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Bioeconomia

Relatório do BIC destaca posição privilegiada de Portugal na transição para a bioeconomia

Portugal encontra-se numa posição privilegiada para liderar a transição para a bioeconomia na Europa, reconhece o “Mapping Portugal’s bio-based potential”, um novo Relatório do BIC - Bio-based Industries Consortium, que identifica as indústrias da “alimentação e bebidas”, da “pasta e papel” e “do processamento de madeira” como três dos motores nacionais da bioeconomia.

O sector da bioeconomia já contribui com cerca de 20 mil milhões de euros por ano para a economia portuguesa. Os recursos disponíveis, a estrutura de inovação e a capacidade transformadora instalada colocam o nosso país na linha da frente da transição para um modelo económico baseado na gestão e valorização sustentáveis dos recursos biológicos renováveis.

Quem o afirma é o BIC – Bio-based Industries Consortium, a principal associação europeia do sector constituída por mais de 240 membros de toda a cadeia de valor da bioeconomia – no seu relatório “Mapping Portugal’s bio-based potential” de fevereiro 2021, que revela o potencial de Portugal para se afirmar como um dos líderes do Pacto Ecológico Europeu.

O Relatório do BIC, que identifica as forças e fragilidades portuguesas na transição para uma economia verde e baseada no desenvolvimento sustentável, ressalta “a infraestrutura bem organizada de suporte à inovação” existente em Portugal, a sua crescente influência “enquanto líder no sector da biotecnologia” e o “alargado leque de oportunidades que permitem a transformação de recursos e resíduos orgânicos em produtos de valor acrescentado”.

Portugal tem condições económicas e industriais “e o poder de inovação para expandir rapidamente as atividades de base biológica, a nível regional e nacional”, afirma o Relatório do BIC.

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Relatório do BIC ressalta capacidade inovadora portuguesa

O documento assinala o facto de Portugal ter reforçado a sua capacidade inovadora e de a ver reconhecida, em 2020, ao ser integrado no grupo dos países europeus considerados como “Fortes Inovadores” (com resultados próximos da média europeia), o segundo melhor escalão do desempenho em inovação na avaliação da Comissão Europeia, lado a lado com a Alemanha, Áustria, Bélgica, Estónia, França e Irlanda.

Sistema de Inovação: desempenho dos Estados-membros da União Europeia

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Fonte: Comissão Europeia – European Innovation Scoreboard 2020

Relativamente à estrutura nacional de conhecimento, inovação e empreendedorismo, o Relatório do BIC refere que, nos últimos anos, Portugal se estabeleceu como uma força crescente na biotecnologia: constituiu uma rede abrangente de incubadoras e parques tecnológicos, nomeadamente em Aveiro, Braga, Coimbra, Faro, Lisboa e Porto, e novos produtos estão a ser desenvolvidos conjuntamente pela indústria, academia, universidades e centros de investigação.

Diversos intervenientes académicos e industriais portugueses integram também projetos europeus de base biológica, incluindo os relacionados com o sector florestal, como por exemplo:

• Projeto BeonNAT – este consórcio, que integra entidades de diversos países (incluindo o Instituto Politécnico de Bragança, responsável pelos ensaios de bioatividade), irá procurar e selecionar espécies de árvores e arbustos que possam ser usadas em áreas marginais e servir de fontes de biomassa florestal para a produção de oito novos bioprodutos. Considerando os requisitos ecológicos de cada espécie e as suas características químicas para os bioprodutos, serão escolhidas as melhores para serem utilizadas nas áreas de estudo de Espanha, Alemanha e Roménia para a produção de óleos essenciais, extratos herbais, pasta para papel, aglomerado, bioplásticos para embalagem, biochar ou carvão vegetal, carvão ativo e absorventes para animais domésticos. O projeto teve início em julho de 2020 e irá terminar em 2025, não havendo ainda resultados disponíveis.

• Projeto WoodZymes – esta iniciativa, que termina neste ano de 2021, junta 11 participantes de quatro países europeus (entre os quais o RAIZ – Instituto de Investigação da Floresta e Papel) que unem esforços para desenvolver e fornecer às indústrias “enzimas transformadoras de madeira” ativas em condições extremas de operação – de calor ou pH, por exemplo. O objetivo é desenvolver e avaliar estas enzimas como catalisadoras de processos de recuperação de subprodutos de fábricas de papel para obter novos materiais adesivos (substituindo derivados fósseis) para o fabrico de aglomerado de fibras de madeira de média densidade (MDF) ou poliuretanos (PU), assim como açúcares derivados de celuloses para serem usados como aditivos no fabrico de papel.

