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Espécies Florestais

Salgueiro: um género associado às margens de rios e lagoas

Na região mediterrânica, o salgueiro é um género botânico muito associado às margens dos rios e de outras linhas de água. Como os seus ramos foram amplamente usados na cestaria artesanal, foram introduzidas e cultivadas diferentes espécies no nosso país, mas há várias autóctones para conhecer neste artigo em colaboração com Mariana Afonso Martins.

O nome salgueiro refere-se ao género Salix, que inclui arbustos e árvores normalmente presentes nas margens de cursos de água (chamadas de galerias ripícolas) e nas zonas húmidas em geral. As diferentes espécies são conhecidas por vários nomes populares que, além de salgueiros, incluem vimeiros, borrazeiras ou seiceiros.

Várias espécies e variedades de cultivo (cultivares) de salgueiro foram, desde há muito, plantadas no nosso país para colher as suas ramagens flexíveis, que conhecemos por vime e que foram usadas tradicionalmente na criação de peças e utensílios artesanais. Mais recentemente, várias espécies de salgueiro têm sido valorizadas pelo seu papel ecológico, pois as suas raízes ajudam a fixar o solo – e a travar a erosão – junto aos cursos de água. 

A existência de várias espécies e cultivares, assim como a facilidade com que as diferentes espécies de salgueiros se cruzam (criando híbridos) faz com que existam muitos arbustos e árvores do género Salix nem sempre fáceis de distinguir. Esta dispersão torna complexa a identificação, descrição e classificação (taxonomia) dos salgueiros e dificulta saber quais serão nativos de cada território. 

De nome científico Salix, os salgueiros pertencem à família das salicáceas (Salicaceae), que é representada em Portugal continental por várias espécies, distribuídas por dois géneros, os salgueiros (Salix) e os choupos (Populus). Por serem ambos géneros com várias espécies introduzidas por cultivo – os salgueiros para aproveitamento do vime e os choupos pela sua madeira – não existem certezas sobre o caráter nativo de todas elas.

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Os salgueiros são muito apreciados como espécies ornamentais, além de serem usados em trabalhos artesanais de cestaria, tamancos e mobiliário, em função da flexibilidade e elasticidade da sua ramagem. Consta que outrora, muitas harpas eram feitas com madeira de salgueiro. A arte da cestaria, hoje menos generalizada, tem ainda algum mercado no turismo regional. Por exemplo, Gonçalo, uma freguesia do concelho da Guarda, é um dos locais onde se tem mantido a tradição.

Salgueiros 

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De acordo com o “Guia da Flora de Portugal Continental” (Tomo 1, Parte 1), das espécies de salgueiros considerados nativos no nosso país, as mais fáceis de identificar são o salgueiro-preto (Salix atrocinerea) e a borrazeira-branca (Salix salviifolia), que se faz representar por duas subespécies: subsp. australis, a Sul, e subsp. salviifolia, no Centro e no Norte.

São ainda considerados autóctones o salgueiro-branco (Salix alba), o salgueiro ou vimeiro‑brózio (Salix neotricha), o salgueiro-com-folhas-de-amendoeira (Salix triandra), o salgueiro-roxo (Salix purpurea) e o Salix caprea, de acordo com as “Espécies Arbóreas Indígenas em Portugal Continental”, do ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.

Existem também duas espécies de salgueiros exclusivamente arbustivas: o salgueiro-anão (Salix repens), exclusivo das zonas montanhosas do Norte, e o salgueiro-das-areias (Salix arenaria), presente nas areias do litoral Norte e Centro. A semelhança entre ambos leva alguns autores a considerar que são subespécies distintas pertencentes à mesma espécie – a Salix repens.

Todas estas espécies de salgueiro ocorrem normalmente na proximidade das de margens de cursos de água e em zonas húmidas. Em muitos casos, podemos vê-las a delimitar campos agrícolas ribeirinhos.

Distribuição das quatro espécies nativas de salgueiro mais frequentes em Portugal

Salgueiro-preto (Salix atrocinerea)

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Borrazeira-branca (Salix salviifolia)

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Salgueiro-branco (Salix alba)

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Vimeiro‑brózio (Salix neotricha)

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Nota: As áreas a verde-escuro indicam as zonas onde os respetivos salgueiros são mais frequentes

Fonte: Mapas adaptados do “Guia da Flora de Portugal Continental, Tomo I, Parte I, de André Carapeto, Paulo Pereira e Miguel Porto, Ed. Imprensa Nacional e de Espécies Arbóreas Indígenas em Portugal Continental – Guia de utilização, editado pelo ICNF

Pensa-se que o nome Salix derive do céltico “sal”, que significa perto, e “lis”, que significa água, aludindo ao seu habitat preferencial localizado perto de água. Refira-se que o salgueiro se propaga facilmente em solos húmidos, criando raízes novas a partir da raiz principal ou através de estacas e galhos que caem no solo e dão lugar a novas árvores (reprodução por alporquia e estacaria). A fixação das suas raízes no solo, próximo dos cursos de água, ajuda a prevenir a erosão nas margens.

