Conhecer

Óleos Essenciais

Óleo essencial: uma fonte de diversos compostos bioativos

Os óleos essenciais são cada vez mais procurados para aplicação em aromaterapia, em produtos cosméticos, como ambientadores e até na haute cuisine. Mas o que é afinal um óleo essencial e o que o distingue de outros óleos vegetais e extratos de plantas? Ana Cristina Figueiredo ajuda-nos a conhecer o que caracteriza este recurso natural.

Cada vez mais reconhecidos pela sua aplicação em áreas que vão da cosmética à alimentação, os óleos essenciais são, muitas vezes, confundidos com óleos vegetais, apesar de diferirem na forma como são isolados, na sua composição e aplicações. Apesar destas diferenças, não é invulgar encontrá-los juntos em alguns preparados comerciais, medicinais ou industriais. Mas o que é então um óleo essencial e o que o distingue?

Um óleo essencial é um tipo particular de extrato derivado de recursos vegetais – partes de plantas –, cuja obtenção está padronizada internacionalmente (Council of Europe 2010; ISO 9235:2021), e que resulta em exclusivo de um de dois processos de extração:

1. Destilação de parte de uma planta. Este processo é o mais comum e pode ser feito recorrendo a três procedimentos diferentes: arrastamento de vapor, hidrodestilação, ou destilação a seco.

2. Picotagem a frio. Este é um processo mecânico, também designado como “expressão”, que se aplica apenas para obtenção de óleo essencial proveniente do epicarpo (a parte exterior ou casca) dos citrinos, como o limão ou laranja.

Assim, de acordo com estas condições particulares de extração, apenas o epicarpo dos citrinos nos pode fornecer dois tipos de óleo essencial, o obtido por destilação, ou o obtido por expressão. E embora provenham ambos da mesma fonte, diferem substancialmente no seu aroma, na sua composição e nas suas propriedades.

Conhecer_Oleo_EssencialInterior1
Conhecer_Oleo_EssencialInterior2

Outras técnicas, como extração supercrítica, por micro-ondas, com solventes a quente e/ou a frio, para referir apenas algumas, podem fornecer extratos mais ou menos aromáticos, que podem ter também aplicação medicinal, comercial ou outra. Contudo, porque a sua composição pode diferir largamente da de um óleo essencial, não devem ser assim designados para evitar ambiguidades na sua utilização e salvaguardar o consumidor. Mais adequadas serão designações como extrato supercrítico, extrato com solvente orgânico ou óleo vegetal, consoante a técnica utilizada.

Conhecer_Oleo_EssencialInterior3
Conhecer_Oleo_EssencialInterior4
Conhecer_Oleo_EssencialInterior5

© Ana Cristina Figueredo

O método de extração por destilação de um óleo essencial difere substancialmente daquele que é utilizado no isolamento dos óleos vegetais, como o azeite, o óleo de amêndoa doce, ou o de semente de uva, por exemplo.

Acresce que apenas do processo de obtenção de óleos essenciais por destilação se obtém mais um coproduto – o hidrolato, sendo que se obtém por vezes um segundo coproduto – a água de decocção. Ambos têm aplicações variadas: cosméticas, medicinais e em alimentos e bebidas.

O hidrolato, que nunca é obtido com os métodos de isolamento de óleos vegetais, é (igualmente por definição internacional ISO 9235:2021) a água destilada aromática obtida conjuntamente com o óleo essencial. Este hidrolato obtém-se com qualquer um dos três procedimentos de destilação acima referidos (arrastamento de vapor, hidrodestilação, ou destilação a seco). Já a água de decocção (ou água de cozimento) obtém-se apenas se a extração for feita por hidrodestilação.

A destilação por arrastamento de vapor é o método industrial mais empregue na obtenção de óleos essenciais. Deste processo, resultam então um óleo essencial, um hidrolato e uma água residual de condensação, tudo isto recorrendo apenas à água como solvente. Estes dois coprodutos da extração de óleos essenciais são igualmente fonte de compostos bioativos, voláteis e não voláteis.

Apesar de óleos essenciais e óleos vegetais partilharem, em regra, a baixa afinidade para a água (não se misturam, afastando-se como o azeite e a água), diferem grandemente na sua composição. Enquanto os óleos vegetais são, maioritariamente, constituídos por proporções variáveis de ácidos gordos, na composição de óleos essenciais entram, por vezes, centenas de compostos que pertencem a famílias químicas com características diversas. Entre estes podemos salientar terpenos, fenilpropanoides, poliacetilenos, alcaloides, ácidos gordos, entre outros.

Variabilidade é um dos elementos distintivos do óleo essencial

Além do processo de extração ser determinante na sua obtenção, saber o que são óleos essenciais implica compreender também que a composição de cada um destes extratos é característica de uma espécie vegetal, mas que existe variabilidade entre óleos essenciais de uma mesma espécie.

Esta variabilidade acontece porque as plantas são sistemas biológicos, sujeitos a diferentes fases de desenvolvimento, a sazonalidade e a diferentes condições de vida e stress (diferentes efeitos das alterações climáticas e pragas diversas, por exemplo). Nesse sentido, de uma planta em floração ou em frutificação não se obtém, necessariamente, o mesmo tipo de óleo essencial do que de uma planta em fase vegetativa (período após a germinação, anterior à floração). O mesmo acontece quando a extração é feita de diferentes partes da planta.