O valor criado pelas bioindústrias na União Europeia cresceu 23% entre 2008 e 2017, ano em que o seu contributo na EU-27 foi estimado em 614 mil milhões de euros (cerca de 4,7% do Produto Interno Bruto desta zona), revela o relatório sobre a bioecomia da Europa do JRC (Joint Research Center) da União Europeia. A silvicultura (25 mil milhões de euros), os produtos de madeira e mobiliário (47 mil milhões de euros) e a produção de pasta e papel (42 mil milhões de euros) foram responsáveis por cerca de 114 milhões de euros de valor acrescentado.

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O Relatório do BIC salienta também que, embora as atividades no sector da bioeconomia tenham surgido em anos recentes, há áreas já com fortes contributos nesta matéria tanto no sector primário, como acontece na agricultura, silvicultura e na pesca, como no sector secundário. As indústrias de alimentos, bebidas e tabaco, dos produtos de madeira e do papel foram responsáveis pelos principais contributos para os perto de 20 mil milhões de euros gerados em 2018 pela bioeconomia portuguesa. Para este resultado colaboram também parte das atividades dos sectores têxtil, químico e farmacêutico.

Para ser este catalisador da bioeconomia europeia, são avançadas outras condições do país, como é o caso da extensão e importância económica da sua floresta – mais de um terço de território coberto por floresta e cerca de 1,25 mil milhões de euros provenientes das atividades florestais em 2017, refere.

É preciso valorizar mais resíduos em aplicações com valor acrescentado

“As quantidades de diferentes fluxos de biomassa residual em Portugal são suficientes para produzir bioquímicos à escala comercial”, confirma o Relatório do BIC, advertindo, no entanto, que não existem muitas biorrefinarias no país. As que existem utilizam principalmente matérias-primas de base florestal para produção de químicos, compósitos e fibras, e biocombustíveis, indica.

Relativamente à disponibilidade de recursos com potencial de transformação no âmbito da bioeconomia, o relatório considera que existem novas oportunidades para acelerar o crescimento económico verde no país. Para a indústria de base biológica é, assim, de interesse explorar as disponibilidades de resíduos não utilizados da agricultura, silvicultura, bem como dos sectores marinho/aquático, dada a sua dimensão e potencialidades. Outros contributos a considerar resultam do processamento de alimentos e rações, da indústria madeireira e dos resíduos urbanos.

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Na agricultura, o relatório do BIC identificou cerca de 1,17 milhões de toneladas de resíduos em 2007. Embora não totalmente disponíveis para uso como a biomassa (por exemplo, a palha é usada primariamente para alimentar e fazer camas para o gado), existe um elevado potencial de aproveitamento noutras culturas com grande expressão em Portugal, como sejam a azeitona e a vinha, ambas com grandes quantidades de resíduos associados. Na área florestal, estima-se que a produção de resíduos (da exploração florestal e processamento de madeira) varie entre 1,7 e 2,5 milhões de toneladas secas anuais.

Também as cidades geram quantidades significativas de resíduos biológicos. Apesar da evolução ao nível da reciclagem e da valorização de resíduos, estima-se que, em 2018, 38,4% das 2,7 milhões de toneladas de resíduos orgânicos geradas nos municípios tenha tido o aterro como destino. Uma vez que esta opção está a ser eliminada gradualmente, por imposição do artigo 22 da Diretiva-Quadro de Resíduos (que incentiva a recolha seletiva dos biorresíduos), também estes resíduos deverão criar oportunidades de conversão em aplicações de valor acrescentado.

A maioria das matérias-primas suscetíveis de integrar operações de base biológica e ser valorizada em produtos e serviços de elevado valor acrescentado está a ser desperdiçada. É incinerada, segue para aterro ou alcança um valor relativamente baixo, refere o relatório do BIC, que deixa exemplos de projetos europeus que podem contribuir para levar a cabo estas melhorias.

Em paralelo, lembra que Portugal se encontra a finalizar a sua estratégia nacional para a bioeconomia, documento estratégico que deverá apoiar as operações de base biológica locais, regionais e nacionais.