Embora as várias espécies de salgueiros nativos tenham características específicas, têm também várias semelhanças:

– São tipicamente árvores ou arbustos de ramos flexíveis (embora com diferentes flexibilidades) que, normalmente, contêm salicina, uma substância anti-inflamatória próxima do ácido acetilsalicílico que constitui o princípio ativo da aspirina.

– As suas folhas são alternas (a folha seguinte está um pouco acima da anterior ao longo do ramo), de forma ovalada ou lancelolada (compridas e em forma de lança), embora umas mais longas que outras.

– Todas as espécies são dioicas, ou seja, há árvores só com flores femininas e outras só com flores masculinas.

– As suas flores aparecem agrupadas em amentilhos (cachos ou espigas alongadas), sendo as femininas mais pequenas do que as masculinas. Os amentilhos masculinos têm uma coloração esverdeada e os femininos amarela.

– Os frutos são cápsulas, normalmente pilosas, e contêm no seu interior sementes pequenas, semelhantes a algodão, que são dispersas pelo vento.

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Imagens ilustrativas do salgueiro-branco

9 espécies de salgueiro nativas em Portugal continental

As diferenças entre algumas espécies de salgueiro são visíveis em características como o porte e a altura a que podem elevar-se, o comprimento das suas folhas, a época de floração ou o tipo de habitat. Conheça algumas características de nove espécies nativas de salgueiro.

1. Salgueiro-preto (Salix atrocinerea)

O Salix atrocinerea é uma árvore de pequeno porte ou arbusto, que pode crescer até aos 10 a 15 metros de altura. As folhas, de forma oblonga-obovada, são menos longas e compridas do que as de outros salgueiros e os seus ramos não têm muita flexibilidade, não sendo usados em cestaria. Caracteriza-se pelo tronco reto, de cor cinzenta ou castanho-escura e pelas folhas verde-escuras.

A sua floração precoce, que começa ainda no inverno (janeiro a abril), faz com que seja uma planta melífera importante.

É nativo da Europa e mais frequente na Europa atlântica e no Oeste da região mediterrânica, desde as ilhas britânicas até Portugal. Pode encontrar-se em bosques, charnecas e matagais ripícolas. Em Portugal continental, está mais presente nas regiões Norte e Centro e no litoral.

O salgueiro-preto ou borrazeira-preta é mais rústico (menos exigente e mais resistente) do que outras espécies de Salix, embora se desenvolva melhor em locais com muita exposição solar e seja pouco tolerante a temperaturas extremas. Pela sua rusticidade, é muito usado para fins ornamentais, mas é o seu papel ecológico que merece relevo, em particular na fixação do solo nas margens dos cursos de água e nas zonas húmidas suscetíveis à erosão.

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Como se propaga bem por estaca (a partir de ramos cortados e enterrados, que vão gerar novas raízes) e o seu enraizamento é fácil e abundante, as suas estacas podem ser utilizadas em obras de reabilitação e conservação das margens de cursos de água através das chamadas técnicas de engenharia natural – conjugando técnicas construtivas e dinâmicas biológicas.

O salgueiro-preto está a ser também estudado para tratamento de águas poluídas, transformando resíduos tóxicos em matéria orgânica.

É uma espécie que se cruza (hibridiza) com muita facilidade com outras espécies de salgueiros, estando descritos vários híbridos.

Os Salgueirais arbóreos psamófilos de Salix atrocinerea estão protegidos pelo Anexo I da Diretiva Habitats (subtipo 92A0pt3). Quer isto dizer que estão sob proteção os salgueirais desta espécie, quando têm porte de árvore (pelo menos cinco metros de altura) e se desenvolvem na proximidade de linhas de água ou nas suas margens, em solos ácidos arenosos.

2. Borrazeira-branca (Salix salviifolia)

A borrazeira-branca tem porte frequentemente arbustivo, podendo crescer até aos seis a sete metros de altura. Os seus ramos são longos e flexíveis e a copa apresenta um tom verde-claro (glauco) devido aos pelos moles (tomento) que cobrem as folhas com uma camada macia que lembra lã (lanosa). A forma das folhas é lanceolada.

