Critérios de sustentabilidade da nova diretiva relativa às Energias Renováveis – RED II – passam a abranger a biomassa florestal para eletricidade e calor, à semelhança do que acontecia desde 2009 nos biocombustíveis para o sector dos transportes.
A Diretiva RED II vem trazer novas regras para a produção industrial de energia a partir de biomassa florestal. Esta produção é, atualmente e na sua maior parte, realizada por queima direta para geração de calor e/ou eletricidade. Por esta razão a biomassa é geralmente designada por combustível sólido.
A biomassa é a principal fonte de energia renovável consumida na União Europeia (UE), tendo representado, em 2017, 10% do consumo final de energia e 60% do consumo em energia renovável. É uma forma de energia versátil, pois é armazenável, despachável e pode ser disponibilizada em qualquer dos tipos de utilização final: aquecimento/ arrefecimento, eletricidade ou transportes. O sector da bioenergia na UE representou, em 2017, a origem de 703.200 empregos gerando um volume de negócios de 60.630 milhões de euros, segundo o The state of renewable energies in Europe – edição 2019.
Legalidade das operações de colheita, regeneração da floresta nas zonas de colheita, proteção das áreas designadas e preservação da qualidade dos solos e da biodiversidade são alguns dos elementos visados pela diretiva RED II.
Na UE, 95% da bioenergia é consumida a nível doméstico e provém principalmente da utilização de biomassa florestal (70%). A utilização da bioenergia permite significativas reduções de Gases com Efeito de Estufa (GEE) quando comparada com a utilização de combustíveis de origem fóssil.
Contudo, a sua produção deverá ser sustentável e eficiente de modo a minimizar impactos ambientais negativos e a aproveitar todo o potencial desta fonte renovável numa perspetiva de economia circular.
A Diretiva das Renováveis de 2009/28/EC (RED) ainda em vigor, embora alterada em 2015 com a Diretiva ILUC, estabelece critérios de sustentabilidade para a produção de biocombustíveis e biolíquidos para os transportes com vista a evitar impactos diretos nos solos, quer em termos da biodiversidade do solo quer em termos do carbono neles armazenado, assim como garantir poupanças mínimas ao nível das emissões GEE decorrentes da sua produção, face às dos combustíveis convencionais de base fóssil.
Contudo, os critérios de sustentabilidade da Diretiva RED não abrangem a utilização de biomassa para eletricidade e calor. Mas com a entrada em vigor da nova diretiva das Energias Renováveis (Diretiva UE 2018/2001; RED II) em julho de 2021, serão introduzidos critérios de sustentabilidade para os combustíveis biomássicos sólidos e gasosos quando utilizados para fins de eletricidade e calor, muito à semelhança do que já existe para os biocombustíveis usados no sector dos transportes desde 2009. Assim, passam a ser aplicáveis critérios de sustentabilidade à eletricidade e calor em instalações com uma potência térmica nominal total igual ou superior a 20 MW, para os combustíveis sólidos (biomassa), e igual ou superior a 2 MW, para os combustíveis gasosos (biogás).
Adicionalmente a RED II, também estabelece critérios relacionados com a eficiência energética para instalações de produção de eletricidade a partir de biomassa com uma potência térmica nominal acima de 50 MW e inferior ou igual a 100 MW para as quais é obrigatória a utilização de sistemas de cogeração de elevada eficiência ou então, naquelas que possuem produção exclusivamente de eletricidade, é necessário que se utilizem as melhores tecnologias disponíveis (MTD). Para instalações superiores a 100 MW há que utilizar cogeração de elevada eficiência ou que possuam uma eficiência elétrica de, pelo menos, 36%.
