Das 58,5 mil espécies de árvores existentes no planeta, 30% estão ameaçadas de extinção e há 142 já extintas no seu habitat natural. O panorama pode ser mais grave (até 51,3% de árvores em risco de extinção), se contemplarmos também as espécies cujos dados são insuficientes para uma análise rigorosa. A informação consta do “State of the World’s Trees”, um relatório recente do BGCI – Botanic Gardens Conservation International, que reúne um extenso trabalho de compilação de dados do projeto GTA – Global Tree Assessment. Perante o risco, o documento aponta também ações e recomendações.
É tempo de agir. Esta é uma das principais mensagens que sobressai do relatório do BGCI a partir da agregação exaustiva de dados sobre diversidade e vulnerabilidade das espécies de árvores existentes no mundo, combinando diversas fontes, entidades parceiras e investigadores.
Os resultados mostram que, de um total de 58497 espécies de árvores, 17510 estão em risco de extinção. Há mais espécies de árvores ameaçadas do que o conjunto de mamíferos (3778 espécies), aves (4879 espécies), anfíbios (2760 espécies) e répteis (2784 espécies) em risco na Lista Vermelha da IUCN – União Internacional para a Conservação da Natureza.
Para reverter a situação e diminuir o risco, importa conhecer as causas por detrás deste cenário. O “State of the World’s Trees” parte dos dados da Lista Vermelha da IUCN para identificar as principais ameaças às espécies de árvores, nas quais se destaca a perda de habitats para agricultura, uma ameaça para 29% das espécies de árvores existentes. Nos últimos 300 anos, a área florestal mundial diminuiu em cerca de 40%, com 29 países a registarem perdas na ordem dos 90%. A conversão de terras florestais para agricultura (seja em pequena escala, como a tradicional agricultura de “corte e queima”, ou em média e grande escala para instalar culturas comerciais) é hoje considerada a maior ameaça à conservação das espécies arbóreas. A instalação de pastagens para o gado, a produção de óleo de palma, soja, cacau, borracha, café e plantações para fibra de madeira em países tropicais, são responsáveis por mais de metade da desflorestação mundial.
Outras ameaças são também destacadas no relatório, como o corte de árvores em habitats naturais, particularmente folhosas tropicais (que afeta o equivalente a 100 milhões de árvores), pragas e doenças ou alterações climáticas. Combater o abate ilegal de árvores, feito à revelia das legislações nacionais, continua a ser um desafio por resolver à escada global. Os atos criminosos no sector da silvicultura representam entre 51 e 152 mil milhões de dólares por ano, segundo contas da INTERPOL – Organização Internacional de Polícia Criminal, reforçadas no documento do BGCI.
O relatório apela a esforços de conservação das espécies como forma de proteger, efetivamente, estas árvores em risco de extinção. Atualmente, 15,4% da superfície terrestre tem estatuto de proteção e pelo menos 64% de todas as espécies arbóreas estão representadas em áreas protegidas. Os jardins botânicos e os bancos de sementes são um importante esforço de conservação fora dos habitats naturais de cada espécie (ex situ), contando com exemplares de cerca de 30% das espécies existentes. De realçar que 41 espécies de árvores apenas existem neste tipo de iniciativas ex situ, estando extintas nos respetivos habitats.
Para potenciar os esforços de conservação, o BGCI indica a necessidade de um planeamento eficiente destas ações, de uma gestão cuidada destas espécies nos seus habitats (tanto em áreas protegidas, como noutras, tendo em conta as ameaças que cada espécie enfrenta e a melhor abordagem para lhes dar resposta), de iniciativas de restauro ecológico de paisagens degradadas, de ações de recuperação e reintrodução de espécies vulneráveis, de um reforço da conservação ex situ de espécies ameaçadas e da promoção de iniciativas de educação e sensibilização da população em geral, comunidades e parceiros para a importância de proteger espécies ameaçadas. O relatório reforça ainda que só com uma sensibilização das comunidades poderemos ter projetos de conservação sustentáveis e com impacte a longo prazo.
A partir da informação agregada – e das ações de conservação apontadas como essenciais para reverter o risco de extinção das espécies ameaçadas –, o relatório deixa sete recomendações essenciais para o futuro:
1. Reforçar a ação global pela conservação das árvores através da criação de uma nova parceria (que una recursos, conhecimento e especialistas sobre o tema).
2. Mobilizar a informação do GlobalTree Portal (ferramenta online com os dados do relatório) sobre cada espécie arbórea como base de planeamento e de ações de conservação a nível local, nacional e internacional.
3. Fortalecer o conhecimento local, a monitorização das populações de espécies ameaçadas e, onde necessário, aumentar o controlo contra práticas ilegais de corte e comércio de árvores, como formas de assegurar uma conservação eficaz das árvores em risco de extinção.
4. Assegurar que todas as espécies de árvores em risco de extinção existem em áreas ex situ e bancos de sementes bem geridos e geneticamente representativos.
