Conhecer

Alterações Climáticas

CO2 removido pela floresta no mundo, na Europa e em Portugal

As florestas removem dióxido de carbono da atmosfera, ajudando a mitigar os efeitos das alterações climáticas. Em Portugal, o seu contributo tem sido positivo, exceto em anos de grandes incêndios. Em 2021, o CO2 removido pela floresta portuguesa totalizou cerca de 4,8 megatoneladas (remoção bruta) de um total de 56,5 megatoneladas de emissões nacionais de gases com efeito de estufa.

Valorizar os ecossistemas florestais é uma das respostas viáveis em termos de adaptação, mitigação e resiliência aos efeitos das alterações climáticas. As plantas e árvores das florestas retiram dióxido de carbono (CO2) da atmosfera e retêm-no nas raízes, caules e folhas. Outra parte do CO2 removido pela floresta fica armazenado na manta morta e no solo.

Estima-se que o CO2 removido pela floresta à escala global tenha rondado os 15,6 mil milhões de toneladas (gigatoneladas ou Gt) de CO2 eq por ano, entre 2001 e 2019, um valor bruto que se reduz para uma remoção líquida de 7,6 Gt CO2 eq se contabilizarmos os Gases com Efeito de Estufa (GEE) emitidos como resultado da desflorestação e de outras perturbações nos ecossistemas florestais.

Em paralelo, estima-se que as florestas armazenem à escala global entre 662 e 861 gigatoneladas de carbono.

Este último valor resultou de um trabalho publicado em 2011 que usou dados (entre 1990 e 2007) provenientes de medições de campo, inventário florestal e modelos para estimar o stock de carbono nas florestas mundiais, apontando que se situe em cerca de 861 Gt de carbono: 44% deste total (383 Gt) estava armazenado no solo (até 1 metro de profundidade), 42% (363 Gt) na biomassa viva acima e abaixo do solo (troncos, ramos, folhas e raízes), 8% (73 Gt) na madeira morta e 5% (43 Gt) nas copas (folhada). Em termos geográficos, 55% do carbono estava retido nas florestas tropicais, 32% nas boreais e 13% nas florestas temperadas.

Já o primeiro valor, que indicava um stock de carbono 662 mil milhões de toneladas (o equivalente a cerca de 163 toneladas de carbono por cada hectare de floresta no mundo) foi estimado pelo Global Forest Resources Assessment – FRA 2020. Este total, resultante de dados dos stocks de carbono florestal reportados por 192 países e territórios, compreende cerca de 45% (300 Gt de carbono) na matéria orgânica do solo, perto de 40% (295 Gt) na biomassa viva que se encontra acima do solo e nas raízes e 10% (68 Gt) na biomassa morta ou manta morta (ramos e folhas caídas sobre o solo).

A medida internacional CO2 eq expressa a quantidade dos Gases com Efeito de Estufa (GEE) como o metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O), traduzindo as suas quantidades como se todos eles equivalessem a CO2 (como se todos os GEE emitidos fossem dióxido de carbono).

Evolução do stock de carbono na biomassa florestal 1990-2020 (Gt de carbono)


Fonte: Global Forest Resources Assessment – FRA 2020

Embora os números sejam impressionantes, o FRA 2020 indica que, entre 1990 e 2020, a área florestal global diminuiu cerca de 178 milhões de hectares, o que levou à diminuição do stock de carbono na biomassa total da florestal em cerca de 6,3 Gt (de 668 Gt para 662 Gt), o equivalente a uma média de 210,4 milhões de toneladas por ano (megatoneladas ou Mt).

Esta redução deveu-se principalmente à degradação e perda de florestas para a agricultura e para o estabelecimento de povoações e edificações.

As maiores perdas verificaram-se na América do Sul (mais de mil milhões de toneladas em três décadas), em África e no Sul da Ásia.

