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08.10.2024

Florestas removem metano da atmosfera, revelou estudo científico

Florestas removem metano da atmosfera, revelou estudo científico

As árvores desempenham um papel até aqui desconhecido na mitigação das alterações climáticas: além de dióxido de carbono, as florestas removem metano da atmosfera. Graças a bactérias que vivem nos seus troncos e ramos, funcionam como um sumidouro líquido deste gás com efeito de estufa.

 

Embora há muito se saiba que as árvores contribuem para a estabilidade do clima e que removem dióxido de carbono da atmosfera, um estudo recente revela que têm um benefício climático adicional: as florestas removem metano (CH₄) da atmosfera, o segundo gás que mais contribui para as alterações climáticas e cuja concentração tem vindo a aumentar nos últimos anos devido às atividades humanas.

A descoberta foi feita por uma equipa internacional de investigadores, liderada pela Universidade de Birmingham, no Reino Unido, e dada a conhecer no artigo científico “Absorção global de metano atmosférico pelas superfícies lenhosas de árvores em áreas elevadas”, divulgado na revista Nature.

Neste artigo, os investigadores demonstram como determinadas bactérias que vivem na casca das árvores ou na própria madeira absorvem ou consomem o metano. A estimativa preliminar sugere que, globalmente, as árvores podem absorver entre 24,6 e 49,9 milhões de toneladas de metano por ano, uma escala semelhante ou mesmo superior à do solo, que era até agora considerado o único sumidouro terrestre de metano.

“O Compromisso Global sobre o Metano, lançado em 2021 na cimeira do clima COP26, visa reduzir as emissões de metano em 30% até ao final da década. Os nossos resultados sugerem que plantar mais árvores e reduzir a desflorestação são certamente partes importantes de qualquer abordagem para alcançar esse objetivo”, referiu Vincent Gauci, investidor que liderou o estudo.

Como é que as florestas removem metano e como varia esta remoção?

Sabia-se que, sob certas condições, as árvores podem emitir quantidades substanciais do metano que é produzido no solo. Isto foi verificado em árvores maduras localizadas em solos saturados – na Amazónia, por exemplo, as árvores em zonas inundadas são a maior fonte de emissões da região.

No entanto, em árvores de climas temperados e na casca de outras em zonas húmidas tropicais foram identificadas bactérias que utilizam metano (e o consomem), reduzindo por esta via a libertação deste gás.

Estas evidências levantaram a possibilidade de que as árvores tivessem a capacidade de atuar como sumidouros (internos) para o metano que, de outra forma, seria emitido, mas também como sumidouros líquidos de metano atmosférico em locais onde a produção de metano no solo é mais limitada pela menor quantidade de humidade (solos não inundados).

Saber como é que as florestas removem metano e qual o seu contributo foi o ponto de partida para este estudo, que levou os investigadores a diferentes florestas para medir as trocas de metano entre as superfícies lenhosas das árvores e a atmosfera. A escolha de diferentes biomas – florestas tropicais (Amazónia e Panamá), florestas temperadas (Wytham Woods, Reino Unido) e florestas boreais (Suécia) – permitiu observar a variação na absorção de metano em diferentes condições climáticas e ambientais.

Uma das metodologias usadas envolveu a instalação de dispositivos de medição para registar a quantidade de metano absorvido ou emitido em várias partes das árvores e a diferentes alturas, desde o solo até vários metros acima deste. Esta análise vertical permitiu determinar os locais onde ocorriam emissões e absorções, tendo-se verificado emissão nas superfícies próximas do solo e absorção de metano nas áreas superiores dos troncos e ramos.

Em diferentes biomas, as alturas em que as árvores passam de emissoras a sumidouros varia e observam-se igualmente variações consoante os níveis de humidade presentes no solo, mas existem padrões gerais. “Constatámos que a absorção de metano nas superfícies lenhosas, em particular a partir dos dois metros acima do solo da floresta, pode ser o fator mais relevante da contribuição total das árvores para o balanço de metano do ecossistema, convertendo-as em sumidouros de metano”, refere o artigo.

Quer isto dizer que a absorção de metano pelas superfícies lenhosas mais elevadas é tão significativa que se sobrepõe a outros processos, como a emissão de metano ao nível do solo, e transforma as árvores num sumidouro líquido, comprovando que as florestas removem metano da atmosfera.

Com base nos dados das medições das trocas de metano e noutra das metodologias aplicadas – a varredura laser para quantificação da superfície lenhosa das árvores –, os investigadores fizeram os cálculos preliminares que sugerem que as árvores, globalmente, podem absorver entre 24,6 e 49,9 milhões de toneladas de metano por ano.

Esta quantidade não está equitativamente distribuída por todos os biomas: é mais elevada nas florestas tropicais (provavelmente, por terem condições de humidade e temperatura que favorecem os microrganismos), e menor nas boreais. Em média, torna as árvores 10% mais benéficas para o clima do que se pensava anteriormente.

Refira-se que os investigadores também se focaram na análise dos microrganismos presentes nas superfícies lenhosas das árvores, que são responsáveis pela absorção do metano.

Estas bactérias, que já se sabia estarem presentes no solo e em cursos de água, são também encontradas nas superfícies lenhosas elevadas – troncos e ramos – onde vivem em simbiose com as árvores. Ali absorvem o metano e oxidam-no. É por esta via que reduzem a presença deste gás, sendo, por isso, auxiliares no combate às alterações climáticas.

Metano é um dos gases com efeito de estufa que mais tem vindo a aumentar

Recorde-se que metano é responsável por cerca de 30% do aquecimento global desde os tempos pré-industriais e as suas emissões têm aumentado mais rapidamente nos últimos anos, de acordo com registos sistemáticos, que começaram a ser feitos na década de 1980.

A emissão de metano tem origem em processos naturais e em atividades humanas, estimando-se que 60% das atuais emissões decorram de atividades humanas. Entre elas destacam-se:

– A pecuária e a agricultura, em particular a exploração de ruminantes, que produzem metano para a fermentação dos alimentos no seu sistema digestivo, libertando-o terminada a digestão. A produção de arroz, que requer campos inundados onde as bactérias presentes no solo têm melhores condições para produzir metano, é outra fonte;

– A exploração de combustíveis fósseis, que produz as chamadas “emissões fugitivas”, fugas de metano que acontecem durante a perfuração, no transporte (gasodutos) e nos processos de refinação e produção de petróleo.

– A gestão de resíduos em aterros e estações de tratamento de águas residuais, onde a produção de metano decorre da transformação de resíduos de alimentos e outros materiais biodegradáveis.

As emissões de metano de origem natural relacionam-se principalmente com o mesmo fenómeno que existe nos arrozais. Acontecem principalmente em zonas húmidas, em resultado da decomposição de matéria orgânica (decomposição anaeróbica, ou seja, em locais onde a presença de oxigénio é escassa ou nula).

Este é um dos fenómenos que se tem agudizado com o aumento da temperatura, que tem feito derreter mais áreas de solo que antes permaneciam permanentemente congeladas (permafrost) nas regiões árticas. Uma vez descongelada, a matéria orgânica do solo começa a decompor-se, libertando metano e dióxido de carbono. Infelizmente, este é um ciclo que se retroalimenta: o aumento das temperaturas promovido pelo metano leva a mais degelo do permafrost, aumentando a produção e libertação de metano, que volta a contribuir para o aumento da temperatura e assim sucessivamente.