5. Garantir, de forma alinhada entre diferentes organizações e parceiros relevantes, que os programas de reflorestação e restauro utilizam as espécies de árvores mais adequadas a cada ação, incluindo as que estão ameaçadas.
6. Melhorar a recolha de dados nos Inventários Florestais e sistemas de monitorização florestal, à escala nacional, usando a informação recolhida para reduzir a desflorestação em áreas de elevada diversidade de espécies.
7. Aumentar o financiamento disponível – público e privado – para a proteção de espécies ameaçadas, garantindo que este possa ser aplicado diretamente a espécies e locais que têm maiores necessidades de conservação.
Diminuir o risco sobre as espécies de árvores mais ameaçadas é fundamental para preservar a diversidade de espécies existentes no planeta. O relatório realça que as regiões dos trópicos apresentam a maior diversidade de espécies, com destaque para a América do Sul e América Central – “casa” de 40,4% de todas as espécies do mundo. No lado oposto, a América do Norte e a Oceânia são as duas regiões com menor número de espécies.
Por país, o Brasil sobressai com a maior diversidade (8847 espécies de árvores), seguido da Colômbia (5868 espécies) e Indonésia (5716 espécies). No lote dos países com maior diversidade, a Nova Zelândia, Madagáscar e Nova Caledónia são os países com a maior proporção de espécies endémicas, com mais de 90% de espécies únicas (ou seja, que não se encontram em mais nenhum local do mundo).
Cruzando diversidade e risco de extinção, os dados reunidos no relatório demonstram que os países com maior diversidade de espécies têm também um número maior de espécies ameaçadas. Na média global, cada país tem 11% de espécies de árvores ameaçadas (do total de espécies existentes). Caso a caso, há territórios que apresentam níveis de risco muito mais elevados, como é o caso de Santa Helena (69% das espécies ameaçadas), Madagáscar (59%) e Maurícias (57%).
No GlobalTree Portal, é possível aceder a dados específicos de Portugal, que indicam um nível de risco das espécies florestais de 8,7%. O país apresenta 103 espécies nativas, 17 espécies endémicas e nove espécies que, globalmente, estão avaliadas como ameaçadas. Conheça, a propósito, quais as espécies mais comuns da floresta portuguesa.
De todas as espécies endémicas e ameaçadas de Portugal, apenas uma, o azereiro (Prunus lusitanica) tem o seu habitat natural no continente. Todas as restantes são espécies com distribuição natural nas ilhas. Das nove espécies ameaçadas, uma está classificada na categoria mais elevada de ameaça de extinção – CR, ou seja, “criticamente em perigo” -, quatro estão classificadas como em perigo (em risco elevado de entrar em extinção) e as outras quatro estão vulneráveis (em risco de entrar em extinção na natureza).
Espécie | Nome comum | Endemismo | Habitat natural | Risco extinção IUCN |
Pittosporum coriaceum | mocano | Sim | Madeira | CR Criticamente em perigo |
Chamaemeles coriacea | buxo-da-rocha | Sim | Madeira | EN Em perigo |
Juniperus cedrus | cedro-da-Madeira | Não | Madeira e Canárias | EN Em perigo |
Prunus lusitanica | azereiro | Não | Europa e Marrocos | EN Em perigo |
Sideroxylon mirmulans | marmulano | Sim | Madeira | EN Em perigo |
Dracaena draco | dragoeiro | Não | Macaronésia (Madeira e Açores) | VU Vulnerável |
Heberdenia excelsa | aderno | Não | Madeira e Canárias | VU Vulnerável |
Juniperus brevifolia | cedro-do-mato | Sim | Açores | VU Vulnerável |
Sambucus lanceolata | sabugueiro-da-Madeira | Sim | Madeira | VU Vulnerável |
Clethra arborea | folhadeiro | Sim | Madeira | LC Pouco preocupante |
Frangula azorica | sanguinho | Sim | Açores | LC Pouco preocupante |
Genista maderensis | vassoura-da-Madeira | Sim | Madeira | LC Pouco preocupante |
Laurus azorica | loureiro | Sim | Açores | LC Pouco preocupante |
Maytenus umbellata | buxo-da-rocha | Sim | Madeira | LC Pouco preocupante |
Olea maderensis | oliveira-brava | Sim | Madeira | LC Pouco preocupante |
Picconia azorica | pau-branco | Sim | Açores | LC Pouco preocupante |
Sonchus fruticosus | língua de vaca | Sim | Madeira | LC Pouco preocupante |
Sonchus pinnatus | leituga | Sim | Madeira | LC Pouco preocupante |
Vaccinium cylindraceum | uva-da-serra | Sim | Açores | LC Pouco preocupante |
Vaccinium padifolium | uveira | Sim | Madeira | LC Pouco preocupante |
Viburnum treleasei | folhado | Sim | Açores | LC Pouco preocupante |