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04.02.2025

Qual o impacte das plantações de eucalipto nas comunidades de invertebrados do solo?

Qual o impacte das plantações de eucalipto nas comunidades de invertebrados do solo?

Um estudo científico de investigadores portugueses, brasileiros e espanhóis indica que há mais diversidade de invertebrados do solo em plantações de eucalipto do que em plantações florestais com outras espécies, embora a sua densidade seja menor. A variedade e quantidade de organismos variam consoante a ocupação do solo com que se comparam os eucaliptais e são influenciadas por outros fatores, como a temperatura.

Embora sejam maioritariamente invisíveis aos nossos olhos, os invertebrados que habitam o solo são uma parte significativa da biodiversidade global terrestre e desempenham importantes funções nas cadeias alimentares, nos ciclos naturais do planeta (essenciais à decomposição que integra o ciclo de nutrientes e o ciclo de carbono, por exemplo) e nos serviços de ecossistemas, a começar pela manutenção da estrutura e saúde do solo.

Apesar da sua importância ser reconhecida, a biodiversidade do solo – e dos seus invertebrados, onde se incluem desde ácaros, insetos, minhocas, nemátodos a bichos-de-conta –, tem merecido menos atenção e menos estudos do que a biodiversidade animal acima dele.

Assim, esta equipa de investigadores quis aprofundar de que modo as plantações de eucalipto, comparativamente com outros tipos de culturas, florestas e ocupação do solo, impactam a densidade e a diversidade das comunidades de invertebrados que vivem neste habitat (e que outros fatores podem influenciar estas duas variáveis).

Recorde-se que a procura por madeira deverá continuar a aumentar, quer pelos seus usos tradicionais por parte de uma população mundial em crescimento, quer pela procura de alternativas biológicas e renováveis para materiais e produtos que derivam de recursos fósseis, em sectores que vão da embalagem à construção. O eucalipto é uma das espécies escolhidas para dar resposta a estas necessidades, embora em Portugal a área de eucaliptais esteja limitada por lei e não possa ampliar-se.

Para realizar o estudo, os investigadores recorreram a uma meta-análise, agregando resultados de vários estudos científicos anteriores compatíveis com os dados a avaliar e os critérios estabelecidos. No conjunto, este trabalho permitiu avaliar a diversidade e densidade de invertebrados do solo em plantações de eucalipto, em plantações com outras espécies florestais (principalmente angiospérmicas, ou seja, espécies em que as sementes estão no interior dos frutos), em florestas nativas, em sistemas agrossilvopastoris, pastagens, campos agrícolas e zonas ocupadas por espécies invasoras.

Várias regiões bioclimáticas foram consideradas, uma vez os estudos foram realizados em diferentes países: a maioria no Brasil, mas também na Argentina, China, EUA, Peru e Portugal: 26 estudos e 143 comparações ajudaram a avaliar a densidade de invertebrados no solo, enquanto a diversidade foi analisada através de 14 estudos com 168 comparações.

Invertebrados do solo influenciados por diferentes culturas e clima

Entre as descobertas divulgadas no artigo científicoEffects of Eucalypt Monoculture Plantations on Soil Invertebrate Communities: A Meta-Analysis”, publicado, em janeiro de 2025, na revista especializada “Land Degradation & Development”, pode ler-se que, consoante a ocupação do solo com que é feita a comparação, pode haver mais ou menos variedade e quantidade de invertebrados em eucaliptais, e que estas variáveis podem ser influenciadas por elementos relacionados com o clima e ter flutuações ao longo das diferentes estações do ano. Assim, verificou-se:

–  A densidade de invertebrados do solo em plantações de eucalipto foi significativamente superior à identificada em pastagens e sistemas agrossilvopastoris, mas substancialmente inferior face a plantações florestais com outras espécies.

– Não foram encontradas diferenças significativas quando se comparou a densidade de invertebrados do solo em plantações de eucalipto com a encontrada em florestas nativas, terras agrícolas ou zonas ocupadas por espécies invasoras.

– A diversidade de invertebrados do solo em plantações de eucalipto foi significativamente superior em comparação com plantações florestais de outras espécies, mas significativamente inferior face às florestas nativas.

– Em relação a áreas agrícolas, pastagens, sistemas agrossilvopastoris e zonas invadidas não foram identificadas diferenças significativas na diversidade de invertebrados presentes no solo.