A espécie é nativa do sudoeste da Europa, sendo considerada um endemismo das regiões central e ocidental da Península Ibérica. No nosso país ocorre em todo o território continental, exceto no litoral noroeste.

Encontra-se em bosques e matagais ripícolas, principalmente junto a cursos de água de regime torrencial, por onde as águas correm copiosamente durante chuvas intensas ou tempestades.

Não tem as melhores características para a cestaria, sendo uma espécie mais interessante como ornamental e para o revestimento de margens de cursos de água e de outras zonas húmidas. Propaga-se por estacas e enraíza facilmente, podendo ser usada em obras de reabilitação e conservação de margens através de técnicas de engenharia natural.

É representada por duas subespécies em Portugal continental, subsp. australis, a sul, e subsp. salviifolia, no resto do país. A subespécie australis é muito rara e tem estatuto especial de proteção. Está incluída no Anexo II da Diretiva Habitats, integrando as espécies de interesse comunitário cuja ocorrência implica a delimitação de áreas de conservação.

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Imagem da espécie Salix salviifolia subesp. Salviifolia, por António Crespí, do Jardim Botânico UTAD, Flora Digital de Portugal.

Os Salgueirais arbustivos de Salix salviifolia subsp. salviifolia e de Salix salviifolia subsp. australis constituem habitats protegidos – subtipos 92A0pt4 e 92A0pt5, respetivamente.

3. Salgueiro-branco (Salix alba)

O salgueiro-branco é um dos que tem maiores dimensões – pode crescer até aos 30 metros – e um dos mais conhecidos, pois tem uma distribuição ampla: está presente no Norte de África, Europa e chega, através da Rússia, até às fronteiras chinesas. É uma espécie de crescimento rápido e vida curta (20 a 30 anos), que tolera vários tipos de solos desde que as suas raízes tenham acesso a água e o clima seja temperado, com invernos suaves, verões quentes e períodos de seca curtos. Gosta de sol e não tolera ensombramento.

Os seus ramos são pendentes na extremidade e as suas folhas são lustrosas na face superior (chamada página superior) o que dá à sua copa um tom prateado. As folhas são longas, pelo menos cinco vezes mais compridas do que largas. Floresce em maio-junho e o fruto é uma cápsula que liberta sementes envoltas numa penugem semelhante a algodão.

É muito comum encontrá-lo em cursos de água, bosques húmidos e associado a troços finais dos grandes rios, com águas ricas em nutrientes. Em Portugal cresce um pouco por todo o país, sobretudo no Centro e Sul.

Produz madeira com um cerne ligeiramente avermelhado, leve e macia, o que permite várias utilizações, desde esculturas a fósforos e palitos, folheados e contraplacados. Na Holanda foi usado no fabrico das socas tradicionais.

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Imagem da espécie Salix alba por Andreas Rockstein do Jardim Botânico UTAD, Flora Digital de Portugal.

Ocorrem em Portugal duas variedades: Salix alba L. var. alba, que é o salgueiro-branco propriamente dito, comum no Norte e Centro do País; e Salix alba L. var. vitellina (L.), o salgueiro-amarelo ou vimeiro-amarelo, com raminhos amarelados ou avermelhados, não pendentes – que é uma espécie exótica.

Os Salgueirais-choupais de choupos-negros e/ou salgueiros-brancos estão protegidos pelo Anexo I da Diretiva Habitats (subtipo 92A0pt2).

4. Salgueiro ou vimeiro‑brózio (Salix neotricha)

Classificado cientificamente em 1926 como Salix neotricha, o vimeiro ou salgueiro-brózio é por vezes designado por outro nome científico – pela sinonímia Salix fragilis.

Este salgueiro pode crescer até aos 20 a 25 metros de altura e tem uma copa cónica, de ramos ascendentes. As folhas são lanceoladas, bastante longas – geralmente quatro a nove vezes mais compridas do que largas, normalmente assimétricas na base e com rebordos serrados. Floresce entre março e maio.

É uma espécie que se distribui pelas proximidades de rios e ribeiros, em zonas de baixa altitude, e que pode encontrar-se um pouco por toda a Europa e sudoeste asiático. O vimeiro foi levado para a América e adaptou-se bem, pelo que é considerado como uma espécie naturalizada.