Vejamos um exemplo: o óleo essencial isolado das partes aéreas (folhas e caules, por exemplo) dos coentros (Coriandrum sativum) tem uma composição química muito distinta da que é obtida dos correspondentes frutos (sementes). Acresce que, tal como os gémeos podem ser visualmente indistintos, mas ter personalidades diferentes, também indivíduos de uma mesma espécie de planta podem ter fenótipos semelhantes, mas composições químicas diversas, os chamados quimiotipos. Assim, de uma mesma espécie resultam óleos essenciais de composição química, aplicação e valor comercial distinto.

É importante conhecer esta potencial variabilidade, dado os óleos essenciais possuírem diferentes compostos bioativos e terem uma aplicação muito diversificada: nas indústrias alimentar, de bebidas, perfumaria, farmacêutica, têxtil e agrícola, entre outras.

Esta diversidade de aplicações reside no facto de aliarem o seu aroma a um conjunto de propriedades biológicas, como antioxidante, antimicrobiana, anti-inflamatória, antidepressiva, entre muitas outras.

Conhecer_Oleo_EssencialInterior6

Um óleo essencial de qualidade deve adequar-se à utilização em vista e manter uma constância dentro de certos requisitos físicos e de composição química:

– Em termos de características físicas, salientam-se, entre outras, o aspeto, a cor, o odor, o índice de refração (propriedade física que mede a alteração da velocidade da luz e permite indicar a pureza de um líquido) ou a capacidade de se misturar homogeneamente em etanol (álcool etílico).

– Do ponto de vista da composição, as percentagens dos seus constituintes característicos e representativos devem situar-se dentro de um intervalo de valores previamente definidos.

Em alguns casos, esta padronização está já internacionalmente reconhecida, e disponível, por exemplo em normas da International Organization for Standardization (ISO) ou em monografias de Farmacopeias nacionais e internacionais.

Produção de óleos essenciais com tendência de crescimento em Portugal

Do ponto de vista produtivo, assistiu-se, nos últimos anos, a um interesse crescente na produção de óleos essenciais em Portugal. Quando, em 2010, se fez uma primeira tentativa de compilação sobre os produtores, e tipos de óleos essenciais produzidos em Portugal, apenas 11 espécies vegetais eram apontadas como utilizadas para o efeito. A produção total, com base nos dados fornecidos pelos produtores que gentilmente responderam, estava perto das 13 toneladas, nesse ano.

Em 2018, um novo inquérito revelou que o número de espécies tinha mais do que duplicado, sempre com o óleo essencial de eucalipto liderando largamente a produção nacional. Nesse ano, os dados obtidos apontaram para uma produção total de, aproximadamente, 15,5 toneladas.

Nova avaliação da produção nacional está em curso em 2023, englobando Portugal continental e também os arquipélagos da Madeira e dos Açores.

Conhecer_Oleo_EssencialInterior7

Tradicionalmente associados às plantas aromáticas e medicinais – que vão desde as plantas herbáceas, às árvores das nossas florestas –, os óleos essenciais surgem como uma fonte de rendimento adicional, que se pode posicionar a dois níveis: por um lado, ao das plantas cultivadas para o efeito e, por outro, ao aproveitamento de sobrantes florestais, hortofrutícolas, ou de floricultura. Cada um destes níveis tem as suas vantagens e limitações.

O cultivo específico de plantas para extração de óleos essenciais preserva a biodiversidade, por evitar a colheita desregrada que leva à diminuição da nossa flora, e permite ao produtor investir nas variedades e (ou) quimiotipos de maior interesse comercial. Nesse sentido trabalham também já várias entidades nacionais, para aliar aos descritores agronómicos os descritores químicos mais relevantes, e assim fornecer aos produtores um conhecimento fundamentado, que apoie as suas escolhas. Em muitos casos, estas explorações estão incluídas em sistemas agrícolas e agroflorestais mais alargados, de desenvolvimento local, que incluem, entre outros, o turismo de natureza ou rural.

A área de sobrantes de podas da hortofrutícolas ou da floricultura é ainda pouco explorada em Portugal, estando a dar os primeiros passos. No aproveitamento dos sobrantes florestais para a produção de óleo essencial existe já algum trabalho feito – assim como vários estudos científicos – para espécies de árvores como o eucalipto (Eucalyptus globulus) o pinheiro-bravo (Pinus pinaster), o pinheiro-manso (Pinus pinea), a criptoméria (Cryptomeria japonica) o cedro-do-Buçaco (Cupressus lusitanica), ou de arbustos como a esteva (Cistus ladanifer).

Nesta vertente dos sobrantes florestais, importa frisar a importância que o aproveitamento pode ter na manutenção das matas e da floresta nacional no seu todo, contribuindo para a diminuição do excesso de biomassa que alimenta os incêndios e dando um valor adicional ao material vegetal deixado ao abandono.

Conhecer_Oleo_EssencialInterior8

Portugal reúne as condições edafoclimáticas (de solo e clima) necessárias ao cultivo de plantas para extração de óleos essenciais, e tem, igualmente, um potencial a explorar no aproveitamento de sobrantes florestais, e industriais diversos, refere Ana Cristina Figueiredo. A maior limitação nacional é a reduzida dimensão das explorações florestais, assim como a falta de agregação e investimento no sector.

*Artigo em Colaboração

Ana Cristina Figueiredo

Ana Cristina Figueiredo é investigadora do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM Ciências) e do Centro de Biologia Vegetal, na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, na qual é também professora (no Departamento de Biologia Vegetal).

Email e curriculum científico no ORCID