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Espécies Florestais

Loureiro: nobre, aromático e sempre verde

Símbolo de louvor e frequentemente referido na antiga mitologia, é mais conhecido pelas suas folhas, que há muito dão sabor à gastronomia. Falamos do loureiro, ou melhor, dos loureiros, porque são três as espécies presentes em Portugal, que pode conhecer neste artigo em colaboração com Raquel Gaspar.

O loureiro, também conhecido como louro, loureiro-comum, loureiro-vulgar, loureiro-dos-poetas ou sempre-verde é uma espécie ornamental e medicinal, mas é a sua utilização na culinária que a torna mais reconhecida entre os portugueses e vários outros povos mediterrânicos.

De nome científico Laurus nobilis, é uma espécie autóctone, ou seja, que cresce naturalmente no território continental português. Pode encontrar-se em matas, bosques e galerias ripícolas (vegetação nas margens dos rios), acompanhada de outras espécies (principalmente carvalhos) ou então formando os chamados louriçais, aglomerados de loureiros de porte alto.

Arbusto ou árvore pequena, com 5 a 10 metros de altura, o loureiro tem uma copa densa e as suas folhas perenes (que não caem no outono, mantendo-se verdes durante todo o ano) têm uma forma que lembra uma lança, com a margem ondulada. São verde-escuras na página superior (face da folha voltada para cima) e verde-pálidas na inferior.

A floração ocorre de fevereiro a maio, época em que podem ser vistas as suas pequenas flores de tom amarelo-pálido. Há árvores apenas com flores femininas (flores estas mais esverdeadas) e outras apenas com flores masculinas (flores unissexuais), uma característica das chamadas espécies dioicas. O seu fruto parece uma pequena azeitona verde, mas após a maturação, que ocorre entre setembro e outubro, fica preto.

Embora seja originário da região mediterrânica e da Ásia Menor (região asiática que corresponde na sua maior parte à atual Turquia, que é o maior o maior produtor e exportador de louro), o loureiro é cultivado há tanto tempo que a sua distribuição se tornou muito ampla, quase global.

Esta sua longa história de cultivo torna complicado identificar as populações naturais e distingui-las daquelas que, tendo sido plantadas, acabaram por se naturalizar (multiplicando-se e desenvolvendo-se naturalmente).

Em Portugal, o loureiro está presente praticamente em todo o território nacional, especialmente na zona Norte e Centro (no mapa, as zonas a verde-claro representam as áreas de possível observação, e a verde-escuro, as áreas onde o loureiro é mais frequente).

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Fonte: mapa adaptado de “Guia da Flora de Portugal Continental, Tomo I, Parte I”, de André Carapeto, Paulo Pereira e Miguel Porto, Ed. Imprensa Nacional

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O loureiro pode ser encontrado até cerca de 800 metros de altitude, em locais com solos frescos e leves. Embora seja pouco exigente em relação aos tipos de solo onde fixa raízes e indiferente ao pH que estes possuem (grau de acidez, neutralidade ou basicidade), prefere climas amenos, sem ventos frios e geadas.

Populações antigas, consideradas naturais, podem ser encontradas em matagais e bosques, como na Mata da Margaraça, juntamente com outras espécies. Quando é o Laurus nobilis que predomina, pode formar então os chamados Louriçais, que consistem em matagais fechados com árvores de porte alto. Estas configurações formam um habitat natural protegido pela Rede Natura 2000: Matagais arborescentes de Laurus nobilis (5230), louriçais (ou loureirais) (5230pt1).

Dada a vasta área em que está presente e a sua abundância pela Europa e parte da Ásia, o estado de conservação é considerado pouco preocupante (LC) na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

Dois loureiros nativos dos arquipélagos

Para além desta espécie habitual no continente, há dois outros loureiros das ilhas portuguesas. Tal como o Laurus nobilis, pertencem à família Lauraceae, cujas árvores e arbustos se distinguem, entre outras características, pelas suas folhas perenes (sempre verdes), por possuírem glândulas com óleos aromáticos, e pelos frutos – drupas parecidas com as azeitonas:

– o louro-da-terra ou louro-bravo (Laurus azorica) – só existe naturalmente (endémico) no arquipélago dos Açores e está presente nas nove ilhas deste arquipélago. É uma espécie arbórea que atinge uma altura média de 10 metros, importante nas florestas de altitude. O seu estado de conservação foi considerado pouco preocupante (LC), pela IUCN.

– o loureiro-da-Madeira (Laurus novocanariensis) – só existe naturalmente (endémico) nas ilhas da Madeira e das Canárias. Não é muito diferente do Laurus nobillis: também tem flores pequenas de cor branco-amarelado e folhas em forma de lança, mas consegue chegar até aos 20 metros de altura, o dobro face ao loureiro continental. O seu estado de conservação é igualmente considerado pouco preocupante (LC), na lista vermelha da IUCN.

