Como encorajar o investimento sustentável em projetos que promovem a biodiversidade florestal na Europa? Um novo estudo, divulgado pelo EFI – Instituto Europeu da Floresta, dá pistas sobre os indicadores que apoiam a inclusão destes projetos na taxonomia da União Europeia sobre finanças sustentáveis.
Com o objetivo de captar fluxos financeiros para a sustentabilidade e cumprir os seus compromissos climáticos e ambientais, a União Europeia (UE) lançou, nos últimos anos, um conjunto transversal de indicadores e critérios para enquadrar as atividades comerciais ou económicas que podem ser objeto de investimento sustentável.
A Estratégia de Finanças Sustentáveis da UE, a regulamentação que a enquadrou, assim como a Taxonomia da UE para as Atividades Sustentáveis definem estes critérios técnicos e as atividades elegíveis, integrando-as em seis objetivos climáticos e ambientais:
As atividades florestais estão integradas nos objetivos 1 e 2 – de mitigação e adaptação às mudanças climáticas –, mas até agora não constam do objetivo 6, de “proteção e restauro da biodiversidade e ecossistemas”, não estando definidos os critérios ou o enquadramento das práticas florestais conducentes à promoção da biodiversidade que podem beneficiar de investimento sustentável.
É a inclusão das florestas neste sexto objetivo que o estudo “Sustainable finance and forest biodiversity criteria – Scoping for an EU Taxonomy” vem abordar, ajudando a refletir sobre os indicadores e critérios a observar no financiamento sustentável em atividades de gestão da floresta quando estas se relacionam com a biodiversidade florestal.
Até agora o sector financeiro tem sido, principalmente de forma indireta, um dos motores estruturais da perda de biodiversidade, ao investir em atividades económicas – ou ao atribuir financiamento a empresas – que contribuem para esta perda.
Alterar esta realidade requer critérios para o investimento sustentável, mas estes critérios não podem ter limites estanques, pois os biomas florestais são sistemas dinâmicos, com grande variabilidade ao longo do espaço e do tempo. O documento alerta que a natureza complexa dos ecossistemas florestais, as suas diferentes composições, estruturas e funções, e as diversas opções de gestão sustentável “não cabem” numa lista unidimensional de indicadores e limiares globais.
O estudo defende, por isso, que os indicadores a considerar na conservação da biodiversidade florestal e na sua avaliação, no contexto das finanças sustentáveis, sejam definidos usando uma abordagem biogeográfica, para que possam adequar-se às características de cada região de forma eficaz.
Em paralelo, defende também que o conjunto de indicadores a considerar necessita de ser flexível e não demasiado ambicioso.
Por um lado, o estabelecimento de metas e limiares muito exigentes pode levar a que apenas um conjunto muito restrito de iniciativas de gestão florestal sejam elegíveis para financiamento sustentável, deixando de fora muitas outras relevantes.
Da mesma forma, pode desencorajar potenciais investidores interessados num financiamento florestal baseado em critérios equilibrados de rentabilidade financeira e proteção da biodiversidade. Esta é uma questão relevante no tema do financiamento sustentável, pois as atividades a apoiar precisam de beneficiar a biodiversidade florestal, mas têm de o fazer ao mesmo tempo que geram retorno para os investidores.
Por outro lado, os indicadores necessitam de ter em consideração as organizações cujas práticas de gestão florestal já promovem a proteção, conservação ou a melhoria da biodiversidade. Se assim não for, apenas os projetos que possam trazer benefícios adicionais (aos atuais) no que toca à biodiversidade florestal serão alvo de financiamento sustentável – o que exclui muitas empresas e organizações pioneiras na gestão florestal responsável.
O relatório propõe, assim, um conjunto de indicadores quantificáveis que abrangem as diferentes composições, estruturas e funções da floresta, e que podem ser avaliados ao nível da empresa ou projeto florestal.
Os indicadores são acompanhados do objetivo para o qual devem contribuir (e de outros dados de enquadramento, como as respetivas formas de monitoração) e estão agrupados segundo os critérios definidos pelo Ato Delegado do Ambiente – Regulamento Delegado (UE) 2021/2139 da Comissão – para as quatro tipologias de financiamento florestal: florestação, gestão florestal, reabilitação e restauro, e silvicultura de conservação.