No entanto, parte das perdas foram compensadas por aumentos da área florestal noutras zonas do globo: na Europa, nas regiões do Este Asiático e na América do Norte, que viram o stock de carbono na biomassa florestal aumentar.

Com base em dados e modelos ao nível da árvore individual, um estudo publicado na revista científica Nature, em novembro de 2023, sugere que as alterações no uso do solo e no clima reduziram o potencial natural de carbono das florestas. Este trabalho estimou que, na ausência de perturbação humana e de acordo com as condições do clima atuais, o potencial global de carbono florestal seria cerca de 600 Gt. Considerando estimativas de biomassa viva e dados de carbono no solo, madeira morta e folhada, indica que o stock de carbono nas florestas mundiais estará entre 221 Gt e 472 Gt abaixo do seu potencial natural.

Emissões globais continuam a crescer

Globalmente, as emissões totais de GEE para a atmosfera (considerando o efeito do uso do solo, alteração do uso do solo e florestas, na sigla inglesa LULUCF – Land Use, Land Use Change and Forestry) aumentaram continuamente desde 1990 até 2019, de acordo com o Emission Gap Report 2023, das Nações Unidas. Em 2020, a pandemia de COVID-19 levou ao decréscimo das emissões, mas em 2021 retomaram o crescimento e em 2022 atingiram 57,4 Gt CO2 eq. As maiores contribuições resultaram da queima de combustíveis fósseis e processos industriais, que representaram cerca de dois terços das emissões globais de GEE.

Na década de 1990, as emissões de GEE aumentaram 1,2% ao ano, tendo crescido a um ritmo de 2,2% anuais na década de 2000. Entre 2010 e 2019, aumentaram em média 0,9% ao ano e de 2021 para 2022, cresceram 1,2%, de 56,8 Gt CO2 eq para 57,4 Gt CO2 eq.

É necessário que as emissões globais desçam para níveis entre 33 Gt CO2 eq e 41 Gt CO2 eq até 2030 para que se consiga manter o aquecimento médio da temperatura global abaixo dos 1,5°C, como definido no Acordo de Paris.

Evolução das emissões antropogénicas globais de gases com efeitos de estufa, incluindo LULUCF, 1990 – 2022 (Gt CO2 eq/ano)

Fonte: Emission Gap Report 2023 (Pág.17); UNEP

Nota: Os gases que não são CO2 foram convertidos em GtCO2 eq usando os potenciais de aquecimento global num horizonte a 100 anos, indicados no IPCC AR6.

Na legenda:
CO2 fóssil: emissões de CO2 de combustíveis fósseis e indústria; CH4: emissões de metano;  N2O: emissões de óxido nitroso; Gases-fluorados: emissões de gases fluorados reportados no âmbito do UNFCCC, mas excluem as emissões reguladas pelo Montreal Protocol on Substances that Deplete the Ozone Layer About Montreal Protocol (unep.org) que contabilizaram cerca de 1,6 GtCO2 eq em 2021; CO2 LULUCF: emissões e remoções do uso do solo, alterações de uso do solo e florestas

“Se nada mudar, as emissões em 2030 estarão 22 Gt CO2 mais elevadas do que o necessário para o limite de aquecimento de + 1,5°C. Este valor representa, mais ou menos, as emissões anuais atuais dos EUA, China e EU combinadas”, alertou o Secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, durante a apresentação do Emission Gap Report 2023.

O título completo do relatório – Emissions Gap Report 2023: Broken Record – Temperatures hit new highs, yet world fails to cut emissions (again) – chama uma vez mais a atenção para a necessidade de diminuir as emissões. O ano de 2023 registou, até ao início de outubro, 86 dias com temperaturas 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais. O mundo está a caminhar para um aumento de temperatura entre 2,5 °C e 2,9 °C relativamente aos níveis pré-industriais, sendo necessário redobrar os esforços para inverter esta escalada. Será necessário cortar 28% das emissões até 2030 para manter o aquecimento nos 2 °C e reduzir 42% das emissões para atingir o limite dos 1,5° C.