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Foi a predominância de árvores da família Lauraceae, onde se insere o loureiro, que deu nome à floresta Laurissilva. Há mais de 20 milhões de anos (Período Terciário), estas florestas estavam presentes na maior parte do sul da Europa e no norte de África, mas as alterações geográficas e climáticas que ocorreram no passado – glaciações, separação dos continentes ou a desertificação do Sahara –, fizeram com que a Laurissilva somente conseguisse prosperar nos climas amenos dos arquipélagos onde se encontra atualmente.

Contudo, o loureiro existente no continente, Laurus nobilis é uma espécie mediterrânica, enquanto o loureiro que faz parte da floresta Laurissilva da Madeira é uma espécie endémica macaronésica. A Laurissilva da Madeira, classificada como património mundial natural da UNESCO em 1999, está também presente no arquipélago dos Açores e nas Canárias que, juntamente, com Cabo Verde formam a região da Macaronésia.

Três espécies de loureiro com longa história de aplicação

Os três loureiros “portugueses” têm uma longa história de aplicação, na região da bacia mediterrânica.

Além do uso culinário e de ser atualmente integrado em jardins e parques como espécie ornamental, o loureiro continental foi valorizado nas medicinas tradicionais por lhe serem reconhecidas variadas propriedades curativas, desde estimulante a antissética e sudorífica (estimulante de transpiração), e benefícios vários, por exemplo, no tratamento de enxaquecas, problemas intestinais e calvície.

A madeira do Laurus nobilis – pesada, de aroma agradável e tonalidade clara – é usada em marchetaria (arte de ornamentar móveis) e o óleo essencial do seu fruto é usado no fabrico de sabão há mais de 2 mil anos, sendo um dos principais ingredientes do sabão de Alepo tradicional da Síria (juntamente com o azeite).

Como esta espécie é resistente a doenças e pragas, é também um excelente inseticida natural, pois protege dos insetos as plantas em seu redor.

Mais recentemente, o composto químico lauroside B, isolado a partir de Laurus nobilis, inibiu a proliferação das células do melanoma humano (cancro de pele), resultado obtido em concentrações elevadas, testadas in vitro.

O loureiro açoriano tem a sua história ligada à do arquipélago dos Açores, já que a sua madeira foi historicamente usada para construção, fabrico de carvão vegetal e o tronco serviu até para recolher água da chuva. À semelhança da espécie endémica da ilha da Madeira, o seu fruto era usado para fabrico de óleo, para fins medicinais e iluminação. E as bagas servem também de alimento a várias espécies, entre as quais se salienta o pombo-torcaz.

Também o fruto do loureiro madeirense tem tradição na produção de azeite de louro, ao qual são atribuídos efeitos medicinais. A sua madeira tem sido usada em marcenaria, enquanto os ramos dão sabor à espetada madeirense.

Nos troncos deste loureiro é frequente encontrar um fungo parasítico (o Laurobasidium laurii), conhecido como madre-de-louro, que era usado na medicina tradicional para tratar problemas de origem circulatória ou erupções cutâneas, entre outras. Estudos recentes mostraram que esta espécie tem propriedades antioxidantes e bioativas.

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Sabão de Alepo e fungo madre-de-louro

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 Sabia que…

  • Pensa-se que o nome do género, Laurus, deriva das palavras celtas lawr ou blawr que significam verde, fazendo referência ao facto das suas folhas estarem verdes o ano inteiro. Já o epíteto específico nobilis, significa nobre em latim, fazendo referência ao seu simbolismo de representar os vencedores e gloriosos.
  • Na antiguidade, o loureiro era conhecido por “Loureiro do Apolo”, devido à lenda em que a ninfa Dafne se transformou num loureiro para fugir do deus Apolo, que estava apaixonado por ela.
  • O loureiro era usado como símbolo de vitória na Grécia e Roma antigas. Daí derivou a palavra laureado, ainda usada hoje.
  • Na tradição cristã, o louro simboliza a ressurreição de Cristo e na bíblia está associado a prosperidade e a fama.
  • A espécie Prunus laurocerasus (loureiro-cerejeiro ou louro-cerejo) é muitas vezes confundida com o loureiro, sendo esta espécie venenosa e habitualmente usada também como planta ornamental.
*Artigo em Colaboração

Raquel Gaspar

Raquel Gaspar frequenta a licenciatura de Biologia, no Instituto Superior de Agronomia, e colaborou com a plataforma Florestas.pt, na elaboração deste conteúdo, no âmbito dos estágios de verão alumnISA – Instituto Superior de Agronomia.