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“Associativismo na gestão florestal: desafios e oportunidades”, por Cristina Santos

Qual a importância do associativismo e agregação de proprietários em torno de uma gestão florestal sustentável e profissional? Para compreender o contexto das políticas portuguesas e europeias, há que fazer primeiro o ponto de situação a nível nacional.

É em 1901 que se semeiam as bases do associativismo. O Regime Florestal (art.º 30.º do Decreto de 24 de dezembro de 1901) prevê a constituição de “grémios” ou “associações” de proprietários florestais para aplicar esse regime, cuja adesão é voluntaria.

Até 1986, altura em que surgem agrupamentos de produtores florestais, no âmbito do programa de Ação Florestal, integrado no PEDAP – Programa Específico de Desenvolvimento da Agricultura Portuguesa, outros avanços importantes se deram e dos quais se destacam:

  • 1931 – Associações sindicais de defesa da floresta contra incêndios da riqueza florestal
    Semelhante ao sistema francês, foram reunidos os proprietários florestais, incluindo os públicos, responsáveis pelas ações de prevenção, combate e recuperação das áreas ardidas;
  • 1964 – Planos de arborização concentrada
    O Fundo de Fomento Florestal é reformulado, tendo por base o prévio cadastro predial e a adesão voluntária dos proprietários aos “planos de arborização concentrada”. Planos na Serra de Bornes, Serra de São Mamede ou Cabeço Rainha foram postos em prática, reunindo centenas de proprietários;
  • 1965 a 1982 – Modelos de agrupamento de propriedades florestais privadas e Projeto-piloto de Apoio à Propriedade Florestal Privada
    Centrados, sobretudo, em zonas de minifúndio, são as primeiras bases das Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) e dos Núcleos de Intervenção Florestal, concretizados nos anos 2000. É também criado o Projeto-Piloto de Apoio à Propriedade Florestal Privada na Direcção-Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas. O projeto previa uma rede de serviços locais, com núcleos de assistência técnica direcionada para a propriedade florestal privada.

A partir da década de 90, o associativismo surge com uma nova expressão, alavancado por acontecimentos que levaram ao declínio dos povoamentos florestais. Nesta altura, surge a necessidade de promover o associativismo como ferramenta para recuperar o património florestal. Observa-se um incremento na criação de Organizações de Produtores Florestais (OPF) e federações.

Propriedade e associativismo em Portugal

Portugal é dos países europeus com maior percentagem de propriedade florestal privada e elevado absentismo ao nível da gestão florestal. Quanto à dimensão das propriedades, é maior a Sul e pequenas a Norte e nas áreas costeiras, onde há maior potencial para desenvolver floresta, com zonas que beneficiariam da agregação para uma maior produção.

Este é o cenário do qual partimos e que deve moldar as políticas de agregação e gestão conjunta dos espaços florestais, e são diversas as formas de associativismo e de agrupamentos de proprietários que, sendo entidades diferentes, têm por objetivo a gestão profissional dos ativos florestais destas zonas.

Estão registadas mais de 160 associações de produtores florestais no ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, cujas principais atividades incluem:

  • Promover a gestão florestal profissional e dar suporte técnico e administrativo;
  • Alterar as atitudes e mentalidades, fazendo a passagem do conhecimento;
  • Contribuir para ultrapassar a fragmentação das propriedades, dinamizando agrupamentos e gerindo conjuntamente, em torno do mesmo objetivo;
  • Representar os interesses dos proprietários junto de entidades públicas e privadas;
  • Apoiar na comercialização de produtos e o aumento da rentabilidade.

Com vista à profissionalização da gestão florestal, desde 2017 têm sido criadas entidades com objetivos próprios, como é o exemplo das EGF (Entidades de Gestão Florestal), das UGF (Unidades de Gestão Florestal), direcionadas para o minifúndio, mas que não obrigam a um plano florestal comum, contrariamente às Zonas de Intervenção Florestal (ZIF).

Em 2020 é criado o Regime Jurídico da Reconversão da Paisagem, para promover o ordenamento e revitalização dos territórios da floresta, prevendo a criação de Programas de Reordenamento e Gestão da Paisagem (PRGP), Áreas integradas de Gestão da Paisagem (AIGP) e Operações Integradas de Gestão da Paisagem (OIGP).

Conhecendo os modelos de gestão existentes e as suas particularidades, importa valorizá-los e dar-lhes continuidade, definindo-se políticas nacionais e comunitárias que vão ao encontro das necessidades do território português, tendo em mente as expectativas dos proprietários.

E porque, para efeitos de políticas públicas, “as florestas são pessoas”, ideia com que remata esta sessão da Academia, Cristina Santos relembra que o agrupamento dos proprietários florestais é essencial, sobretudo na propriedade privada, para reduzir o isolamento técnico-científico e económico da atividade florestal, promovendo a sua evolução e desenvolvimento.

Sobre o Formador

Cristina Santos é engenheira florestal, pela UTAD – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (1993). Complementou a sua formação com um mestrado em Georrecursos pelo Instituto Superior Técnico (2002) e com curso de Formação em Gestão Pública – FORGEP – no Instituto Nacional de Administração (2009).

É atualmente chefe da divisão de Gestão Florestal e Competitividade, do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF, I.P.) – do Ministério da Ambiente e da Ação Climática, que atua, com particular enfase, nas áreas da gestão florestal e da competitividade das fileiras florestais.

Desde 2013 que representa o ICNF Conselho de Administração do Centro da Biomassa para a Energia (CBE) e o país em vários comités de peritos da Comissão Europeia (EUTR/FLEGT; WGFN, etc.). Participou nos trabalhos da Presidência Portuguesa da União Europeia 2021, como Vice-Chair do Grupo Florestas do Conselho Europeu “Working Party on Forestry”.