Comentário

Marco Ribeiro

A resinagem como motor de desenvolvimento rural do nosso país

Desde 2012 que, na freguesia de Tresminas, terra com tradição mineira do concelho de Vila Pouca de Aguiar, existe um grupo de resineiros a percorrer os pinhais locais para aproveitar o “ouro branco“ ali existente. Além do emprego e valor gerado por esta matéria-prima natural e com procura crescente, a resinagem está a apoiar a gestão da floresta e a prevenção de incêndios.

A freguesia de Tresminas é bastante característica desta região do país, e de todo o nosso interior: é constituída essencialmente por manchas de pinhal com grande extensão e por alguma agricultura na envolvente das aldeias, com soutos e, mais recentemente, amendoais. Para aqui fixar população é extremamente importante desenvolver dinâmicas agroflorestais que criem valor e gerem riqueza por forma a criar condições de empregabilidade com qualidade para quem queira por ali ficar e/ou se instalar.

Foi neste sentido que, em 2012, a então Gestão Integrada e Fomento Florestal – GiFF, em parceria com a Aguiarfloresta, decidiu criar uma equipa de operacionais com o objetivo de iniciar o aproveitamento da resina natural dos povoamentos de Pinheiro-bravo ali existentes. Desde então, a atividade da resinagem não mais parou.

 

A resinagem é um exemplo de como é possível criar emprego em pequenas zonas rurais, apoiando a fixação das populações e travando a desertificação das aldeias do interior de Portugal. Em plena natureza e longe do stress, a profissão tem vantagens, mas precisa de ser reconhecida pelo seu contributo para os vários serviços de ecossistema que beneficiam toda a sociedade.

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Atualmente, pela mão da Raízes In, empresa que resultou da reestruturação da anterior GiFF que iniciou esta dinâmica, a resinagem (e as demais atividades, direta e indiretamente associadas) continua a empregar quatro mulheres e três homens, 12 meses por ano, em cinco diferentes baldios. O seu trabalho traduziu-se numa receita, a favor destas entidades, que supera os 100 mil euros nos últimos 10 anos.

Além das claras vantagens económicas, seja pela via da empregabilidade, que se não existisse neste âmbito, certamente já teria levado estas pessoas a abandonar as suas aldeias, seja pelas receitas associadas ao arrendamento do pinhal, esta dinâmica tem trazido inúmeras mais valias para esta freguesia e para os povoamentos florestais existentes.

Resinagem: profissionais têm evitado escalada de incêndios

Desde a condução de manchas de regeneração natural de pinheiro-bravo que garantam o futuro da atividade, a gestão de combustíveis em zonas estratégicas para evitar a entrada e progressão de grandes incêndios, quer com operações motomanuais, quer com execução de fogo controlado em pinhais adultos, até ações de vigilância, primeira intervenção e rescaldo em incêndios, estas sete pessoas têm sido incansáveis na dedicação à gestão destas áreas.

Desde que se iniciou a atividade neste local, já foram várias as situações em que os próprios resineiros atuaram para evitar males maiores, quer através de uma rápida primeira intervenção, evitando que pequenas ocorrências de incêndio ganhassem dimensão, quer por ações de rescaldo, prevenindo que os reacendimentos originassem reativações incontroláveis e com danos muito superiores.

Recentemente, no verão de 2022, esta foi uma situação bem evidente: conseguiu-se travar um grande incêndio dentro de um pinhal resinado, numa zona previamente tratada com fogo controlado, o que se traduziu numa oportunidade de combate com meios manuais e mecânicos concluída com sucesso e, adicionalmente, vários reacendimentos foram debelados à nascença pela mão destas pessoas, que prontamente atuaram nas diferentes situações.

Para culminar toda esta dinâmica positiva, associada à resinagem e à manutenção de presença humana nestes territórios, a resina de pinheiro-bravo apresenta-se atualmente como um ativo natural com valorização crescente. Através das diretrizes europeias para a sustentabilidade e a descarbonização, ganha ainda uma nova dimensão de interesse estratégico, pois é uma matéria-prima que se apresenta como alternativa sustentável ao uso de derivados do petróleo.

Acresce ainda que a atual produção nacional de resina natural apenas abastece a nossa indústria de primeira transformação em cerca de 10%, pelo que as garantias futuras de escoamento desta matéria estão asseguradas.

Face a este enquadramento, a Raízes In integrou o consórcio recentemente criado no âmbito da componente 12 do PRR – Bioeconomia Sustentável, uma iniciativa liderada pelo ForestWise, e que, entre variadíssimos objetivos definidos para 2025, vai procurar criar metodologias de extração mais eficientes, pelo incremento de produção, não só em quantidade, mas também na qualidade do produto final.

Falta real reconhecimento dos benefícios criados pela resinagem

Há inúmeras vantagens que se vão reconhecendo nesta profissão e grande parte estão associadas à vida no meio rural, como a grande flexibilidade de horários, o permanente contacto com a natureza, a ausência de stress, a possibilidade de cultivar os seus próprios alimentos, entre outras.

Mas as vantagens que a sociedade em geral obtém do seu trabalho são ainda pouco reconhecidas: entre elas estão, por exemplo, o sequestro e armazenamento de carbono, a regulação dos recursos hídricos e a valorização da resina natural em detrimento do uso de combustíveis fósseis

Só com um real reconhecimento, por parte da sociedade, dos serviços públicos que estas pessoas prestam diariamente a todo o país será possível criar condições atrativas para, no futuro, conseguirmos atrair gente para esta atividade e este reconhecimento necessita de ser feito através do pagamento de um valor que apoie a gestão destes territórios.

Além disso, práticas como o fogo controlado em povoamentos florestais de pinheiro-bravo, que a empresa tem vindo a implementar com bastante sucesso ao longo dos anos neste território, devem ser assumidas e reconhecidas como essenciais à gestão destas manchas, apresentando-se como única alternativa economicamente viável para a gestão do risco de incêndio.

Estes são os passos fundamentais para que esta e outras atividades ligadas ao sector primário possam continuar a contribuir positivamente para o desenvolvimento dos meios rurais e, consequentemente, para o desenvolvimento do país.

Janeiro de 2023

O Autor

Marco André Magalhães Ribeiro é licenciado em Engenharia Florestal, pela Escola Superior Agrária de Viseu, e tem frequência de mestrado na mesma área, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Tem 10 anos de experiência profissional na liderança de equipas de gestão e aproveitamento de recursos naturais e florestais, na elaboração de projetos florestais e candidaturas a fundos comunitários, na elaboração de relatórios de análise e gestão de risco de incêndio em áreas florestais. É ainda formador e técnico credenciado em fogo controlado (integra a Bolsa Nacional de Formadores em Fogo Controlado). Recentemente, assumiu o cargo de Presidente da Resipinus – Associação de Destiladores e Exploradores de Resina em Portugal.

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