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Salix fragilis, por Alexey P. Seregi, em Global Biodiversity Information Facility

5. Salgueiro-com-folhas-de-amendoeira (Salix triandra)

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O salgueiro-com-folhas-de-amendoeira é um arbusto ou pequena árvore, que pode crescer até aos quatro a dez metros. As suas folhas são alongadas, algo brilhantes na face superior e mais pálidas na inferior. Florescem em março-maio (por vezes já em julho-agosto).

A espécie tem ampla distribuição junto a cursos de água na maior parte da Europa e está muito localizada na zona mediterrânica, sendo considerada natural da Europa e Ásia temperada. Em Portugal, é uma das mais raras: encontra-se na região de Trás-os-Montes e tem um papel importante na fixação das margens de cursos de água instáveis e na produção de vimes, fornecendo varas de boa qualidade.

O Salix triandra tem uma subespécie – subsp. discolor – que ocorre também em Portugal e que é considerado um bioindicador (a sua presença é um indicador de boa qualidade ambiental) do habitat da Rede Natura 2000 – Salgueirais arbustivos de Salix salviifolia subsp. salviifoliasubtipo 92A0pt4.

6. Salgueiro (Salix caprea)

A espécie Salix caprea pode ter porte arbustivo ou arbóreo, podendo crescer até aos 10 metros. As suas folhas também podem ter variações, mas geralmente são mais ovais (ovadas a oblongo-ovadas) e têm margens algo onduladas.

As flores – amentilhos – aparecem antes das folhas. As flores masculinas começam por ter pelos prateados, aparecendo depois os estames com as extremidades amarelas. Os amentilhos femininos, mais longos, são inicialmente verde-claros e cobrem-se depois com pelos longos e castanhos, que se tornam brancos quando maduros.

É uma espécie que cresce na maior parte da Europa, em bosques, sebes e matos de zonas baixas, assim como em altitude. Em Portugal é rara e concentra-se em áreas húmidas recentemente perturbadas nas regiões do Gerês e de Montesinho.

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Imagem da espécie Salix caprea por Andreas Rockstein do Jardim Botânico UTAD, Flora Digital de Portugal.

7. Salgueiro-roxo (Salix purpurea)

O porte do salgueiro-roxo é geralmente arbustivo, crescendo até cerca dos três metros de altura, embora possa atingir mais raramente os cinco a sete metros.

Floresce em abril e o seu nome deve-se à tonalidade da casca das suas varas, que são avermelhadas. A madeira destas varas é valorizada pela sua flexibilidade, sendo boa para produzir cestos.

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Natural da Europa, Ásia (até ao Japão) e Norte de África, encontra-se em Portugal unicamente numa zona específica: na bacia do Douro, sobretudo em Trás-os-Montes.

8. Salgueiro anão (Salix repens)

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O salgueiro anão é um arbusto rastejante com ramos ascendentes, que pode chegar aos quatro metros. Natural da Europa e da Ásia Ocidental e Noroeste, tem em Portugal duas subespécies: a subsp. argentea, associada às dunas costeiras, e a subsp. repens, que se encontra em matos húmidos (higrófilos) e turfeiras, em alta montanha, na zona do Gerês.

As dunas com subespécie argentea constituem o habitat 2170, protegido pela Diretiva Habitats – Anexo I e dada a sua raridade e por só se terem identificado quatro locais onde a espécie existe, está classificado com “Em Perigo” – categoria de risco de extinção em Portugal Continental – na Lista Vermelha da Flora Vascular.

9. Salgueiro-das-areias (Salix arenaria)

O salgueiro-das-areias é um arbusto de pequeno porte, que se eleva apenas entre um e dois metros de altura e que, como o seu nome indica, cresce naturalmente em zonas arenosas, onde muitas outras espécies não conseguem desenvolver-se.

Nativo do Oeste Europeu, no nosso país pode ser encontrado em depressões dunares e orlas de lagoas, em solos arenosos e húmidos, próximos do litoral noroeste, entre Quiaios (município da Figueira da Foz) e Vila do Conde.

A floração deste salgueiro acontece em março e abril, de acordo com as observações registadas no Flora-On: Flora de Portugal Interativa.

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Sabia que o salgueiro…

– Tem grande simbolismo em diferentes culturas?

