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Ecopistas, ecovias e ciclovias: corredores verdes que cruzam Portugal

Percorrer ecovias, ecopistas e ciclovias permite descobrir as mais diversas paisagens de Portugal, seguindo por florestas, campos, rios, montanhas e cruzando, em alguns casos, zonas urbanas. Descubra o que caracteriza estes “corredores verdes”, inspire-se nos exemplos e ponha-se a caminho.

A ideia de traçar “corredores verdes” que ligam locais de interesse ou acompanham e permitem o acesso a rios, lagoas, florestas e parques naturais não é nova, e desde início do século XXI que Portugal tem vindo a apostar na diversificação e ampliação de vias pedonais e cicláveis, que conjugam muitas vezes objetivos turísticos e recreativos, culturais e patrimoniais, ambientais e educativos.

Desde então que termos como “ecopistas”, “ecovias” e “ciclovias” se tornaram comuns e estas estruturas têm-se multiplicado por todo o país, levando, em muitos casos, à descoberta de paisagens que eram menos acessíveis, como acontece com os traçados criados em antigas linhas de comboio ou apoiados por passadiços, cruzando rios, serpenteando no topo de escarpas ou acompanhando as margens de cursos de água.

Saiba o que diferencia os conceitos de ciclovia, ecovia e ecopista e descubra como muitos destes caminhos se cruzam entre si e com outras rotas pedestres, permitindo percorrer muitos quilómetros, a pé ou de bicicleta, à descoberta do património natural e ao encontro da riqueza histórico-cultural do território. Inspire-se com os exemplos e ponha-se a caminho!

Ciclovias: as diferenças face aos dois outros corredores verdes

Dos três conceitos, a ciclovia é o que mais se diferencia, uma vez que se destina exclusivamente a ser percorrido sobre rodas. Como o nome indica, as ciclovias são caminhos cicláveis e têm sinalética que assim os identifica.

Em Portugal, as ciclovias podem ser percorridas de bicicleta ou trotineta e quem nelas se desloca tem de respeitar sinais e regras de trânsito, circulando pela direita e cumprindo o código da estrada. O limite de velocidade é de 20 quilómetros por hora, máximo que se aplica também às bicicletas ou trotinetas elétricas.

Outra das principais diferenças nos traçados das ciclovias é serem, na maioria dos casos, corredores verdes urbanos, paralelos a faixas de rodagem e que ligam diferentes áreas de vilas e cidades (ou diferentes vilas). Alguns passam por parques, jardins e outros locais de interesse, como zonas ribeirinhas ou costeiras. São pensados, sobretudo para reduzir os impactes negativos do transito convencional e para promover a qualidade de vida das cidades.

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Com mais de 62 quilómetros, a Ciclovia da Estrada Atlântica, é um exemplo. Passa por quatro concelhos do distrito de Leiria – Marinha Grande, Alcobaça, Pombal e Nazaré – e num dos sete percursos em que se divide atravessa o pinhal de Leiria. Trata-se do percurso Leiria-Estrada Atlântica (com cerca de 12 quilómetros), que segue próxima das praias do Fausto e do Pedrogão – paralela ao mar – e passa por várias outras paisagens de grande beleza e interesse natural.

A Lagoa da Ervedeira é um destes locais, entre a Mata Nacional do Urso e a Mata Nacional de Pedrogão. Embora não seja muito conhecida, esta lagoa com cerca de 500 metros de extensão, assim como os caniços e os pinhais que a enquadram, dão abrigo a inúmeras espécies, principalmente de aves.

A ciclovia do Guincho, na Grande Lisboa, é outro exemplo. Tem mais de 17 quilómetros e liga a Marina de Cascais à Praia do Guincho, seguindo paralela à estrada e ao mar. No final, alcança o Parque Natural Sintra-Cascais, onde inúmeros caminhos pedestres dão acesso a zonas mais arborizadas e frescas, cobertas pela sombra de densos bosques.

