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A erosão do solo pós-fogo e sua mitigação, por Jacob Keizer

Conheça com Jacob Keizer o que faz aumentar a erosão do solo pós-fogo e quais as medidas mais eficazes para travar esta perda de solo, que se intensifica com as chuvas, destruindo em poucas horas um recurso natural que demora muitos anos a formar-se.

Os incêndios têm efeitos diretos sobre o solo que são particularmente gravosos quando, após as chamas, surgem as primeiras chuvas sem que o local tenha sido alvo de medidas de estabilização de emergência, capazes de reduzir a erosão.

Os efeitos diretos dos incêndios fazem-se sentir em primeiro lugar na vegetação, parcial ou totalmente consumida pelas chamas, e convertida em cinzas e carvão que se depositam sobre o solo. Os efeitos impactam também a manta-morta, com a perda desta camada protetora, e o próprio solo que, quando submetido ao calor do fogo, sofre alterações nas suas propriedades físicas, químicas e biológicas.

Após um incêndio, quando vem a chuva e não existe a vegetação que a intersetava, as gotas chegam diretamente ao solo em mais quantidade e com mais energia. Além deste maior poder erosivo da chuva, a inexistência de manta-morta permite que a água tenha maior capacidade de escorrer pela superfície e de transportar consigo as cinzas e os sedimentos. Quanto ao próprio solo, observa-se que a sua capacidade de infiltração fica reduzida. Isto significa que menos água entra no solo e mais quantidade fica disponível para escorrer pela superfície.

Assim, quanto maior é a severidade do fogo na queima de vegetação, assim como da manta morta e do solo, menor é a resistência das terras à deslocação de partículas e maior é também a escorrência destas partículas causada pelas chuvas. E assim aumenta a erosão.

Destes efeitos diretos da erosão do solo pós-fogo decorrem outros indiretos que incluem, por exemplo, inundações e aluimentos, com queda de sedimentos, cinzas e carvão que vão escorrendo encosta abaixo e acabam muitas vezes por bloquear estradas e poluir cursos de água.

Para conhecer melhor os níveis de erosão pós-fogo e pós-chuva, os cientistas têm feito medições das águas que escorrem e dos sedimentos por elas transportados. É com os dados recolhidos que avaliam o nível de erosão e as perdas de solo em situações reais e antecipam as alterações que podem ocorrer em futuros incêndios.

Esta informação é apoiada por imagens de satélite, que ajudam a definir as áreas as prioritárias onde é fundamental proceder à estabilização de emergência para reduzir os riscos de erosão e escorrência. É esta mesma informação que está na base do mapa de risco de erosão do solo.

Cobertura por palha é mais eficaz na redução da erosão do solo pós-fogo

São conhecidas quatro categorias de medidas de estabilização de emergência que ajudam a reduzir a erosão do solo pós-fogo:

  • Cobertura do solo – reestabelecendo a manta morta consumida pelo fogo;
  • Criação de obstáculos – colocando barreiras que ajudam a travar a escorrência e a impedir que os sedimentos transportados cheguem às linhas de água;
  • Sementeiras – aplicação de sementes para recuperar a vegetação que foi consumida pelas chamas;
  • Agroquímicos – associados a medidas mais complexas para reduzir a escorrência e aumentar a fertilidade do solo.

Os testes feitos no terreno, com aplicação de diferentes medidas e materiais em parcelas contíguas, indicam que proceder à cobertura do solo é a forma mais eficaz de o proteger e permite reduzir a erosão, incluindo em encostas ou zonas com declives.

Em paralelo, estes testes indicam que os tipos de cobertura mais eficazes são as palhas (seguidas por material lenhoso ou resíduos florestais) e que, com a aplicação de 200 gramas de palha por metro quadrado, se obtém a melhor relação custo-benefício.

No entanto, esta aplicação só tem efeitos benéficos se for feita atempadamente. Como o nome indica, trata-se de uma medida de estabilização de emergência, que tem de ser implementada rapidamente – sempre que possível antes que chova. A demora na implementação é uma das observações do relatório “2022 Portugal Wildfires – Burned Area Emergency Response (BAER) Review”, dos Serviços Florestais Norte-Americanos, aquando da sua presença em Portugal para analisar a resposta de emergência após incêndios e partilhar os seus métodos.

Um ano após o incêndio, esta e outras medidas perdem o seu efeito uma vez que a erosão do solo pós-fogo já terá acontecido e os processos naturais de recuperação já começaram, primeiro com o regresso da vegetação que cresce espontaneamente e depois com a reconstituição da manta morta. A recuperação do solo demorará mais tempo.

Além das medidas a implementar, existem vários conselhos, decorrentes de testes científicos e da análise de medidas operacionais no terreno, sobre atividades que devem ser evitadas. Por exemplo, a extração de resíduos de corte não deve ser feita após o fogo, para não deixar o solo descoberto, e as máquinas florestais devem ser evitadas, uma vez que tendem a aumentar a erosão nos locais por onde passam.

Sobre o Formador

Jan Jacob Keizer é investigador principal no departamento de Ambiente e Ordenamento da Universidade de Aveiro e membro do centro de investigação GeoBioTec.

E um ecólogo de vegetação por formação académica e um eco-hidrólogo de incêndios por experiência de investigação, com enfoque em estudos de campo que procuram conhecer a resposta hidrológica pós-fogo e as perdas de solo (fertilidade) que lhes estão associadas, bem como em soluções que promovam a sua mitigação.