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Caminhadas

Mais de 3700 km de rotas pedestres por entre floresta e natureza

Portugal tem mais de 3700 quilómetros de rotas pedestres homologadas, que permitem descobrir recantos de grande beleza e valor natural que poucos conhecem. Antes de partir, saiba o que distingue as grandes e pequenas rotas, conheça a sinalética e escolha as mais adequados à sua condição física.

Em tempos antigos, eram sobretudo os comerciantes e peregrinos que se deslocavam a pé por muitos quilómetros em busca de novos mercados e destinos de espiritualidade. Hoje, a vontade de descoberta e de fuga ao ritmo quotidiano, aliadas à valorização do exercício físico e do contacto com a natureza, fazem da caminhada uma atividade cada vez mais procurada. E em Portugal não faltam rotas pedestres para seguir caminho.

Temos quase 8 mil quilómetros de rotas registados, estando mais de 3700 quilómetros homologados, indica a Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal, entidade responsável pelo Registo Nacional de Percursos Pedestres. Por homologadas entendem-se rotas registadas oficialmente e que cumprem uma série de requisitos, como:

– O nome da rota e a sua identificação segundo um código de registo composto por letras e números de cores previamente definidas;

– As marcas estabelecidas e internacionalmente reconhecidas para indicar o caminho certo, o errado e as mudanças de direção;

– A presença de painéis com informação específica sobre o traçado, a distância que percorre, o tempo estimado da caminhada e outros dados técnicos, além de um enquadramento geral sobre a fauna, flora, geologia, história e gastronomia da região que as rotas pedestres percorrem.

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@ Manuela Martins

Entre os dados técnicos a ter em conta antes de escolher rotas pedestres está a distância, os desníveis e o grau de dificuldade. Este nível tem cinco classificações – muito fácil, fácil, algo difícil (moderado), difícil e muito difícil – e tem em conta aspetos como a adversidade do meio, o tipo de piso e o esforço físico necessário. As rotas identificadas como difíceis e muito difíceis podem ser demasiado exigentes para quem está a iniciar-se no pedestrianismo.

O pedestrianismo ou caminhada pode aproveitar caminhos antigos (incluindo os usados em peregrinações) ou abertos propositadamente, e os traçados desenvolvem-se preferencialmente por trilhos tradicionais ou históricos, na natureza ou em meio urbano. Quando se desenvolvem total ou principalmente em meio urbano os caminhos são designados como “Percurso Local” e não como “Rota”.

A grande maioria das rotas pedestres permitem conhecer valores turísticos, culturais e ambientais ou conduzem-no a locais específicos, que são menos conhecidos como cascatas, lagoas, miradouros, vestígios arqueológicos, zonas naturais de elevado valor ecológico, entre outros atrativos que se juntam ao prazer de caminhar.

Estes percursos dividem-se em grandes e pequenas rotas, que podem coincidir em alguns troços ou ter variantes, ou seja, trilhos intermédios entre dois pontos do percurso principal.

Conheça as diferenças entre as grandes rotas pedestres e as pequenas, veja qual lhe convém e descubra alguns exemplos.

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@ Cristina Marques

Grandes rotas pedestres nacionais têm mais de 30 km

As grandes rotas são, como o nome indica, as mais longas: com mais de 30 quilómetros. Integram-se no Plano Nacional de Percursos Pedestres, pelo que o seu registo e identificação são feitos a nível nacional. Desta identificação fazem parte as iniciais GR (Grande Rota) seguidas pelo número de registo nacional (GR1, GR2, etc.) em cores branca e encarnada. Por exemplo:

GR1: É a Grande Rota das Serras da Peneda e Soajo, com cerca de 77 quilómetros de percurso circular. Percorre-se em quatro dias e o seu grau de dificuldade (médio a difícil) não é aconselhado a principiantes;

GR2: É a Grande Rota de Montanha do Alto Minho e o seu percurso linear liga Caminha a Entre Ambos os Rios, passando pelo Sistelo e por Lindoso (na fronteira com Espanha), num total de cerca de 180 quilómetros. A dificuldade é considerada moderada.