O “Guia das Ciclovias, Ecopistas e Ecovias – Norte de Portugal” indica mais algumas: a Ciclovia da Marginal Atlântica em Vila do Conde, que segue por 3,7 quilómetros, acompanhando o passeio marítimo (este muito utilizado para caminhada) ou a Ciclovia do Parque da Cidade de Vale de Cambra, um percurso circular, de cerca de 2,2 quilómetros, são dois exemplos.

Fora das zonas urbanas e das laterais de estradas, existem menos vias reservadas em exclusivo a velocípedes. Na maioria dos casos, estes caminhos são Ecovias ou Ecopistas – vias partilhadas por pessoas e meios de mobilidade suave, ou seja, criadas para percorrer a pé ou de bicicleta.

Ecopistas: caminhar ou pedalar sobre antigos carris

Ecopista é a designação portuguesa dos percursos que utilizam ramais ferroviários desativados. Noutros países, são chamadas de vias-verdes, expressão que em Portugal já estava associada a outro conceito – o de portagem –, quando, em 2000, a Declaração de Lille estabeleceu a constituição de uma rede europeia de corredores verdes.

Esta declaração definiu as vias-verdes ou ecopistas como “vias de comunicação reservadas exclusivamente a deslocações não motorizadas, implementadas num contexto de desenvolvimento integrado que valoriza o meio ambiente e a qualidade de vida, e proporciona condições adequadas de largura, inclinação e pavimento para garantir um uso fácil e seguro a todos os utilizadores de qualquer condição física”.

As ecopistas são vias de comunicação autónomas, uma vez que seguem o traçado de antigas vias-férreas e passam sobretudo por áreas rurais e naturais. Integraram património construído, incluindo o antigo património ferroviário desativado – como pontes, túneis e estações que levam a troços urbanos ou ficam nas suas proximidades.

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Em Portugal, o Plano Nacional de Ecopistas foi criado em 2001 (pela então REFER, atual IP Património – Infraestruturas de Portugal), e privilegia vias que possam ser percorridas a pé e pelos vários meios de mobilidade suave, incluindo cadeira de rodas.

Em 2024, existem duas dezenas de ecopistas, com uma extensão de mais de 450 quilómetros, algumas das quais em implementação e expansão. É possível percorrer estes corredores verdes em zonas da Região Centro, da Grande Lisboa e do Alentejo, mas a maioria situa-se na Região Norte. Eis um exemplo:

Ecopista do Vouga, Aveiro – Viseu

A Ecopista do Vouga segue o traçado do antigo ramal ferroviário de Viseu – antiga linha ferroviária do Vale do Vouga, numa extensão de 76,8 quilómetros, entre Sernada do Vouga (concelho de Águeda) e a cidade de Viseu. Atravessa antigos túneis e pontes ferroviárias, incluindo as centenárias pontes de Vouzela e Poço do Santiago (na foto abaixo), a quase 30 metros de altura.

O caminho, que tem ligação à Ecopista do Dão e se cruza com inúmeras outras rotas – Pequena Rota das Laranjeiras, por exemplo – atravessa diversos concelhos, como Albergaria-a-Velha, Sever do Vouga, São Pedro do Sul, Vouzela e Oliveira de Frades. Pode ser percorrido em múltiplos trajetos com distâncias mais curtas – por exemplo, pelos troços entre as antigas estações de comboio.

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Inserida no Vale do Rio Vouga, esta ecopista desenvolve-se entre zonas florestais, agrícolas e urbanas, integrando um corredor verde de elevado valor paisagístico, turístico e ambiental, onde não faltam valores naturais para descobrir.

Por exemplo, parte da ecopista integra o Sítio de Importância Comunitária do rio Vouga e uma Zona Especial de Conservação, onde se encontram formações florestais que se enquadram em vários habitats protegidos – incluindo freixos (Fraxinus spp.), carvalhos (Quercus spp.) e ulmeiros (Ulmus spp.). O rio Vouga destaca-se como refúgio para diversas espécies com estatuto de proteção, incluindo peixes, como o sável (Alosa alosa) e a rara lampreia-de-rio (Lampreta planeri) ou mamíferos como a toupeira-de-água (Galemys pyrenaica).

