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CeaseFire: gestão, prevenção e combate dos fogos rurais, por Carlos da Camara

O CeaseFire é uma plataforma acessível a todos os que se interessam pela prevenção, gestão e combate dos fogos rurais em Portugal. Como refere Carlos da Camara, fornece informação útil aos profissionais, mas também a qualquer cidadão que planeie um passeio ou piquenique e pode, assim, antecipar possíveis riscos.

A plataforma CeaseFire disponibiliza informação customizada para as necessidades das comunidades e instituições (públicas ou privadas) com atividades ligadas à gestão de risco de incêndio e à prevenção e combate de fogos rurais em Portugal.

Quem entra em ceasefire.pt pode, assim, consultar dados provenientes de imagens de satélite, registos históricos e modelos de previsão, entre os quais se destacam:

  • Mapas com previsões diárias e horárias dos índices que constituem o Sistema Canadiano de indexação de perigo meteorológico de incêndio;
  • Mapas diários de classes de perigo meteorológico de incêndio;
  • Outlooks da severidade da estação de fogos, atualizados diariamente;
  • Informação diária relativa a condições meteorológicas que propiciem ou impeçam ações de fogo controlado, para permitir maior segurança na queima da biomassa excessiva.

Trata-se de uma plataforma de acesso aberto, com informação em tempo quase real e dinâmicas de interação, que possibilitam consultas personalizadas.

O CeaseFire foi desenvolvido por investigadores do Instituto Dom Luiz (IDL), da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL). Como explica o investigador sénior do IDL, Carlos da Camara, foi criado com o objetivo de providenciar informação que possa ser facilmente apreendida por todos os que lidam com o problema dos fogos rurais ao nível da gestão e combate, enquadrando os fatores que condicionam o seu comportamento em Portugal.

Estes fatores têm contribuído para uma alteração do regime dos incêndios em Portugal. Por exemplo, para extremos muito elevados de área ardida desde o início do século XXI e para o alargamento da chamada “época de incêndios”. Esta época ocorria tradicionalmente entre julho e setembro, mas desde 2000 que quase um quarto dos incêndios (24%) acontecem fora deste período (nos 20 anos anteriores eram apenas 11%).

Fatores que determinam os fogos rurais: os 3 triângulos do fogo

Temos de encontrar um esquema de pensamento que permita abarcar estes problemas e os fatores que lhes estão associados, refere Carlos da Camara, que propõe para o efeito o modelo dos três triângulos do fogo.

Triangulos do Fogo_Carlos_da_Camara

Para haver fogo é necessária a existência de um elemento comburente (o oxigénio) que, em combinação com um combustível (biomassa, madeira, vegetação) e perante uma ignição (energia inicial), leva à combustão.

No caso dos fogos rurais, o coberto vegetal e as condições de secura dessa vegetação são alguns dos elementos combustíveis, mas nos grandes incêndios o mais importante é o ordenamento da paisagem. Por exemplo, a diminuição dos mosaicos agrícolas (que serviam de tampões naturais à propagação) e o aumento da área florestada, em muitos casos sem gestão, são fatores que têm diminuído a resiliência da paisagem nos últimos 50 anos.

Outros fatores relacionam-se com as condições climáticas que se têm tornado mais propícias a grandes incêndios: isto acontece quando se conjugam pelo menos três condições: mais de 30 graus Celsius, menos de 30% de humidade e vento com uma velocidade acima dos 30 quilómetros por hora. Carlos da Camara junta uma quarta: presença de seca, com 30 dias seguidos com ausência de chuva.

Já as ignições, em Portugal (tal como na restante Europa mediterrânica), estão principalmente relacionadas com as atividades humanas. A esmagadora maioria dos incêndios é causada por ignições não intencionais e o facto de termos uma população com uma idade média elevada e muito ligada a práticas tradicionais (queimas e queimadas, da agricultura e pastorícia, por exemplo) acaba por elevar este risco.

Assim, é fundamental atuar nas três vertentes do triângulo do fogo:

Na atmosférica e climática que, embora não seja controlável, é cada vez mais previsível: modelos cada vez mais robustos permitem antecipar com maior exatidão o que pode acontecer nos próximos 10 dias;

No coberto florestal, que é gerível: podemos modificar a paisagem e gerir a biomassa para minimizar o risco que representa a estrutura dos combustíveis;

Na população, que é educável: as escolas e universidades desempenham um papel muito importante na sensibilização e educação dos cidadãos, logo desde a infância.

O CeaseFire foi desenvolvido tendo em conta estas três vertentes, com modelos que ajudam a prever os riscos, a saber quando é viável atuar ao nível da vegetação, e como uma plataforma aberta que permite a qualquer pessoa conhecer a realidade dos fogos rurais e os fatores que agravam os incêndios em Portugal.

Sobre o Formador

Após completar formação em Física (Bacharelato, 1979) e Ciências Geofísicas (Licenciatura, 1981), Carlos da Camara doutorou-se em Ciências da Atmosfera (1991) na Universidade de Missouri-Columbia, EUA. Em 2025, é Professor Associado do Departamento de Engenharia Geográfica, Geofísica e Energia (DEGGE) e investigador do Instituto Dom Luiz (IDL), na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL).
Foi vice-presidente do Instituto de Meteorologia (2003-04) e membro do Space Advisory Committee para o 6.º Programa-Quadro de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico da UE.

A sua investigação tem incidido em temas como a deteção remota (satélite) de fogos ativos e áreas queimadas, a avaliação de risco meteorológico de incêndios, a recuperação de vegetação em áreas queimadas, as condições meteorológicas associadas a eventos extremos, a atividade das ondas planetárias e as suas implicações na variabilidade climática, entre outros.

É autor e coautor de uma centena de publicações científicas de âmbito internacional e orientou inúmeras teses de doutoramento e dissertações de mestrado.