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Curiosidades

Árvores em flor no inverno

Quando boa parte das plantas se encontra em período de repouso vegetativo, em que poupam energias para sobreviver aos dias mais curtos, há algumas espécies que contrariam a tendência e conseguem florir. Descubra alguns arbustos e árvores em flor em pleno inverno, todos presentes em Portugal.

Normalmente, no outono, a natureza reduz o seu ritmo. Com dias mais curtos, que equivalem a menos horas de luz solar, muitas árvores diminuem o seu metabolismo e, nas espécies de folha caduca, os ramos começam a despir-se. Mas mesmo nestas espécies, há árvores em flor no inverno e a sua floração antecede até as novas folhas.

Algumas destas árvores, nomeadamente espécies de fruto como a amendoeira, a aveleira ou a cerejeira, precisam mesmo de passar por um determinado número de horas de temperaturas mais baixas e só depois de o completarem podem começam a florir.

Mas também várias espécies de folha perene, que utilizam outras estratégias adaptativas para sobreviver ao inverno, conseguem iniciar a floração ou manter-se em flor no inverno, como é o caso do loureiro, da oliveira ou do eucalipto.

O facto de terem flor no inverno significa que são uma importante fonte de alimento para os polinizadores, numa época em que o pólen e néctar são bastante mais escassos do que noutras estações do ano.

Descubra cinco destas espécies que mantêm ou iniciam a sua floração em pleno inverno e conheça as principais características das flores que dão cor à estação fria.

Principais partes da flor

Sabendo quais são as principais partes das flores é mais fácil descrever cada uma delas.

Partes da flor

As sépalas, em conjunto, formam o cálice, e ao conjunto das pétalas chama-se corola.

Um ou mais pistilos constituem o gineceu, que é a parte reprodutiva feminina. O conjunto que compõe o estame constitui o androceu, que corresponde à parte reprodutiva masculina da flor.

Chamamos flores completas às que têm cálice, corola, androceu e gineceu, e flores incompletas àquelas a que falta pelo menos um destes conjuntos.

Eucaliptos em flor no inverno e mesmo antes dele chegar

O eucalipto (Eucalyptus globulus) é uma das árvores em flor no inverno e mesmo antes dele chegar. Em Portugal, a sua floração começa no outono e mantém-se durante toda a estação fria, persistindo, por vezes, na primavera (normalmente, entre outubro e março). A espécie que plantamos no nosso país é, de entre as centenas de espécies de Eucalyptus, a que tem as flores maiores.

Os botões florais, que podem ter cerca dois centímetros de diâmetro, estão cobertos por uma “tampa” – um opérculo – que protege a estrutura floral durante a sua formação. A palavra eucalipto está, aliás, associada a este opérculo, já que o nome latim Eucalyptus deriva das palavras gregas Eu e calyptus que, juntas, significam “bem coberto” ou “bem escondido”, em referência a esta cobertura.

Botão e flor de eucalipto
flor de eucalipto

Pouco antes de vermos a flor, os estames em expansão empurram esta tampa, removendo-a, e surge uma densa composição de centenas de estames, com filamentos brancos e anteras de um tom amarelo-pálido. São estes finos e longos estames, muito numerosos, que tornam tão vistosas estas flores de eucalipto, uma vez que, sendo incompletas, elas não têm pétalas. No centro dos estames, encontra-se o ovário, um disco espesso, amarelo-esverdeado, com cavidades minúsculas que retêm néctar em abundância – um chamariz para os polinizadores.

As flores são normalmente solitárias, embora possam surgir em grupos de três. Prendem-se aos ramos por pedicelos muito curtos e em certos casos não têm este pé, nascendo diretamente sobre as axilas dos ramos jovens (neste caso, a botânica chama-lhes flores sésseis).

Apesar de o eucalipto ser uma árvore aromática, que liberta um perfume fresco e mentolado, as flores não têm fragrância.

A área de distribuição natural do Eucalyptus globulus abrange a Tasmânia – onde a flor de eucalipto se tornou símbolo local – e o sul da Austrália. Trazidos para Portugal em meados do século XIX, adaptaram-se ao nosso país e são das árvores que se mantêm em flor por mais tempo – a floração pode prolongar-se, pelo menos, por metade do ano.

Amendoeira é das primeiras árvores do ano a florir

As amendoeiras (Prunus dulcis) começam a encher-se de pequenas flores de tom branco ou rosa-pálido pouco depois de começar o ano.