GR22: A Grande Rota das Aldeias Históricas de Portugal é uma das maiores rotas pedestres nacionais. Tem um traçado circular com cerca de 600km, que pode ser percorrido a pé ou de bicicleta, e é uma das duas rotas nacionais que tem o selo de Leading Quality Trails – Best of Europe, atribuído pela European Ramblers Association. A GR22 une 12 Aldeias Históricas de Portugal, que podem ser exploradas através de caminhos históricos. A dificuldade é variável consoante o troço.

Os números vão avançando sucessivamente, embora haja algumas grandes rotas pedestres que não se encontram documentadas e que, eventualmente, podem não estar homologadas ou ter perdido a sua homologação (por exemplo, por falta de manutenção das placas informativas ou dos caminhos). Todas as que se encontram conformes com o registo oficial estão identificadas com letras e números brancos sobre um fundo encarnado e a sinalética do caminho é feita nestas cores.

Como as grandes rotas nacionais podem ter centenas de quilómetros, na maioria dos casos os percursos dividem-se em trajetos mais curtos, passíveis de percorrer num dia.

Há 1433,27 quilómetros de grandes rotas homologados e um total de 2769,17 quilómetros registados, segundo a Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal.

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Em Portugal, são ainda reconhecidas as Grandes Rotas Transeuropeias, que percorrem mais de dois países e têm início ou fim no território continental. São identificadas pela sigla GR e pelo número de registo nacional, seguidos da letra “E” (Europa) e do número de registo europeu. Na maioria dos casos têm milhares de quilómetros. Para se ter uma ideia, a GR12-E7, por exemplo, é uma Rota Pedestre Transeuropeia que se inicia no Parque das Nações, em Lisboa, e que de atravessa vários países europeus, terminando na cidade romena de Constanza, na costa do Mar Negro.

Inspire-se com a GR60, a Grande Rota das Montanhas Mágicas

Uma das mais bem documentadas grandes rotas em Portugal é a GR60 – Grande Rota das Montanhas Mágicas. Trata-se de uma rota pedestre circular, de 275 quilómetros, entre os rios Douro e Vouga, que liga sete concelhos: Arouca, Castelo de Paiva, Castro de Aire, Cinfães, São Pedro do Sul, Sever do Vouga e Vale de Cambra.

Dividido em 14 etapas, o percurso atravessa quatro Zonas Especiais de Conservação (ZEC) da Rede Natura 2000 e um Geopark UNESCO – o Arouca Geopark. Considerando a sua extensão total, permite caminhar pelas mais variadas paisagens: vales, margens de rios, lagoas e cascatas, turfeiras, planaltos, florestas e montanhas.

Embora a GR60 esteja identificada como “Difícil”, várias das suas etapas são “Fáceis”, incluindo as mais curtas: a etapa 3 com 9,4 quilómetros, em Castelo de Paiva, e etapa 9, com 10 quilómetros entre Fraguinha e Manhouce.

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Um dos ex-libris naturais desta nona etapa fica em Fraguinha, um local tranquilo “aninhado” entre as serras da Freita e da Arada que, além das vistas desafogadas para ambas as serras, permite conhecer uma das “turfeiras mais bem preservadas a sul do Douro” – a Turfeira da Fraguinha (localizada no parque de campismo). Recorde-se que as turfeiras estão entre os habitats naturais de interesse comunitário e prioritários para a conservação e que, segundo a avaliação das turfeiras portuguesas, 75% estão em mau ou inadequado estado de conservação.

Já a etapa 6 é considerada “Difícil”. É a mais longa, com 29,7 quilómetros, entre Gralheira e Castro Daire. A segunda mais extensa e também considerada “Difícil” é a etapa 12, que liga Sever do Vouga e Felgueira, num total de 27,8 quilómetros. Para quem está preparado para o desafio, o esforço valerá a pena, pois ao longo do percurso vai poder descobrir o conjunto rupestre do Outeiro dos Riscos e tomar um banho refrescante na cascata da Cabreia. Mais à frente, poderá visitar as ruínas das minas do Braçal, atravessadas pelo rio Mau (afluente do Vouga) e envoltas numa mancha florestal densa e diversa.