Relativamente aos critérios de sustentabilidade, existe a obrigatoriedade de uma redução mínima das emissões de GEE de, pelo menos, 70 % em instalações que entrem em funcionamento a partir 1 de janeiro de 2021 até 31 de dezembro de 2025, e de 80% para aquelas que entrem em funcionamento a partir de 1 de janeiro de 2026. O outro critério principal de sustentabilidade assenta no princípio da análise baseada no risco, para garantir que apenas biomassa sustentável seja utilizada para fins energéticos. Assim, o artigo 29(6) da RED II, relativo à extração de biomassa florestal, vem estabelecer regras para minimizar o risco de utilização de biomassa não sustentável. Para isso, indica que o país de origem da biomassa florestal deverá ter em vigor legislação nacional ou regional e sistemas de controlo e aplicação implementados que garantam: a legalidade das operações de colheita, a regeneração da floresta nas zonas de colheita, a proteção das áreas designadas/protegidas, a preservação da qualidade dos solos e da biodiversidade e a manutenção/melhoria da capacidade de produção da floresta, a longo prazo. Os sistemas de gestão florestal deverão ser utilizados pelos operadores económicos como forma de demonstrar que a origem da biomassa garante a sua sustentabilidade, devendo garantir-se que são precisos, fiáveis e protegidos quanto a fraude.
E, no número seguinte do mesmo artigo (29(7)), estabelecem-se critérios no que respeita à utilização e reafetação dos solos, e à silvicultura (USRSS). Assim, dever-se-á garantir que o país de origem ou a região da biomassa florestal: i) faz parte do Acordo de Paris, ii) apresentou um Contributo Determinado a Nível nacional (CDN) na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas que assegure que as alterações na reserva de carbono relacionadas com a colheita de biomassa são contabilizadas para efeitos do cumprimento das obrigações nacionais de redução das emissões GEE, tal como especificado no CDN, e iii) possui legislação que garanta a preservação e aumento das reservas e sumidouros de carbono, provando que as emissões do sector USRSS não excedem as remoções.
Perante as disposições estabelecidas na diretiva RED II no que respeita a critérios de sustentabilidade aplicáveis à biomassa florestal, importa ter em conta que, a breve prazo, os normativos relacionados com a gestão da floresta nacional deverão ter em conta as regras estabelecidas através dos atos delegados da Comissão Europeia publicados até janeiro de 2021, por forma a dar cumprimento à diretiva RED II, a qual terá que ser transposta para as legislações nacionais dos Estados-Membros até junho de 2021.
Como nota final, convém realçar que Portugal tem já previstos na sua legislação mecanismos de gestão e ordenamento florestal com vista a uma produção sustentada dos bens ou serviços originados em espaços florestais, determinada por condições de natureza económica, social e ecológica, pelo que se encontra em condições para poder respeitar os critérios de sustentabilidade para fins de eletricidade e calor, que agora irão ter força de lei. Importa referir que, para fins energéticos, incluindo a indústria de produção de pellets, o uso de biomassa residual deve ser a norma podendo, nalguns casos, a indústria energética socorrer-se da plantação de espécies silvícolas energéticas desde que não impacte a biodiversidade ou outros indicadores ambientais.
Finalmente, cabe ao Estado monitorizar e fiscalizar uma correta aplicação da Diretiva RED II assegurando um correto uso da biomassa com preservação dos habitats naturais e prevenindo a depleção de reservas de carbono devidas a colheitas excessivas de biomassa florestal.
março de 2021
Energia
Os ecossistemas rurais são a principal fonte de biomassa usada na produção de energia renovável em Portugal. O aproveitamento da biomassa residual diminui a dependência nacional de combustíveis fósseis e, em simultâneo, pode incentivar a gestão das áreas florestais, reduzindo o risco de incêndio, mas há condições a respeitar para que o uso da biomassa para energia não ponha em risco outros benefícios da floresta.
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Em África, 90% da madeira retirada das florestas tem como destino a queima para energia. A nível global, a média é menor, mas mantém-se próxima dos 50%. Ao contrário do que se poderia supor, a maioria desta energia não é usada pela indústria, mas pelas famílias e comunidades. Da lenha depende a subsistência de milhões de pessoas. Em Portugal, cerca de 34% da biomassa é usada, maioritariamente pelas famílias, para aquecimento.