Representantes associativos das três principais fileiras de base florestal – madeira/resina, pasta/papel e cortiça – refletiram sobre o impacte da pandemia de Covid-19 ao longo da cadeia de valor e traçaram perspetivas de futuro, num webinar promovido pela Agro.Ges. Depois da fase de confinamento, o sector destaca as provas de resiliência, a adaptação feita à nova realidade e a necessidade de reforçar o apoio aos produtores, com uma certeza: o sector florestal terá um papel determinante no relançamento da economia nacional.
Com o objetivo de trazer as florestas para a discussão pública sobre os efeitos do surto de Covid-19 na economia, o webinar juntou, virtualmente, Luís Veiga Martins (diretor-geral da CELPA – Associação da Indústria Papeleira), João Gonçalves (presidente da direção do Centro PINUS – Associação para a Valorização da Floresta de Pinho) e João Rui Ferreira (presidente da direção da Filcork – Associação Interprofissional da Fileira da Cortiça) e o moderador Francisco Gomes da Silva (diretor-geral da Agro.Ges). Ao longo do debate, os três representantes associativos recordaram os impactes imediatos da fase de confinamento e traçaram desafios e oportunidades para os próximos meses.
Do webinar emergiu o retrato de um sector afetado, de forma transversal, por este contexto de pandemia, tanto ao nível da necessidade de novos procedimentos operacionais (respondendo às diretrizes da Direção-Geral de Saúde), como na mudança abrupta dos padrões de consumo, com impacte direto na procura de produtos florestais. Ainda assim, reforçaram os participantes, o sector florestal nunca parou, com cadeias logísticas funcionais e que, em termos de exploração florestal e prestação de serviços associados, manteve relativa normalidade.
Perante o fim da fase de confinamento e a preparação da retoma económica, os representantes das fileiras demonstraram confiança de que o sector tem capacidade para manter a resiliência, embora seja necessária prudência.
“Temos todas as características para continuarmos a ter sucesso enquanto sector”, frisou o diretor-geral da CELPA, deixando o alerta de que é necessário proteger as pequenas e micro empresas que estão na base da fileira e que as indústrias – de perfil claramente exportador – terão de acompanhar de perto (e fazer ajustamentos) à nova realidade dos mercados internacionais onde estão presentes. Mesmo assim, Luís Veiga Martins destacou a robustez económica das estruturas empresariais de base florestal e o contributo das respetivas atividades e produtos para uma economia sustentável.
Uma mensagem semelhante foi deixada pelo presidente da direção da Filcork: “as fileiras florestais, a sustentabilidade, estes serão valores que claramente vão estar integrados na mente dos consumidores e isto abre-nos uma oportunidade única de substituir e ocupar o território de outro tipo de produtos [não sustentáveis]”, realçou João Rui Ferreira. O dirigente lembrou que o sector está perfeitamente alinhado com a política europeia assente no Pacto Ecológico Europeu (Green Deal) e que se assume como uma “indústria de futuro”.
A experiência de outras crises económicas, como a de 2009, foi mencionada no debate, como forma de trazer algumas perspetivas concretas para um cenário de incerteza. “As fileiras florestais [do pinho, sobreiro e eucalipto] perderam 15% do volume de exportações [na crise de 2009], mas em 2010 já estavam com os níveis de 2008”, lembrou João Rui Ferreira, como sinal de que, tradicionalmente, este é um sector que recupera rapidamente no pós-crise.
Com um contributo nacional equivalente a cerca de 5% do Produto Interno Bruto, o sector florestal congrega realidades muito heterógenas de fileira a fileira – e, mesmo dentro de cada uma, existem grandes diferenças. É, por isso, natural que as consequências da pandemia de Covid-19 e da fase de confinamento tenham sido muito distintas nas diversas áreas.
João Gonçalves, presidente da direção do Centro PINUS, realçou isso mesmo, durante a sua intervenção no webinar: “uma fileira tão complexa e tão diversa [como a do pinho] teria de ter, obviamente, impactes com variadas intensidades”. Do lado das indústrias da madeira, enquanto a área de trituração para mobiliário sofreu um impacte de cerca de 40% com o confinamento (que implicou o encerramento de lojas de mobiliário e a redução de encomendas), outras áreas prosperaram nesta fase, como foi o caso do packaging. Na indústria da resina, a alteração dos padrões de consumo trouxe procura reforçada de aguarrás (usada em produtos desinfetantes) e uma quebra de produtos de estética que afetou o segmento em cerca de 30%.
Do lado da pasta e papel, o diretor-geral da CELPA reforçou que a crise “teve mais impacte nuns produtos e menos impacte noutros”, reforçando o desempenho positivo do tissue (face ao aumento da procura por papel sanitário) e do packaging. O responsável lembrou ainda que, no que concerne à globalidade da fileira, as cadeias logísticas são “um dos pontos mais sensíveis”, tanto em termos da venda de produtos para mercados internacionais, como em termos de matérias-primas.
Já na fileira da cortiça, a maior preocupação está em conseguir que a campanha de extração de cortiça (que começa já este mês) “decorra nas melhores condições, o mais próximo possível da normalidade”, uma vez que qualquer disrupção poderá impactar a atividade económica de 2021, referiu o presidente da direção da Filcork. Nesse sentido, avançou, está a ser preparado material informativo com indicações específicas de segurança para a campanha de extração.
Do ponto de vista industrial, as cadeias de abastecimento da fileira da cortiça mantiveram-se abertas e o impacte económico “ainda não foi sentido”, garantiu o representante. Nesta indústria, a rolha é o produto-rei, concentrando cerca de 72,1% das exportações. Por isso, a fileira está particularmente atenta à forma como irá evoluir a distribuição de procura entre o retalho e o canal HORECA (hotéis, restaurantes e cafés), tendo em conta as restrições impostas a este último.
Apesar das particularidades de cada atividade económica de base florestal, a pandemia de Covid-19 trouxe desafios comuns às diferentes fileiras e a certeza de que o sector primário terá importância reforçada no futuro, antecipando as necessidades de autoabastecimento nos diferentes países.
Este webinar, dedicado ao impacte da pandemia de Covid-19 no sector florestal português, pode ser consultado neste link.