Pelo caminho desta etapa 12, encontra-se também a Ecopista do Vouga e a Grande Rota da Ria de Aveiro. Apesar do nome, esta última é constituída por três Grandes Rotas independentes – Azul GR57-E9, Dourado GR58-E9 e Verde GR59 -, com percursos ligados entre si, que perfazem quase 600 quilómetros.

As designações E9 indicam que as Grandes Rotas 57 e 58 integram a Grande Rota Transeuropeia E9 European Coastal Path, que percorre trilhos próximos da faixa costeira, ao longo do Oceano Atlântico, do Mar do Norte e do Mar Báltico, seguindo por mais de 10 mil quilómetros.

O percurso pedestre GR60 coincide quase totalmente com o traçado criado para BTT – Bicicleta Todo-o-Terreno. Neste caso, em vez de Grande Rota, é designado como a Grande Travessia das Montanhas Mágicas. Tem oito etapas e um total de 280 quilómetros.

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Pequenas rotas pedestres são caminhos locais de até 30 km

As pequenas rotas pedestres têm até 30 quilómetros e o seu registo é feito em cada concelho, razão pela qual estes percursos são identificados com as iniciais PR (Pequena Rota), seguidas do número atribuído a nível concelhio (PR1, PR2, etc.) e das três letras que designam o concelho onde decorre (total ou maioritariamente) o traçado.

Assim, podem existir muitas PR com o mesmo número e o que as diferencia são as iniciais dos concelhos onde se desenvolve cada uma das pequenas rotas pedestres. Todas elas são sinalizadas a amarelo e encarnado (em vez do branco e encarnado que identifica as grandes rotas).

Quando os percursos de pequenas rotas coincidem parcialmente com os das grandes, a sinalética inclui as cores de ambas (como exemplifica a foto, em que o sinal de caminho a seguir está assinalado a branco, encarnado e amarelo, sendo válido para quem percorre uma das duas rotas pedestres em causa).

Em Portugal temos mais de 2326 quilómetros homologados e 5182,53 registados, que se distribuem por cerca 250 Pequenas Rotas, segundo a Associação de Campismo e Montanhismo de Portugal.

Descubra três exemplos de pequenas rotas pedestres para seguir caminho no Norte, no Centro e no Sul:

Norte: PR1 MCD Vale de Prados, em Macedo de Cavaleiros

Em Macedo de Cavaleiros (MCD), a Pequena Rota Corredor Verde do Vale de Prados permite seguir do centro da cidade em direção a Vale de Prados e conhecer parte da Paisagem Protegida da Albufeira do Azibo, integrada no Geoparque Terras de Cavaleiros.

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Ida e volta são cerca de nove quilómetros e o ponto de retorno desta pequena rota circular, considerada “Fácil” de percorrer, faz-se junto à albufeira do Azibo, um espelho de água que integra a bacia hidrográfica do rio Sabor e que convida a uma paragem refrescante, já que conta com duas praias fluviais – Fraga da Pegada e Praia da Ribeira.

É também nesta albufeira e nas suas margens que podem avistar-se algumas das espécies de aves aquáticas mais emblemáticas da região – em particular o mergulhão-de-crista (Podiceps cristatus), que se tornou símbolo da paisagem protegida.

Além da vegetação ribeirinha, este habitat aquático está enquadrado por carvalhais e montados de sobro e azinho, bosques que dão abrigo e alimento a muitas outras espécies, incluindo mamíferos como o gato-bravo (Felis silvestres), o corço (Capreolus capreolus), a gineta (Genetta genetta) e ocasionalmente, o lobo (Canis lupus).

Este percurso cruza-se com várias outras rotas do Azibo e com outros “caminhos verdes”, incluindo a Ecovia do Azibo (a que também chamam Ciclovia). Em Macedo de Cavaleiros pode ainda apanhar-se a Ecopista do Tua.