Ecovias ligam pontos de interesse natural e cultural

As ecovias têm como principal característica fazer a ligação – a nível local ou regional – entre áreas de interesse ambiental ou cultural e patrimonial.

Assim, podem cruzar trilhos de terra, estradões rurais e florestais, assim como pontes e passadiços, podendo conciliar estes troços em meio rural e natural, com segmentos urbanos em estradas onde passam veículos motorizados – em aldeias, vilas e cidades. Habitualmente são apoiadas por sinalética que dá a conhecer o trajeto e os valores naturais e patrimoniais existentes.

A Rede Nacional de Cicloturismo identifica, no seu Mapa Geral 2024, um total de 19 ecovias com rotas de longa distância, que permitem percorrer perto de sete mil quilómetros em Portugal continental. Algumas ligam o território de norte a sul, como acontece com a Ecovia Meridional Melgaço – Vila do Bispo, para seguir junto ao litoral. Outras são chamadas ecovias paralelas, pois unem o litoral ao interior, possibilitando, em alguns casos, continuar para Espanha.

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A Ecovia do Litoral é um exemplo de uma ecovia paralela, que atravessa o Algarve através de corredores verdes, num total de cinco troços, que na sua extensão total ligam o Cabo de São Vicente a Vila Real de Santo António. Muitas outras ecovias, com troços mais curtos juntam-se a esta lista, ligando áreas urbanas e naturais. Descubra um destes corredores verdes onde pode seguir a pé ou sobre rodas.

Ecovia do Vez, Arcos de Valdevez

A ecovia do Vez desenvolve-se ao longo do rio Lima e do rio Vez. Embora seja um caminho extenso, com mais de 30 quilómetros que ligam Jolda S. Paio à Aldeia do Sistelo, está segmentada em três etapas, todas elas sinalizadas:

  • A Etapa 1 vai de Jolda S. Paio a Arcos de Valdevez, num total de 12,5 quilómetros (cerca de duas horas e meia de caminhada a pé). Segue junto ao rio Lima e aos seus açudes até encontrar o Vez. Começa depois a “subir” este rio até chegar à vila de Arcos de Valdevez, junto ao Passadiço do Mortemo. O percurso faz-se essencialmente por caminhos rurais.
  • A Etapa 2 liga Arcos de Valdevez a Vilela, num percurso de 9,8 quilómetros sempre junto à margem do rio Vez, também por caminhos rurais. No percurso encontram-se quatro zonas fluviais onde as águas convidam a banhos: Valeta, Pogido (Gondoriz), Seixal (Gondoriz) e Sieiros (S. Cosme).
  • A terceira etapa, com 10,2 quilómetros, liga Vilela à aldeia do Sistelo, conhecida como o “pequeno Tibete português” devido aos múltiplos socalcos (criados para ampliar as áreas agrícolas) que lembram os “terraços” tibetanos, criando uma paisagem de grande beleza e valor patrimonial. O percurso é composto maioritariamente caminhos rurais e passadiços de madeira. Esta é a etapa mais desafiante, especialmente para quem segue em duas rodas.
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A água é um elemento quase sempre presente ao longo deste percurso – que conta com nada menos do que oito zonas fluviais de lazer – e muitos dos valores naturais a apreciar e proteger estão com ela relacionados.

Na flora, destacam-se árvores como o amieiro (Alnus glutinosa) e o freixo (Fraxinus angustifolia), ambas típicas da vegetação ribeirinha, mas também o castanheiro (Castanea sativa) mais comum em terras altas, e pequenas plantas como o lírio-amarelo-dos pântanos (Iris pseudacorus) e o feto-real (Osmunda regalis). Na fauna, são comuns o melro-de-água (Cinclus cinclus), a garça-real (Ardea cinerea), assim como o fotogénico guarda-rios (Alcedo atthis), e com alguma sorte é possível avistar lontras (Lutra lutra) e lagartos-de-água (Lacerta schreiberi).