérias-primas lenhosas, nomeadamente de madeira, várias destas áreas foram plantadas com espécies florestais, mas parte desta floresta pode estar ameaçada pelos efeitos das alterações climáticas e designadamente pelo clima mais seco que se prevê para a bacia mediterrânica.

Uma vez que tanto a florestação como a desflorestação em larga escala têm impactes no ciclo hidrológico – na disponibilidade e qualidade da água – é importante conhecer de forma estruturada a relação entre a ocupação e uso do solo, em particular das áreas florestadas, e a disponibilidade de água para as plantas e para a recarga dos aquíferos.

Foi em resposta a esta lacuna de conhecimento que surgiu este estudo, que compara duas bacias experimentais de povoamentos florestais com dimensão semelhante (menos de um quilómetro quadrado) em zonas com características similares, localizadas numa mesma bacia hidrográfica.

Este método de considerar duas bacias similares, exceto no fator de interesse (“método dos pares de bacias”) tem sido amplamente usado para estudar a resposta hidrológica da florestação/desflorestação, e parte do pressuposto de que os principais componentes do ciclo da água podem ser medidos com precisão suficiente, de modo a que a evapotranspiração possa ser estimada e comparável nas duas bacias que são objeto de estudo.

Neste caso, os trabalhos decorreram na serra do Caramulo, na bacia do rio Vouga, região centro-norte de Portugal, em duas áreas – Lourizela e Serra de Cima – que foram extensivamente plantadas com pinheiro-bravo e eucalipto nas últimas décadas. Ambas estão sob influência do clima mediterrânico húmido, com invernos chuvosos e verões secos (Csb segundo a classificação de Köppen), e os solos, embora com variações, têm o xisto como rocha-mãe.

Em ambos os casos, o objetivo foi avaliar a resposta hidrológica das bacias sob a influência das duas espécies, incluindo a medição do caudal e da evapotranspiração. As diferenças de resposta observadas entre as duas zonas florestadas fornecem pistas que ajudam a identificar mecanismos hidrológicos capazes de explicar como diferentes coberturas do solo com espécies florestais têm impacte na resposta hidrológica de uma bacia e na disponibilidade de água.

Este estudo defende a ideia de que é preciso adequar a plantação de florestas de produção a zonas com precipitação suficiente para o consumo das árvores e a recarga dos aquíferos ou ao ajuste na gestão silvícola do povoamento florestal em função das condições locais, situação especialmente delicada em anos secos.