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“A influência dos espaços naturais na saúde física e mental”, por Ana Isabel Ribeiro

A influência dos espaços naturais na saúde como conceito que integra bem-estar físico, mental e social, é um tema atual e da maior relevância, indissociável de outros assuntos como o planeamento territorial e a gestão dos recursos naturais.

Foi em 1948 que a Organização Mundial de Saúde definiu o conceito de “saúde” de forma holística, adicionando ao estado de bem-estar físico o mental e social. Hoje são apontados outros fatores que influenciam diretamente a saúde, como os socioeconómicos, culturais e ambientais – incluindo-se o clima, a poluição atmosférica, o ruído, o acesso aos serviços de saúde ou a existência de espaços naturais.

Atualmente, é clara a ligação inata do ser humano à natureza e aos outros seres vivos, mas nem sempre foi assim. A teoria da biofilia, ou o “desejo instintivo de se afiliar a outras formas de vida”, foi avançada pelo biólogo norte-americano Edward O. Wilson, em 1984, no seu livro Biophilia. A obra reforça a influência dos espaços naturais na saúde como conceito que integra bem-estar físico, mental e social. Este é um tema da maior relevância, indissociável de outros assuntos como o planeamento territorial e a gestão dos recursos para o bem-estar humano.

Apesar de o conceito de biofilia ter nascido apenas no século XX, já no século anterior os profissionais de saúde e cientistas tinham estabelecido uma relação direta entre a influência dos espaços naturais (áreas que albergam plantas e animais, desde pequenos parques urbanos a florestas, lagos, rios e áreas selvagens intocadas) e a saúde. Nessa altura, medidas higienistas começaram a ser colocadas em prática nas cidades como resposta direta aos problemas de saúde gerados pela poluição, pela sobrelotação e pelo ruído, levando à proliferação de doenças infeciosas.

Se até então não existia evidência de que é benéfica a influência dos espaços naturais na saúde, esta relação tem vindo a ser comprovada através de vários estudos epidemiológicos. O primeiro, View Through a Window May Influence Recovery from Surgery, do arquiteto norte-americano Roger S. Ulrich, data de 1984 e constatou que os doentes internados nas enfermarias com vista para o arvoredo exterior necessitaram de menos analgésicos e recuperaram mais depressa do que os pacientes sem vista para a natureza.

Hoje, os resultados obtidos pela investigação permitem afirmar que a natureza afeta a nossa saúde não só ao nível dos mecanismos físicos, mas também psicológicos, bioquímicos e comportamentais:

  • Mecanismos físicos
    Espaços verdes mitigam a exposição ao calor excessivo, à poluição sonora e atmosférica, contrariando o fenómeno das ilhas de calor urbanas.

  • Mecanismos psicológicos
    A natureza contribui para a redução da fadiga mental e do stress diário, impactando positivamente a produtividade.

  • Mecanismos bioquímicos
    Uma maior exposição solar significa uma maior síntese de vitamina D, essencial ao sistema imunitário e neuromuscular. Também a exposição a fitoncidas (compostos orgânicos voláteis antimicrobianos emitidos por árvores e plantas) é benéfica, ajudando no combate a infeções e a células tumorais.

  • Mecanismos comportamentais
    O contacto com a natureza está associado à atividade física, sendo mais benéfica para a saúde a prática em espaços abertos. A natureza como ponto de encontro traz também outros benefícios sociais, como a redução da solidão, que afeta um quarto da população mundial.

Nos dias de hoje, os desafios para a saúde pública advêm da degradação ambiental e das mudanças no uso do solo, que reduzem as oportunidades de contacto das populações com a natureza. Além de estarem relacionados com o surgimento de novas doenças infeciosas, estão também ligados a outros efeitos crónicos na saúde mental, de entre eles a ecoansiedade, que se pode manifestar em altos níveis de stress, redução da funcionalidade, sintomas de depressão e insónias.

O urbanismo e a arquitetura biofílica dão, hoje, resposta a estas necessidades das populações urbanas. Ao mesmo tempo, observa-se um ressurgimento das terapias baseadas na natureza, como os banhos de floresta, cuja eficácia está a ser testada e avaliada, e que nos relembra que “temos de os valorizar [os espaços naturais] e de utilizar os seus serviços para o benefício da saúde da população”, remata a oradora.

Sobre o Formador

Ana Isabel Ribeiro (MPH, PhD) é epidemiologista e geógrafa. É investigadora no Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, onde coordena o laboratório “Saúde e Território”, e Professora Auxiliar Convidada na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

É investigadora principal em vários projetos sobre a relação entre a saúde da população, o ambiente urbano e riscos ambientais emergentes, como as alterações climáticas e a degradação ambiental.

É autora e coautora de mais de cem artigos científicos, livros e capítulos de livros e comunicações.