Comentário

José Luis Carvalho

Florestas plantadas ou plantações florestais? O nome das coisas nas florestas dos enganos

Porque os nomes das coisas contam para mitigar enganos e adicionar clareza, a expressão “Plantações Florestais” é a mais correta para traduzir o que a FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura designa, em inglês, como “Forest Plantations”.

“Tudo se passa na floresta, desde sempre o espaço maior do idílio e do engano”, diz-nos o encenador Pedro Vaz sobre a comédia “Florestas dos Enganos” de Gil Vicente, de 1536. E à pergunta “o que é uma floresta?”, dizem-nos não existir uma definição comum acordada internacionalmente, mas recorre-se com frequência à definição dada pela FAO, como fórum de consenso.

A FAO define “Floresta” como uma superfície com mais de 0,5 hectares, com árvores de altura superior a cinco metros e copas que cubram mais de 10 % da superfície, ou árvores que consigam atingir estes limites mínimos in situ. Estão excluídas desta definição as terras com utilização predominantemente agrícola ou urbana.

Saber o que é uma floresta e qual o nome mais adequado aos vários tipos de floresta é mais importante do que pode parecer. Vem isto vem a propósito do 1.º Congresso de Plantações Florestais, organizado em 2023, no Brasil, pelo Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais (IPEF), aliás com grande sucesso, e onde Otávio Britov e o professor Shumacher defenderam a ideia de usar o termo “Plantações Florestais” como o nome mais correto em português para traduzir “Forest Plantations” adotado no léxico da FAO. E eu pessoalmente estou de acordo com essa proposta para a lusofonia porque os nomes das coisas contam.

As florestas plantadas definem-se, de acordo com a FAO, como florestas que são predominantemente compostas por árvores plantadas ou semeadas de forma deliberada. Incluem as plantações florestais e outras áreas plantadas. Já as plantações florestais são áreas plantadas, com gestão intensiva, composta por uma ou duas espécies, de idade semelhante e espaçamento regular entre si. As florestas que são plantadas para restauro ou proteção de ecossistemas ou que se assemelhem a florestas naturais quando maduras não são consideradas plantações florestais.

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Embora a diferenciação entre as expressões florestas plantadas e plantações florestais exista, é hoje mais comum nos textos e discursos portugueses ler e ouvir a expressão “florestas plantadas”. Mas, pelo menos, todos estaremos de acordo que João Maria e Maria João nos suscitam perceções diferentes, apesar de se comporem de palavras iguais.

O professor Monteiro Alves e o professor Santos Pereira deram tanta atenção a esta coisa das palavras que têm, no seu livro de Silvicultura, um capítulo designado “O nome das coisas”. Nele podemos ler que O que caracteriza as florestas é a presença e dominância ecológica das árvores. Porém, o que é uma floresta? Embora não exista uma definição comum acordada internacionalmente, é comum usar-se a definição da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e pela Comissão Económica para a Europa das Nações Unidas (CEE-ONU) nas suas avaliações periódicas dos recursos florestais, e também pela Conferência Ministerial para a Proteção das Florestas na Europa (CMPFE).

Como neste assunto não estamos a falar de batismos nem de certidões de registo civil, é possível atualizarmos e corrigirmos nomes que consideramos mais adaptados aos conceitos.

Na língua inglesa é, de facto, comum encontrarmos termos como “Working Forest”, “Forest Plantations”, “Tree plantations” ou mesmo “Plantation Forest”, distinguindo-se das florestas provenientes de regeneração natural ou de florestas primevas/naturais, e incorporando a noção de serem florestas em que o ato de plantar e de cuidar é realizado pelo trabalho humano.

E reforço que para a FAO uma “Forest Plantation” pode ser de floresta autóctone ou exótica, pois o que efetivamente as distingue das “Natural Forest” (florestas estabelecidas de forma natural e com espécies indígenas/autóctones) é ter sido semeada ou plantada e cuidada pela atividade humana. Para ajudar a confundir, uma “Forest Plantation” pode incorporar conceitosClose-to-Nature, mas, enfim, isso é outra história.

Alinhando com os autores da proposta “plantações florestais” em português, recorde-se que quando se refere por exemplo o olival, não se diz que é um “olival plantado”, diz-se olival ou plantação de olival. O mesmo para um eucaliptal ou um pinhal, diz-se e bem que é uma plantação de eucaliptos ou de pinho e não um “eucaliptal plantado” ou “pinhal plantado”. Para o sobreiro é igual, o montado não é um “sobreiral plantado”. O mesmo será razoável para uma qualquer floresta que foi plantada, é uma “Plantação Florestal”. Podem chamar-lhe outra coisa, mas não se esqueçam do nome das coisas.

E a propósito, não querem os leitores pensar também em rever o termo “exploração florestal”, na atividade de corte e rechega de madeira (operação que consiste em mover e concentrar num mesmo local a madeira cortada), pelo termo “colheita florestal”? Deixo para quem quiser comentar.

E deixo também como nota final este excerto do livro de poesia “O Nome das Coisas” (Sophia, 1977), em que Heraclito de Epheso diz:
“O pior de todos os males seria
A morte da palavra”

Dezembro 2023

O Autor

Engenheiro florestal de formação, José Luis Carvalho é Coordenador de Inovação e Fomento Florestal na The Navigator Company. Iniciou o percurso profissional na Swedish Match e, ao longo do seu percurso profissional, acumulou vasta experiência na gestão de projetos com inclusão de tecnologia inovadora, entre os quais Sistemas de Informação Geográfica (SIG) e Monitorização Remota; Biomassa; Mecanização; Intensificação Produtiva; Certificação Florestal.

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