No hemisfério norte, os botões florais começam a formar-se no verão anterior, mas ficam dormentes no outono e, no inverno, depois de expostas a determinadas horas de frio, retomam o desenvolvimento. Geralmente, a floração começa em janeiro, antes ainda de nascerem as novas folhas, e pode prolongar-se por fevereiro e março.

botão e flor de amendoeira
flor de amendoeira

As flores da amendoeira podem nascer solitárias ou em pares. A corola é composta por pétalas de 15 a 20 milímetros, de uma forma arredondada, mais estreita na base (obovada). As suas pequenas sépalas, com cerca de meio centímetro, contribuem para o tom rosado pois estão cobertas de uma penugem avermelhada. Os finos e longos filamentos que se erguem no centro da flor também têm um tom rosado, embora as anteras sejam mais amareladas. A flores assentam num pedicelo tão curto que parecem quase sair dos ramos e são rodeadas por numerosas brácteas.

Estas são flores completas, com cálice, coroa e ambos os sexos. Apesar de terem órgãos reprodutores masculinos e femininos, o pólen não consegue fertilizar o seu próprio óvulo. Por isso, as flores de uma dada árvore têm de ser fertilizadas pelo pólen proveniente de outras árvores que sejam compatíveis. Esta viagem entre flores é feita com a ajuda de polinizadores.

Amendoeiras em flor

A amendoeira foi trazida para Portugal (para o sul do país) pelos Árabes. Conta a lenda que uma princesa nórdica, casada com um rei mouro, tinha perdido a alegria de viver por lhe faltar o branco dos invernos nevados da sua infância, mas recuperou o ânimo quando estas árvores entraram em flor no inverno, cobrindo os campos de pétalas brancas. Descubra outras curiosidades sobre as “Amendoeiras em flor e a tradição da amêndoa”.

Folhado: um arbusto que floresce entre janeiro e abril

O folhado (Viburnum tinus) é um arbusto nativo, que cresce habitualmente até aos cerca de quarto a seis metros de altura e nasce espontaneamente em bosques (carvalhais, sobreirais e azinhais), orlas de bosques, matagais e zonas ribeirinhas praticamente por todo o território continental e também na Madeira e Açores, preferindo locais abrigados, húmidos e sombrios.

A beleza que é lhe é reconhecida tornou-o também num dos arbustos mais plantados para fins ornamentais. Se é certo que esta beleza se deve também às suas folhas sempre verdes – escuras e brilhante na parte superior – e aos pequenos frutos de tom azul metálico (drupas não comestíveis), as inflorescências (conjuntos de flores) que começam a ver-se pouco depois de começar o inverno dão um importante contributo.

Folhado (Viburnum tinus) em flor
Flores do folhado

A partir de janeiro, por entre o verde da folhagem, começam a destacar-se pequenos pontos brancos a rosados, dispostos de uma forma que nos lembra um buquê. No centro, a haste principal de crescimento termina com uma flor, que é a primeira a abrir. Em botânica, esta característica dá ao conjunto das flores o nome de inflorescência cimeira.

As flores em redor desta primeira nascem em pedúnculos dispostos em diferentes níveis da mesma haste, mas que se elevam praticamente à mesma altura. Deste modo, as flores formam um aglomerado denso, amplo e quase plano – em botânica diz-se que formam corimbos – que podem chegar a cerca de 10 centímetros de diâmetro.

Apesar do buquê ter esta dimensão, as flores que os compõem são minúsculas. O facto de serem pequenas não as impede de ter órgãos reprodutores femininos e masculinos. A sua polinização é principalmente apoiada por insetos (polinização entomófila).

Cada flor tem cinco estames curtos, encaixados entre os recortes das cinco pétalas brancas, que são coroadas de rosa principalmente no início da floração. O rosa sobressai, aliás, nos seus botões florais.

O folhado é da mesma família botânica do sabugueiro – a família das Adoxaceae – e as suas inflorescências são bastante semelhantes, embora os corimbos sejam maiores no sabugueiro. Outra das diferenças é a época de floração, já que o sabugueiro não está em flor no inverno, mas só depois dele terminar.

Camélia: flores exuberantes que se destacam de janeiro a março

Nativa de partes da China, Coreia, Japão e Taiwan, a camélia ou japoneira (Camellia japonica) é um arbusto ou árvore, que pode crescer dos seis aos 12 metros (por vezes mais). Nasce principalmente em regiões subtropicais, embora seja plantada pela sua beleza ornamental em muitas outras zonas do globo. Esta é, aliás, a camélia mais plantada no mundo para fins paisagísticos e existem mais de duas mil variedades de cultivo (cultivares), muitos derivados de cruzamentos (hibridação) com outras espécies de camélia.

Considerando tamanha diversidade de cameleiras resultantes de cruzamentos e cultivares, há flores de camélia das mais variadas cores e formas – as diferenças são bem visíveis.

