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“O papel dos ecossistemas florestais nos ciclos da água e carbono”, por Conceição Caldeira

A gestão sustentável das florestas é essencial para promover o papel regulador dos ecossistemas florestais como motores biológicos do ciclo da água e como soluções climáticas naturais, para sequestrar e armazenar carbono.

A água e o dióxido de carbono (CO2) são fundamentais ao metabolismo das plantas. A disponibilidade destes compostos, juntamente com a luz, determina a sua capacidade de crescer. Por sua vez, durante o seu crescimento e tempo de vida, as árvores devolvem à atmosfera a grande maioria da água que entra no seu metabolismo e fixam nas suas estruturas (acima e abaixo do solo) parte significativa do carbono que removem da atmosfera.

É na renovação contínua destes ciclos que radica o importante papel dos ecossistemas florestais como reguladores naturais dos ciclos da água, do carbono e da energia. Conceição Caldeira explica como.

Cerca de 97% da água absorvida pelas plantas é devolvida à atmosfera, principalmente pela transpiração das folhas, e o vapor transpirado permite a formação das nuvens e, mais tarde, da chuva que volta a “saciar” as árvores. “A transpiração funciona como um motor biológico do ciclo da água”, refere Conceição Caldeira, e permite o arrefecimento das folhas e, por isso, da temperatura em redor da árvore.

Além de água, as plantas precisam de dióxido de carbono, que captam da atmosfera, e de luz solar. Com estes “ingredientes” realizam a fotossíntese, que inicia o processo de transformação da energia solar em alimento (açucares ou hidratos de carbono que integram as plantas). Todos os organismos vivos dependem da fotossíntese e as árvores, pela sua altura, volume e longevidade, captam a luz mais facilmente e têm uma grande capacidade fotossintética. Neste sentido, “as florestas são soluções climáticas naturais, com efeito no sequestro e armazenamento de carbono”, sublinha a especialista, que destaca a importância das florestas plantadas e o das florestas mais maduras.

Perda de vitalidade compromete papel dos ecossistemas florestais

Os estomas, pequenos poros localizados nas folhas, são importantes neste processo, pois regulam a entrada de CO2 e a saída de água por transpiração. Em situações de seca, por exemplo, os estomas reduzem a sua abertura para diminuir perdas de água (menos transpiração) e, ao fazê-lo, reduzem também a assimilação de CO2 da atmosfera.

Quanto maior a carência de água (ar seco, temperaturas elevadas e falta de chuva), menor a absorção de dióxido de carbono e, por consequência, mais carbono fica na atmosfera e menos água lhe é devolvida. Estas são ameaças que se agudizam com as alterações climáticas, como é possível comprovar em estudos científicos recentes:

  • Pela análise de imagens de satélite que permitem observar a variação de área foliar (quantidade de folhas, vegetação e árvores), concluiu-se que, entre 1982 e 1995, a área foliar aumentou globalmente e que o acréscimo registado se deveu em 70% ao aumento do CO2 na atmosfera – pelo chamado efeito de fertilização do CO2: com mais dióxido de carbono na atmosfera, há mais CO2 a entrar nos estomas, tornando as plantas mais produtivas.
  • No entanto, desde finais da década de 90, este efeito começou a abrandar, fenómeno que os investigadores atribuem ao aumento da secura do ar. O abrandamento verifica-se nas mais variadas espécies por todo o mundo: as folhas secam e caem precocemente, mesmo nas espécies de folha perene (sempre verdes), e há mais árvores debilitadas, suscetíveis a pragas e doenças que, no limite, podem acabar por morrer.

“45% do carbono do mundo está nas florestas e elas têm a possibilidade de aumentar em um terço a sua capacidade de o absorver”, lembra Conceição Caldeira, desde que sejam geridas de forma sustentável, de modo a manterem a sua saúde e resiliência. “Isto não vai resolver o problema das alterações climáticas – ele só se resolve com a redução ou paragem de emissão de gases com efeito de estufa para a atmosfera –, mas vai contribuir para promover o papel dos ecossistemas florestais como reguladores naturais do clima e da água”, conclui.

Sobre o Formador

Doutorada em Ciências Florestais (Biodiversidade e Funcionamento dos Ecossistemas), Conceição Caldeira é professora no ISA – Instituto Superior de Agronomia, Universidade de Lisboa, e coordenadora do grupo de investigação do Forest Ecology do CEF – Centro de Estudos Florestais do mesmo instituto.

Autora de mais de 60 artigos científicos, coordenou e integrou equipas de investigação envolvidas em mais de 15 projetos científicos.

Os seus principais interesses de investigação focam-se na compreensão integrada do funcionamento e biodiversidade dos ecossistemas, incluindo interações entre árvores, arbustos e pastagens. Em particular, interessa-se pela compreensão dos mecanismos de mortalidade das árvores e a sua resposta a secas recorrentes, combinadas com outros fatores bióticos e abióticos.

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