– O efeito das plantações de eucalipto na densidade e diversidade de comunidades de invertebrados difere consoante a temperatura: o efeito positivo das plantações de eucalipto na densidade de invertebrados reduz-se gradualmente à medida que a temperatura aumenta, mas com temperaturas mais elevadas, as plantações de eucalipto podem sustentar uma maior diversidade de invertebrados do que outras plantações florestais.

  • Com uma temperatura média de 13°C, a densidade de invertebrados do solo em eucaliptais plantados foi superior à observada noutras plantações florestais. À medida que a temperatura aumentou até aos 18,1°C, a diferença esbateu-se, ou seja, a densidade de invertebrados tornou-se semelhante nas várias plantações florestais. Com temperaturas médias superiores a 18,1°C, a densidade de invertebrados nas plantações de eucalipto tornou-se inferior à das outras plantações.
  • A diversidade de invertebrados do solo em plantações de eucalipto foi inferior à de outras plantações a uma temperatura média de 13°C, mas a diferença atenuou-se (a diversidade tornou-se semelhante) à medida que a temperatura média aumentou até aos 19,7°C. Acima desta temperatura, o impacte inverteu-se e a diversidade de invertebrados nas plantações de eucalipto ultrapassou a das plantações com outras espécies.

– O aumento da pluviosidade anual (quantidade de chuva) reduz a diversidade das comunidades de invertebrados do solo: a diversidade relativa em plantações de eucalipto é mais elevada com uma precipitação média anual de 378 milímetros, mas reduz-se (e assemelha-se à de outras plantações florestais) à medida que a chuva aumenta até aos 657 milímetros médios anuais, e a redução acentua-se (a diversidade de invertebrados torna-se inferior à observada noutras plantações) com precipitações anuais superiores.

Limitações desta meta-análise e recomendações para novos estudos

Embora a meta-análise traga um contributo relevante para esta compreensão, os investigadores assumem a necessidade de serem realizados novos estudos comparativos que considerem a influência das diferentes práticas de gestão aplicadas, nomeadamente em eucaliptais e sistemas agrossilvopastoris (rotação de culturas, monoculturas, pastoreio sazonal, adubação intensiva, entre outras), para melhor compreender como estas diferentes práticas afetam (física, química e biologicamente) os invertebrados do solo.

Conhecendo os diversos efeitos das plantações de eucalipto comparativamente a outros usos do solo e fatores climáticos e integrando dados sobre as propriedades físico-químicas do solo e as diferentes práticas de gestão, será possível contribuir para uma melhor compreensão de como as alterações do uso da terra influenciam os invertebrados do solo, apoiando os gestores florestais a tomar decisões informadas quando estabelecem as suas plantações, referem os autores nas suas conclusões.

Da mesma forma, indicam que, na sua meta-análise, a predominância de estudos primários feitos no Brasil – com as características e as espécies presentes neste bioma tropical – pode estar a influenciar alguns dos seus resultados, sendo necessários mais dados de outras regiões bioclimáticas onde existem áreas significativas de eucaliptais, como a Índia e a China, por exemplo, cuja inclusão neste estudo foi impossível ou limitada (devido à barreira linguística dos trabalhos existentes, feitos em idiomas locais). Recorde-se que mesmo as espécies de eucaliptos plantadas diferem consoante as regiões do mundo, existindo centenas de espécies do género Eucalyptus.

Além de apelarem à adoção de um idioma de compreensão global, alertam para outros requisitos que devem ser incorporados em novos estudos para tornar os seus resultados mais consistentes e comparáveis – por exemplo, a incorporação de dados sobre as propriedades físico-químicas do solo nas diferentes ocupações e sobre a idade das plantações florestais analisadas.

Entre as recomendações, refiram-se também a realização de estudos mais longos, que permitam distinguir entre efeitos de curto e longo prazo e identificar dinâmicas interanuais; o estabelecimento de um método de recolha de amostras (do solo e seus invertebrados) que passe a ser transversal aos futuros estudos; e a especificação do número e dimensão das parcelas consideradas. Adicionalmente, deixam o desafio de que os futuros estudos dos solos, nomeadamente em eucaliptais, passem a integrar a vertente dos invertebrados presentes neste habitat.