A passagem da tutela das florestas do Ministério da Agricultura para o Ministério do Ambiente e Ação Climática é a uma das principais alterações na orgânica do novo Governo de António Costa, composto na sequência das eleições parlamentares de 6 de outubro de 2019.
A mudança, que releva a valorização do papel ambiental das áreas florestais, sobretudo como sumidouro de carbono, tem reflexos nos organismos da tutela das florestas, nomeadamente no ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e Florestas, que deixa a tutela partilhada entre Agricultura e Ambiente para responder apenas a este último.
A nova arquitetura implica também que a negociação comunitária da nova Política Agrícola Comum – e respetivo pacote de financiamento – seja feita a três vozes nacionais: Agricultura, Ambiente e Coesão Territorial.
Retomando o cargo de ministro do Ambiente que tinha na anterior legislatura, João Pedro Matos Fernandes ficará responsável pela tutela das Florestas. Já neste contexto, o governante sublinhou em entrevista ao Dinheiro Vivo que “a floresta, acima de tudo, e independentemente de ser privada ou pública, é um sequestrador de carbono. É esse o bem público maior que tem de ter. E é óbvio que o cumprirá cada vez melhor quanto mais rentável for a sua utilização”. Matos Fernandes acrescentou ainda que “o problema da floresta é sobretudo da estrutura fundiária que temos e dos inúmeros proprietários que são donos dessas parcelas”.
Com formação em Engenharia Civil e vasta experiência na área dos transportes e infraestruturas, Matos Fernandes já estivera ligado ao ministério do Ambiente no Governo de António Guterres (1995 a 1999), ocupando na altura cargos de adjunto e de chefe de gabinete em duas secretarias de Estado.
Já João Catarino assume funções como secretário de Estado da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território, transitando do cargo de secretário de Estado da Valorização do Interior (funções que ocupava desde outubro de 2018).. Bacharel em Engenharia de Produção Florestal, João Catarino coordenou o trabalho de Fotointerpretação para a Carta de Ocupação do Solo, fez parte da ex-Delegação Florestal da Beira Interior, do Instituto de Conservação da Natureza (com funções de engenheiro técnico florestal) e foi responsável pela Divisão do Núcleo Florestal do Pinhal Interior Sul. Em 2005, foi adjunto do secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas.
Ao longo do seu percurso profissional e político, João Catarino assumiu, durante 10 anos, a presidência da Câmara Municipal de Proença-a-Nova, passando depois para a coordenação-adjunta da Unidade de Missão para a Valorização do Interior.
A floresta ganha algum destaque no novo programa de Governo, apresentado a 26 de outubro de 2019. Entre uma vasta lista de medidas e intenções, o documento assinala o compromisso com a reforma florestal, com o incentivo ao associativismo dos produtores, com a captação de investimento para o sector e com o foco na adaptação climática e sequestro de carbono da floresta portuguesa.
Conheça algumas das medidas previstas pelo Executivo para os próximos quatro anos:
1. Prosseguir a reforma da Floresta
Afirmando que “a reforma da floresta foi adiada por demasiado tempo”, o Governo considera que esta legislatura se revelará “decisiva para transformar, de vez, o panorama florestal” de Portugal. Ainda sem detalhar medidas concretas, o programa do Governo aponta a necessidade de “criar uma floresta ordenada, biodiversa e resiliente, conjugada com um mosaico agrícola, agro-florestal e silvopastoril”. Além disso, lembra que “é essencial adotar medidas de adaptação da floresta, que permitam uma maior resiliência do território e, sobretudo, reduzir o perigo de incêndio, através da diminuição da carga de combustível e da sua continuidade”.
2. Incentivar o associativismo
O objetivo do Governo é homogeneizar a capacidade de intervenção e operacionalização, no terreno, das diferentes Organizações de Produtores Florestais existentes, assim como promover uma gestão profissional conjunta das áreas florestais de minifúndio.
Nesse sentido, prevê criar dentro do Fundo Florestal Permanente uma linha de apoio específica à agregação de Organizações de Produtores Florestais, e elaborar contratos programa para a gestão do território por estas Organizações. Entre as medidas, constam também uma nova matriz de avaliação das Organizações e a regulação do financiamento privado recebido, de forma a impedir conflitos de interesse.
Em termos de minifúndio, a prioridade do Fundo Florestal Permanente será apoiar as ZIF – Zonas de Intervenção Florestal, para que estas criem modelos de negócio de longo prazo. O Fundo será também mobilizado para a transformação de Zonas de Intervenção Florestal em Entidades de Gestão Florestal, medida que o Governo integra na profissionalização da gestão florestal.
3. Plano Poupança, Visto Floresta e outras medidas de atração de investimento privado
Criar mecanismos de captação de investimento privado para a floresta portuguesa é outro dos eixos preconizado. À semelhança do que já acontece noutros sectores, vai ser lançado um Visto Floresta que canaliza investimentos estrangeiros superiores a 250 mil euros para o sector florestal. Os investidores nacionais deverão contar com o Plano Poupança Floresta, que atribui um benefício fiscal a quem investir em Fundos de Investimento Florestais – que serão estabelecidos com o foco em regiões de minifúndio/desfavorecidas e terão também prioridade na captação de apoios públicos.
4. Promover a adaptação climática e capacidade de sequestro de carbono
Com o ministério do Ambiente a gerir as florestas, o Governo compromete-se a criar incentivos económicos para projetos de sumidouro florestal e outras atividades silvícolas e agroflorestais que promovam o sequestro de carbono. Em paralelo, o programa do Executivo realça a promoção da madeira – e produtos derivados certificados – na construção e requalificação, o que potencia maior acumulação de carbono através dos produtos florestais.
O Governo vai ainda avaliar a possibilidade de introduzir espécies florestais não autóctones mais adaptadas às condições climáticas, em regiões do País que se mostrem particularmente vulneráveis à desertificação. Será ainda estudada a viabilidade hídrica das diferentes tipologias de exploração florestal.
5. Alargar o cadastro simplificado a todo o país
A questão do cadastro do território, que tem sido uma prioridade continuamente anunciada e adiada por sucessivos Governos, volta a constar neste programa do Governo, que promete alargar o cadastro simplificado a todos os concelhos. Os terrenos sem dono conhecido resultantes deste processo serão agregados a um Banco de Terras e, por último, arrendados a produtores florestais, agrupamentos de produtores ou empresas.