Para os Antigos Romanos, o salgueiro era uma árvore consagrada à deusa Juno – mulher de Júpiter, deusa dos deuses, das mulheres, do parto e do matrimonio -, em parte devido às suas propriedades curativas para deter hemorragias e evitar o aborto. Também pela facilidade com que as suas varas criam raízes e dão origem a novas árvores, os salgueiros ficaram associados à renovação, vitalidade e imortalidade na China e noutras regiões. Na cultura celta, o salgueiro era considerado especial, pois da sua madeira se faziam as harpas dos brados e druidas. Na tradição judaica, o salgueiro é uma das quatro espécies vegetais usadas no outono, na festa dos Tabernáculos, como ação de graças pelas boas colheitas: “E no primeiro dia tomareis para vós ramos de formosas árvores, ramos de palmeiras e salgueiros de ribeiras”.

– Tem uma espécie emblemática pelas suas folhas pendentes? O seu comum é salgueiro-chorão e o nome científico Salix babylonica.

Pensa-se que a sua nomenclatura científica derive de uma má-interpretação do Salmo 137 “Junto dos rios de Babilónia, ali nos assentamos e chorámos, quando nos lembramos de Sião. Sobre os salgueiros que há no meio dela, penduramos as nossas harpas (…)”. A árvore referida seria provavelmente o choupo-do-eufrates (Populus euphratica), mas a associação entre os salgueiros de folhas pendentes e a tristeza perdurou. A tradição de usar coroas ou chapéus de salgueiro que representam o luto manteve-se na Europa na Idade Média. E a expressão inglesa “wearing the willow” (usar o salgueiro, numa tradução literal) significa chorar a perda ou ausência da pessoa amada. Entre as conotações de tristeza associadas ao salgueiro-chorão incluíram-se, assim, a rejeição por um apaixonado ou as lágrimas choradas pelos maridos que partiram para a guerra.

Apesar deste não ser um salgueiro nativo em Portugal, é uma espécie exótica que pode plantar-se em Portugal e que pode ser vista em muitos parques e jardins – Jardim Botânico da Faculdade de Ciências, em Lisboa e Jardim Botânico da UTAD – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, por exemplo -, com os seus ramos debruçados sobre as águas de riachos ou pequenos lagos.

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– Já era usado pelos antigos egípcios para tratar a febre e dores de cabeça?

A aplicação medicinal do salgueiro cruzou várias culturas antigas e também Hipócrates (cerca de 400 a.C.) dissertou sobre as suas propriedades para a saúde – para combater a febre e para acalmar as dores de parto. Na Idade Média existiam muitos exemplos da sua eficácia para tratar a febre e era uma cura popular para as dores de dentes. Para este último efeito, colocava-se um pedaço de casca de salgueiro entre o dente e a gengiva. Hoje é sabido que a casca do salgueiro contém salicina (substância que esteve na origem da aspirina), o que significa que resultaria no alívio das dores (mesmo sem cumprir a segunda parte do processo tradicional, que consistia em levar a casca do salgueiro de volta à arvore para levar consigo a dor).

Está ligado, de várias formas, a grandes nomes da literatura europeia?

Neles incluem-se desde Shakespeare (1564-1616) a Alexander Pope (1688-1744) ou Hans Christian Anderson (1805-1875). Shakespeare liga a morte de Ofélia a um salgueiro, cujo ramo quebrou quando ela subiu à arvore, caindo ao rio e afogando-se. Alexander Pope aproveitou um ramo ainda verde de um cesto de figos vindo da Península Ibérica (não se sabe se de Portugal ou de Castela), plantou-o no seu jardim em Twickenham e fez nascer uma árvore frondosa. Hans Christian Anderson dedicou ao salgueiro um dos seus contos – “À sombra de um salgueiro” ou “Sob o salgueiro” (no original “Under a willow tree”).

– Tem tanta afinidade com a água que foi amplamente plantado nos Países Baixos?

O salgueiro tornou-se, assim, parte importante da paisagem nos Países Baixos. Contudo, o seu aspeto é muito diferente do que estamos habituados a ver, já que os seus ramos e copa são cortados rentes todos os anos (conduzidos no que se chama talhadia de cabeça), dando origem a “nós” nos topos dos troncos onde crescem muitas varas. Estas paisagens aparecem em várias pinturas de Vincent van Gogh.

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Vincent van Gogh, Pollard Willows at Sunset, 1888, óleo sobre tela montado em cartão, 31.6 × 34.3 cm, Museu Kröller-Müller, Otterlo. Wikimedia Commons.

*Artigo em colaboração com Mariana Afonso Martins

Mariana Afonso Martins é, em 2024, aluna do curso de Arquitetura Paisagista no Instituto Superior de Agronomia. A sua colaboração com o Florestas.pt realizou-se no âmbito dos estágios de verão alumnISA.