Sabe a diferença entre ecopistas, ecovias e ciclovias? Descubra os diferentes “Corredores Verdes que cruzam Portugal”.

Centro: PR2 VVR – Caminho das Virtudes, em Vila Velha de Rodão

O Caminho das Virtudes é uma das sete Pequenas Rotas de Vila Velha de Rodão (VVR). É um percurso “Algo Difícil”, de cerca de nove quilómetros em circuito fechado, cujo início e fim fica na aldeia de Vilas Ruivas.

A caminhada segue caminhos rurais debruçados sobre o Tejo, pelo Vale do Lameirão, desce à foz da ribeira de Vilas Ruivas e chega, um pouco mais à frente, à Ilha das Virtudes, uma língua de terra que desenha uma pequena península no curso do rio Tejo, a pouca distância das enormes paredes rochosas das Portas de Rodão.

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Junto ao rio, a paisagem é mais fresca e, entre a vegetação que envolve as margens, é possível apreciar espécies típicas da vegetação que envolve cursos de água (galerias ripícolas), como os amieiros (Alnus glutinosa). Com alguma sorte, é possível avistar várias aves, incluindo rapinas, e a reservada lontra (Lutra lutra).

Pelo caminho ficam vestígios arqueológicos (o monumento funerário neolítico conhecido por Cabeço de Ante, por exemplo), embora a rota deva o seu nome a eventos históricos mais recentes: à antiga fonte termal das Virtudes, com águas que nasciam a cerca de 24 graus, a que a comunidade reconhecia benefícios terapêuticos. Desde a década de 80 do século XX que esta fonte, e a antiga praia fluvial em seu redor, ficou submersa pelo caudal da barragem do Fratel, pondo fim ao seu aproveitamento termal.

Sul: PR1 PTM – A Rocha Delicada, em Portimão

A Rocha Delicada, no concelho de Portimão (PTM) é uma das perto de 50 rotas pedestres de pequena distância que existem no Algarve. São cerca de sete quilómetros, com partida e chegada à estação de comboios da Mexilhoeira Grande, num percurso considerado “Fácil”. Sem grandes desníveis, os caminhos de terra estão enquadrados por culturas agrícolas e arvenses (algumas inspiradas nos antigos pomares de sequeiro), por matos e sapal, quase sempre com água à vista – seja a da ria do Alvor ou a da ribeira de Odiáxere.

A Ria do Alvor é uma área protegida da Rede Natural 2000 – Zona Especial de Conservação (ZEC), sendo uma importante zona húmida, que dá abrigo e alimento a inúmeras espécies, entre as quais de aves limícolas – que vivem em zonas lodosas, entremarés e águas pouco profundas – como o perna-vermelha (Tringa totanus), cujas populações residentes são consideradas criticamente em perigo em Portugal.

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Esta zona estuarina está envolta por matos mediterrânicos onde se podem encontrar muitas dezenas de plantas, incluindo arbustos como o sanguinho-das-sebes (Rhamnus alaternus), com as suas bagas vermelhas, e o carrasco – um Quercus arbustivo. Nas áreas cultivadas, não faltam exemplares de espécies bem-adaptadas ao clima mais quente e seco do Algarve, como a alfarrobeira (Ceratonia siliqua) a amendoeira (Prunus dulcis)  e o pinheiro-manso (Pinus pinea).

Através do PR1 PTM chega-se também ao Centro de Estudos e Interpretação Ambiental “A Rocha”, que tem vindo a promover a investigação, monitorização e conservação da Ria de Alvor e de outras áreas naturais algarvias desde 1983. Atividades como a anilhagem de aves, a contagem de borboletas noturnas e o registo de espécies (aves e não só) na Ria de Alvor são feitas com frequência e contam com a ajuda de voluntários.

Refira-se que a Rocha Delicada é um dos percursos complementares da GR13, a Grande Rota Via Algarviana, que passa a alguma distância, mais para o interior.