Comentário

Margarida Cabral

É possível a otimização florestal de grandes áreas sob gestão agrupada?

Serão os modelos de otimização florestal um recurso flexível o suficiente para acomodar vários proprietários? Existem vantagens de sustentabilidade ao considerar a gestão florestal de áreas agrupadas, em comparação com a gestão independente?

As florestas providenciam uma ampla gama de recursos e funcionalidades para a sociedade, o ambiente e a economia. No entanto, apesar do seu enorme valor, verificam-se continuamente ameaças a este ecossistema.

A importância das florestas torna crucial a implementação de uma gestão florestal ótima, sendo importante a sensibilização da população para a gestão florestal sustentável e para a produção sustentável dos bens e recursos florestais. Esta visão é, aliás, uma parte importante dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU – Organização das Nações Unidas.

O sucesso dos resultados desejados com a gestão florestal sustentável depende de um conjunto de estratégias e tomada de decisões no planeamento, apoiados em métodos de base científica, como simuladores de crescimentos florestal e modelos de otimização florestal.

A preocupação crescente em torno da gestão florestal sustentável impulsionou a procura de novos mecanismos que permitam apoiar o gestor na tomada de decisão e os modelos de otimização florestal destacam-se entre eles. Estes modelos são ágeis e têm a possibilidade de abranger diversos problemas ou realidades, tendo como base diferentes objetivos.

Em Portugal, principalmente a norte, deparamo-nos com a problemática da micro propriedade, o que acarreta grandes desafios à gestão florestal. Os baldios representam cerca de 14% da área florestal em Portugal e em 2019 o conceito de gerir floresta de forma agrupada foi alavancado através de um financiamento promovido pelo estado português, para a constituição de Agrupamentos de Baldios.

A figura do agrupamento de baldios visa promover a extensão da gestão florestal qualificada a todos os espaços florestais destas áreas comunitárias, recorrendo ao desenvolvimento de modelos de gestão florestais conjuntos, que assegurem os interesses das partes interessadas e os princípios da sustentabilidade.

De forma a dar resposta às questões acima tomou-se como caso de estudo o Agrupamento de Baldios do Concelho de Boticas, constituído por 22 Unidades de Baldio, sendo a área constituída maioritariamente por espaços florestais – representam cerca de 53% da área total. O que tem vindo a ser feito neste agrupamento tem como objetivo primordial o trabalho em conjunto, de forma a valorizar e melhorar a exploração sustentável dos terrenos baldios.

Neste sentido foi desenvolvido um plano de gestão florestal com o objetivo de maximizar o volume de madeira extraído ao longo de um horizonte de planeamento a 30 anos, tendo como base simuladores de crescimento e modelos matemáticos.

Através do uso destes modelos e simuladores, conseguimos avaliar diferentes cenários e comparar os resultados que se obteriam ao optar pela gestão individualizada ou pela gestão conjunta das manchas florestais representativas de cada Unidade de Baldio. Constatámos que a gestão conjunta garante, a médio e a longo prazo, um aumento da sustentabilidade dos recursos, que é o fator chave para a gestão florestal sustentável, apesar do volume removido ao longo do horizonte de planeamento ser inferior.

Por vezes, é necessário “abrir mão” do valor gerado no momento para garantirmos uma maior rentabilidade no futuro.

Foi possível comprovar que é necessário continuarmos a olhar para o território florestal como um todo e não de forma repartida, pois ao gerirmos de forma individualizada, comprometemos a estrutura da paisagem, o que se traduz em possíveis impactes nocivos ao ecossistema.

A gestão florestal colaborativa, envolvendo múltiplos atores, revelou-se fundamental para a sustentabilidade deste recurso. Por outro lado, o modelo de otimização florestal desenvolvido é facilmente adaptável e replicável, podendo ser aconselhado para diversas áreas florestais, tanto comunitárias como privadas.

© Margarida Cabral

Como em tudo, também aqui há contrapartidas: apesar dos modelos de otimização florestal se mostrarem eficazes no apoio à gestão florestal sustentável, é do conhecimento de todos que, quando falamos em gerir floresta, não nos referimos a algo linear. Existem fatores extrínsecos que impossibilitam muitas vezes a aplicabilidade integral de um modelo e a replicação dos resultados obtidos, nomeadamente fatores bióticos e abióticos, como é o caso dos incêndios rurais e das pragas e doenças.

Outro fator que apresenta uma grande preponderância é o financiamento. Na maioria dos casos, a realidade com que nos deparamos atualmente é os proprietários dependerem do financiamento público. Apenas conseguem gerir a floresta com estes meios que não são, no entanto, constantes nem adaptados à necessidade das nossas florestas.

Contudo, como gestores e proprietários florestais é importante mantermos uma visão realista para a gestão florestal e tirarmos partido de mecanismos que nos suportem na tomada de decisão, sendo estes um bom ponto de partida para uma boa gestão florestal.

Por último deixo o desafio a todos os gestores florestais para olharmos para um futuro onde a floresta é valorizada por todos os seus recursos, tendo como foco agrupar a floresta, a indústria e o mercado, promovendo uma visão mais abrangente dos papéis multissectoriais das florestas, não só para a produção de material lenhoso, mas também para a produção de resina, sequestro de carbono e de todo o conjunto de bens e serviços. Assim, poderemos tirar partido deste capital natural único, de forma sustentável.

Dezembro de 2024

O Autor

Margarida Cabral é licenciada (2019) e mestre (2022) em Engenharia Florestal pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, com interesse pela otimização da gestão florestal de grandes áreas e sob diversos órgãos gestores – tema de um artigo científico que publicou em 2022.

Ainda durante o seu mestrado, entre 2021 e 2022, realizou um estágio profissional na Cooperativa Agro Rural de Boticas, CRL (CAPOLIB) e, desde então, ali exerce funções como técnica florestal.

O seu trabalho é maioritariamente direcionado ao Agrupamento de Baldios do Conselho de Boticas, no apoio ao funcionamento dos Órgãos Gestores de Baldio e na elaboração de projetos de investimento, planeamento, ordenamento e gestão florestal das Unidades de Baldio.

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