Comentário

Daniel Bessa

Remunerar a função ambiental da floresta portuguesa

Uma adequada remuneração da função ambiental da floresta portuguesa não é um tema novo. Falta querer implementá-la, de facto, começando por reunir a informação indispensável e por fazer os cálculos necessários ao avanço do processo.

O propósito que serve de tema a este pequeno artigo já foi enunciado, durante muitos anos (décadas?), por muita gente, incluindo pessoas que merecem enorme reconhecimento entre os profissionais da área florestal, e mesmo junto da opinião pública em geral, incluindo a cientificamente mais qualificada. É normalmente bem aceite, este propósito, entendendo-se que uma remuneração adequada da função ambiental da floresta portuguesa, além de justa, poderá revelar-se amplamente vantajosa, de múltiplos pontos de vista.

Como tantas vezes acontece em Portugal, em relação a tantos propósitos, o seu enunciado, mesmo quando amplamente aceite, não tem nenhuma consequência, em termos de execução ou implementação (muitas iniciativas, mas poucas acabativas, como julgo ser amplamente reconhecido).

Não gostaria de ser mais um. Revejo-me no propósito de remunerar a função ambiental da floresta portuguesa. Gostaria de contribuir, ainda que modestamente, para a sua concretização. É esse o intuito deste pequeno artigo.

Julgo, para começar, que não deveria ser remunerada a função ambiental de nenhum espaço florestal que não esteja certificado – uma condição que ajudaria a implementar esta prática, amplamente reconhecida como vantajosa, acrescendo que não vejo forma, a não ser através da certificação, de obter a informação adicional necessária.

Admito que haja uma dimensão mínima, porventura variável nas várias regiões do País, abaixo da qual a função ambiental da floresta não deve ser remunerada. Ninguém será obrigado a emparcelar, muito menos a vender, sucedendo apenas que, abaixo de determinadas dimensões mínimas, a função ambiental da sua “floresta” não será remunerada.

comentario-daniel-bessa-interior

Parece-me impossível fugir ao propósito de remunerar cada uma das espécies em função da sua capacidade de sequestro de carbono (tanto melhor quanto mais carbono sequestrar) e em função do seu consumo de água do solo (tanto melhor quanto menos água consumir). Julgo que se conhecem, para as várias espécies florestais, a capacidade de sequestro de carbono e o consumo de água de cada uma, em média, porventura, no que se refere ao consumo de água, com alguma diferenciação regional.

Admito que o grau de diversidade das espécies, dentro de cada exploração, constitua fator de diferenciação positiva.

Será delicado o processo de decisão política acabado de recomendar? Sim, com toda a certeza.

Será impossível reunir a informação indispensável e fazer os cálculos necessários ao avanço do processo? Não, de modo nenhum. Bastará querer fazê-los, incorrendo, naturalmente, em todo o trabalho indispensável – sem o qual, como em tudo na vida, nada se faz.

Gostaria de saber mais sobre floresta para poder avançar mais neste processo. Não sabendo, resta-me enunciar a minha disponibilidade para, na medida em que quem sabe mais o considere necessário, dar o meu contributo, a minha ajuda.

Poderíamos, para começar, esclarecer o número de hectares de floresta que estarão em condições de aceder a esta remuneração. Poderíamos, de seguida, esclarecer o montante que o Orçamento do Estado poderá reservar anualmente para este propósito, sem prejuízo da possibilidade de, em alguns casos, o Estado poder repercutir este custo sobre terceiros (possibilidade aqui apenas admitida em princípio, sem nenhuma carta na manga).

Conhecidos os dois valores, uma mera conta de dividir calcularia a remuneração anual média por hectare. A informação recolhida acima ajudaria a definir os ponderadores que suportarão a discriminação, remunerando, como é devido, alguns hectares de floresta melhor do que outros (porque sequestram mais carbono, porque consomem menos água, porque apresentam maior diversidade de espécies, para além de todos os outros fatores que quem sabe mais do que eu melhor poderá enunciar e escalpelizar).

outubro de 2021

O Autor

Daniel Bessa é Economista. Foi Professor da Universidade do Porto. Atualmente, mantém atividade profissional em órgãos de administração e fiscalização de empresas e como economista em regime de profissão liberal.