Flores de camélia japoneira
Flor de camélia

Nas camélias silvestres, as flores crescem normalmente solitárias na extremidade do ramo e têm cinco pétalas encarnadas dispostas de forma simples, em torno de numerosos estames amarelos, que se encontram unidos na base.

Nas cultivares e híbridos de Camellia japonica, as flores podem nascer solitárias ou em pares e as cores podem variar do branco ao encarnado, passando por vários tons de rosa, roxo, amarelo e matizados. A própria estrutura floral pode também ser muito variável: o cálice pode ter cinco ou seis sépalas imbricadas e a coroa cinco, seis ou muitas mais pétalas (que podem resultar de estames modificados). A forma das pétalas também varia – mais ovada ou mais arredondada – e o mesmo se passa com a dimensão da flor, com uma grande amplitude de tamanhos, desde os três aos 12 centímetros de diâmetro.

A época de floração pode ter algumas flutuações consoante o clima (e as cultivares), mas acontece tipicamente entre janeiro e março, com a exuberância destas flores a contrastar com a ramagem densa e o tom verde-escuro das folhas.

Em flor no inverno, a camélia ou japoneira integra a família botânica das teáceas (Theaceae), a mesma a que pertence a planta-do-chá (Camellia sinensis) e pode ter chegado à Europa em sua substituição: “como medida para manter o controlo do circuito do chá, os chineses acabariam por trocar plantas e sementes de outras variedades de Camellia que não as C. sinensis, levando desse modo a que os capitães da frota mercante da Companhia Britânica das Índias Orientais introduzissem diferentes camélias no espaço europeu”.

Entre as maiores coleções de camélias a nível europeu, destaca-se a do Parque Terra Nostra, em São Miguel, nos Açores. Com várias espécies e cultivares presentes, a floração inicia se no outono e mantém se durante cerca de seis meses: está no seu auge entre outubro e dezembro, para a Camellia sasanqua; entre janeiro e abril, para a Camellia japonica; e entre fevereiro e março para a Camellia reticulata.

Camélias no Parque Terra Nostra, Açores

Cerejeira-brava começa a florir no final do inverno

Já mais para o final do inverno, a cerejeira-brava (Prunus avium) enche-se de branco, com flores aromáticas, bastante pequenas – cerca dois centímetros de diâmetro ou pouco mais – que nascem dispostas em cachos de entre duas a cinco ou seis flores, com longos pedículos.

Estes cachos inserem-se em esporões curtos, que lembram pequenos ramos (chamados braquiblastos). É da sua extremidade que saem os botões florais: o botão mais afastado da base continua a crescer e a formar novos raminhos e folhas (botão vegetativo), enquanto os outros produzem novos cachos de flores.

Flor de cerejeira-brava
Cerejeira em flor

A polinização destas flores é feita principalmente por abelhas-melíferas, abelhas-selvagens e abelhões, que transferem o pólen entre árvores, permitindo a formação de frutos. Tal como as amendoeiras, cada flor de cerejeira-brava tem ambos os sexos, mas geralmente não consegue produzir frutos apenas com o seu próprio pólen, dependendo da polinização cruzada entre diferentes árvores que sejam compatíveis.

Para que se inicie a floração, a cerejeira-brava necessita de passar um período de exposição de frio (não demasiado intenso), pelo que a data pode ter algumas variações. Em Portugal, estas horas ficam habitualmente completas ainda o inverno não terminou, com a floração a decorrer em março e abril. No entanto, o tempo em que podemos ver cada árvore em flor é muito curto – cerca de uma semana.

A cerejeira-brava é uma árvore que cresce até aos 15 a 32 metros, em locais frescos e solos profundos. É uma espécie que cresce em boa parte da Europa, incluindo Portugal, e em zonas do norte de África e da Ásia ocidental. No nosso país, existe sobretudo no Norte e na zona montanhosa da Região Centro. É muito plantada em pomares no Norte do país, onde é enxertada com variedades de cultivo (cultivares) especialmente selecionados para a produção de cereja para consumo humano.

As cerejeiras cultivadas são variedades da espécie Prunus avium e da sua parente próxima Prunus cerasus, a ginjeira. Ao mesmo género botânico pertencem outras árvores de fruto que estão em flor no inverno, como a amendoeira, a ameixeira (Prunus domestica) e o pessegueiro (Prunus persica), entre várias outras.

Há uma cerejeira cultivada como ornamental que encontramos em arruamentos e jardins em Portugal: a cerejeira-de-jardim ou cerejeira-do-Japão (Prunus serrulata). Com as suas flores rosadas, esta e outras espécies e cultivares dão cor ao espetáculo das cerejeiras em flor, um atrativo natural que no Japão é conhecido como sakura. O auge da floração acontece já na primavera.

Cerejeiras em flor no Japão