Resumem-se seguidamente os indicadores e a direção para a qual devem contribuir, para favorecer a biodiversidade florestal.
Financiamento em florestação:
– Área florestal – manter ou aumentar.
– Área florestal por tipo de floresta – manter ou aumentar, de preferência para tipos de floresta com altos valores de biodiversidade.
– Tipo de regeneração – privilegiar a regeneração natural, mas também semear e plantar o máximo possível das espécies de árvores bem-adaptadas ao local (considerando as alterações climáticas).
– Diversidade de espécies em regeneração no povoamento principal – manter alto nível de diversidade ou aumentá-lo.
Financiamento em gestão florestal:
– Retenção de árvores no momento do corte – manter no solo as árvores que não são objeto de corte, favorecendo a presença de espécies valiosas para a biodiversidade.
– Volume de crescimento – manter ou aumentar ligeiramente.
– Árvores enquanto habitat e micro-habitat (antigas, com cavidades) – assegurar a sua presença ou ampliá-la.
– Madeira morta (caída e em diferentes estágios de decomposição) – manter quantidades significativas (avaliando benefícios e riscos, por exemplo de incêndio).
– Estrutura etária das árvores e povoamento – manter determinada parcela de povoamentos antigos (idade e diâmetro) de acordo com o tipo de floresta.
– Diversidade vertical (árvores e arbustos de diferentes idades) – manter nível elevado e aumentar.
– Gestão próxima da natureza e outras formas de gestão florestal integrativa – aplicar em determinadas parcelas ou em todas, ou no aumento da área florestal.
– Corte raso – apenas em determinadas parcelas. Não aplicar em encostas íngremes ou habitats O objetivo é ter zonas pequenas de corte raso (há países da UE onde a área máxima de corte já é inferior a um hectare).
– Incremento e densidade – as remoções devem ser inferiores aos incrementos, sendo admitidas flutuações temporárias e locais após catástrofes naturais ou em caso de conversão para espécies mais resilientes.
– Gestão florestal tradicional para a valorização da biodiversidade – manter.
– Plantações em monocultura – reduzir pela criação de florestas mistas.
Financiamento em reabilitação e restauro florestal:
– Zonas ripárias tampão (em torno de rios, mares, lagos, zonas húmidas) – manter ou aumentar largura das galerias ripícolas.
– Degradação do solo – minimizar (ex: perda de nutrientes e degradação induzida pela atividade humana) e não fazer mobilizações profundas.
– Espécies arbóreas invasoras dominantes – reduzir ou eliminar.
– Fragmentação florestal – não aumentar.
– Conetividade florestal (atividades que promovam a ligação entre áreas isoladas) – aumentar se necessário.
– Abundância de espécies florestais ameaçadas – aumentar populações e reduzir número de espécies ameaçadas ao melhorar os respetivos habitats.
– Abundância de espécies de aves comuns na floresta – manter estável ou aumentar os habitats para estas espécies.
Financiamento em silvicultura de conservação:
– Parcela da floresta não perturbada pela atividade humana – manter ou aumentar através de restauro ativo, para promover floresta antiga e áreas reservadas.
– Parcela da floresta sob regime de proteção – aumentar até determinada parcela de área florestal de alto valor ecológico.
– Alteração na área de floresta primária – não reduzir e implementar medidas que a aumentem no longo prazo.
Os indicadores têm em conta o conhecimento científico atual sobre as práticas que beneficiam a biodiversidade florestal e tem igualmente em consideração as pressões crescentes identificadas nas florestas europeias, a exemplo das pragas e dos incêndios, em grande parte derivadas de alterações de coberto florestal que decorrem das alterações climáticas, dos ataques de organismos nocivos, das práticas silvícolas menos adequadas e da poluição.
Recorde-se que, embora o estado da biodiversidade nas florestas na Europa seja considerado “bom” em comparação com outros ecossistemas, apenas 26% das espécies florestais e 15% dos habitats florestais de interesse europeu registavam um “estado de conservação favorável”, de acordo com a avaliação da Agência Europeia do Ambiente (abril de 2023).