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Mitigar os efeitos dos incêndios rurais, por Paulo Fernandes

Portugal, juntamente com os outros países do sul da Europa, tem elevada vulnerabilidade a incêndios severos. Entre 2001 e 2019, superou qualquer outro destes países, com 2,4% do seu território florestal e agroflorestal atingido anualmente pelo fogo e pelos efeitos dos incêndios rurais.

Esta realidade está diretamente relacionada com as dinâmicas do nosso território e a sua evolução histórica. Desde final do século XIX, que a arborização e florestação – primeiro das dunas litorais, depois dos baldios comunitários e das propriedades privadas – começaram a alterar um território que era, anteriormente, muito aberto e constrangia a progressão e os efeitos dos incêndios rurais. Décadas depois, a redução das práticas agrícolas e da criação do gado reforçou a tendência, o que levou a um aumento da extensão e continuidade da biomassa, ou seja, do combustível suscetível de arder.

Em paralelo, as nossas políticas foram muito marcadas pelo combate aos incêndios e não pela prevenção, e verificou-se um declínio dos serviços florestais, que poderiam ter assegurado um tipo de práticas mais focadas nesta prevenção. Tudo isso nos trouxe à situação atual.

Alterar este panorama e as suas consequências ambientais e socioeconómicas exigirá um enorme esforço de intervenção no território, cuja implementação é contrariada pelas tendências demográficas e de uso do solo, e cujos resultados são também influenciados pelas alterações climáticas em curso.

 

Estratégias e opções para travar o fogo e os efeitos dos incêndios rurais

 

As três estratégias seguidas para inverter esta realidade passam pela diminuição das ignições (número de incêndios), pelo combate precoce dos incêndios e pelo controlo da vegetação que constitui biomassa inflamável – o “combustível”.

Desde 2000, os investimentos efetuados permitiram reduzir as ignições em dois terços e quase duplicar a capacidade de combate (meios técnicos e humanos), e, em anos de condições meteorológicas amenas, deram resultados. Contudo, nos anos em que estas condições são particularmente severas, como em 2003, 2005 e 2017, é como se todo este esforço tivesse sido feito em vão, com o resultado a traduzir-se no aumento da área ardida.

Para mitigar os efeitos dos incêndios rurais, resta-nos, por isso, atuar na vegetação e isto pode ser feito a diferentes escalas e através de duas opções:

1. À escala do povoamento, pela redução da acumulação de biomassa inflamável e o fomento de estruturas que dificultem a progressão do fogo (aceiros, desbastes, desramações e pastorícia, por exemplo);

2. À escala da paisagem, ao diminuir a continuidade do espaço florestal e diversificar a sua composição (mosaicos de estrutura e composição heterogénea, por exemplo).

A curto médio prazo, a redução da área, a severidade e os efeitos dos incêndios rurais passará, necessariamente, pela primeira opção, na medida em que é muito improvável que consigamos alterar a composição da paisagem florestal e rural em menos de 30 ou 40 anos.

Sobre o Formador

Engenheiro Florestal de formação, Paulo Fernandes é Professor Associado no Departamento de Ciências Florestais e Arquitetura Paisagista da UTAD – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, e integra o Laboratório Colaborativo ForestWISE e o Centro de Investigação e de Tecnologias Agro-Ambientais e Biológicas.

Fez parte da direção da International Association of Wildland Fire e de comissões mandatadas pela Assembleia da República para avaliar e acompanhar a problemática dos incêndios na sequência dos acontecimentos trágicos de 2017; e, ao longo do tempo, tem vindo a colaborar com várias entidades públicas e privadas em matérias da defesa da floresta contra incêndios.

A sua atividade de investigação mantém-se, como no passado, aplicada e focada no comportamento, ecologia e gestão do fogo.