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“Restauro das florestas em contexto de alterações climáticas”, por Cristina Branquinho

O restauro das florestas é particularmente desafiante nas zonas semiáridas, que têm tendência para aumentar em Portugal, tornando mais difícil a regeneração natural. A regeneração passiva e a ativa são outras opções disponíveis.

Em zonas semiáridas, o restauro das florestas e de outros ecossistemas tem como principal fator limitante a falta de água, que condiciona a produtividade vegetal, reduzindo a capacidade de regeneração natural, ao mesmo tempo que leva ao aumento da mortalidade das plantas e árvores.

Face aos efeitos das alterações climáticas prevê-se que a área de território árido continue a aumentar e que as condições se tornem ainda mais limitativas, deixando o solo mais exposto e menos convidativo enquanto habitat.

Mesmo os sistemas mais bem adaptados às zonas semiáridas, como as florestas de sobreiro e azinheira ou o montado, estão sob pressão. Face à elevada mortalidade das árvores e à dificuldade de regeneração, estas zonas poderão converter-se em matos. Esta mudança de estado pode ser gradual ou repentina, bastando para isso um pequeno aumento de temperatura.

Três formas de restauro das florestas em climas semiáridos

No restauro das florestas devem ser tidas em conta três formas de regeneração: regeneração natural, restauro passivo e restauro ativo.

Na regeneração natural suspende-se a perturbação que origina a degradação. Por vezes, é necessário trazer novas plantas para a equação, pois “reflorestar não chega”, e considerar elementos como o microclima e o relevo.

Veja-se o exemplo da Herdade da Contenda (Moura, Beja), zona em que foi cortado o estrato arbóreo devido à Campanha do Trigo (1929 e 1949): as tentativas de reflorestação, nalgumas zonas mal sucedidas, servem agora de base para compreender como evoluiu a reflorestação, através de uma série cartográfica feita ao longo de 67 anos. Nesta área de estudo consegue-se apurar a importância do relevo na reflorestação: a norte das montanhas verificou-se uma maior regeneração natural de azinheiras, mas o mesmo não aconteceu a sul.

Por vezes, é necessário recorrer ao restauro passivo, que pode ser aplicado sempre que se consiga retirar a origem da perturbação. Tomem-se como exemplo as zonas em que existe pastoreio, impedindo as plântulas de se regenerar naturalmente: uma das soluções é a exclusão ao pastoreio de diferentes zonas da exploração por determinados períodos de tempo, para que as plantas tenham a oportunidade de crescer.

Um bom exemplo é o da Companhia das Lezírias, onde se concluiu que o período ótimo para a regeneração dos sobreiros é de nove anos, tempo em que se deve evitar a sua perturbação.

A opção pelo restauro ativo implica ação direta sobre o ecossistema e é, em geral, mais dispendiosa, podendo servir objetivos como preservar o solo, conservar os habitats e a biodiversidade, produzir madeira, criar zonas de recreio ou melhorar a estética da paisagem.

Aprendendo com as experiências passadas pode perceber-se como proceder para diminuir a mortalidade, promover a regeneração e maximizar a funcionalidade das reflorestações, por etapas. Cristina Branquinho salienta alguns destes ensinamentos:

  • Os pinheiros densamente plantados entram em competição entre si, inibindo regeneração natural, mesmo ao fim de 20 anos. O mesmo não acontece com as azinheiras;
  • Uma maior densidade de árvores resulta numa maior complexidade estrutural; e mais arbustos resultam em mais biodiversidade. “Isto não depende apenas da espécie de árvore plantada, mas da forma como a gestão é feita”, refere;
  • As zonas com mais arbustos retêm mais nutrientes no solo;
  • Os povoamentos com sobreiro apresentam mais biomassa;
  • A complexidade estrutural facilita a regeneração – quanto mais camadas de plantas de diferentes dimensões melhor a regeneração natural do sistema.

Cristina Branquinho relembra que “A floresta resolve três grandes problemas da nossa sociedade: melhora a biodiversidade, contribui para a mitigação e adaptação das alterações climáticas, e diminui a suscetibilidade à desertificação”. Mais floresta significa maior sequestro de carbono, melhor regulação climática e regeneração natural, promoção da biodiversidade e redução dos efeitos da desertificação. A floresta é, por isto, uma estratégia de mitigação dos efeitos das alterações climáticas que devemos, cada vez mais, entender, gerir e proteger.

Sobre o Formador

Cristina Branquinho é professora de Ecologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. A sua investigação centra-se na compreensão dos padrões ecológicos em resposta às diferentes alterações ambientais, através da avaliação e modelação da estrutura e do funcionamento da biodiversidade, do desenvolvimento de indicadores ecológicos a diferentes escalas espaciais e temporais, do restauro da estrutura e funcionamento do ecossistema, assim como dos serviços e ecossistema que lhe estão associados.