A demora na redução das emissões irá obrigar a um maior esforço de remoção de dióxido de carbono da atmosfera, algo que já começou a ser feito, principalmente, através de:

  • Florestação, reflorestação e gestão florestal;
  • Aumento do sequestro de carbono no solo;
  • Recuperação de zonas húmidas e turfeiras;
  • Aposta em sistemas agroflorestais;
  • Aumento da utilização de produtos de madeira duráveis que retêm o carbono.

Estima-se que estes métodos estejam a remover cerca de 2 Gt CO2 por ano (principalmente via florestação, reflorestação e gestão florestal). No entanto, será preciso aumentar estas remoções e recorrer a novas metodologias de remoção direta de carbono atmosférico e seu armazenamento. Contudo, estas metodologias não estão totalmente desenvolvidas e não apresentam ainda garantias a longo prazo e à escala necessária.

CO2 removido pela floresta europeia mantém-se positivo, mas longe da meta

Na União Europeia, nos últimos 30 anos, as emissões totais de GEE têm evoluído em sentido inverso ao que acontece no mundo, revela o “Annual European Union greenhouse gas – inventory 1990–2021 and inventory report 2023”. O documento destaca uma descolagem progressiva entre o crescimento económico e a emissão de gases com efeito de estufa no espaço comunitário: o PIB – Produto Interno Bruto aumentou 61%, enquanto as emissões se reduziram em cerca de 30% entre 1990 e 2021.

Embora a tendência de longo prazo revele um percurso animador, a retoma registada em 2021, após o ano atípico de maiores condicionamentos da pandemia, implicou um aumento significativo das emissões face a 2020: um acréscimo de 193 Mt CO2 eq (+6,2%), para as 3,3 mil Mt CO2 eq, que representa o maior crescimento anual registado no século XXI.

Mesmo assim, as emissões de 2021 ficaram abaixo das registadas na pré-pandemia, já que em 2019 tinham totalizado 3477 Mt CO2 eq. Da mesma forma, e como referido, mantiveram-se significativamente abaixo (cerca de 30%) face às 4712,3 Mt CO2 eq contabilizadas em 1990.

O sector LULUCF (Uso do Solo, Alterações do Uso do Solo e Floresta) como um todo tem mantido um contributo positivo enquanto reservatório líquido de carbono e esta realidade manteve-se em 2021, com uma remoção de aproximadamente 230 Mt CO2 eq (-229,985 Mt CO2 eq).

As áreas florestais foram em 2021, mais uma vez, responsáveis pelas remoções mais representativas de GEE na Europa – cerca de 8%. Estas áreas representavam cerca de 40% do total do território comunitário (167,846 milhões de hectares em 2021), de acordo com as áreas reportadas pelos 27 países da União, indicando um acréscimo de 5% nas áreas florestais face a 1990.

Fontes de emissões e remoções na União Europeia, 1990 – 2021 (Mt CO2 eq)

1990
1995
2000
2005
2010
2015
2020
2021
Energia
3747
3521
3454
3569
3305
2967
2500
2663
Processos industriais
3747
427
409
425
358
340
307
318
Agricultura
485
419
409
389
376
384
382
378
LULUCF
-209
-316
-304
-342
-353
-322
-241
-230
Resíduos
184
188
174
154
137
188
111
109
Emissões indiretas de CO2
6
6
5
5
4
3
3
3
Aviação internacional
54
66
85
96
100
109
56
70
Total incluindo FULUCF e aviação
4712
4310
4233
4296
3929
3599
3119
3311
Total excluindo FULUCF e aviação
4867
4560
4452
4542
4181
3812
3304
3472

Embora com este contributo positivo, o CO2 removido pela floresta europeia diminuiu a sua representatividade nos anos mais recentes: em 2010 a floresta permitiu a remoção de 353 Mt CO2 eq, muito acima dos 230 Mt CO2 eq de 2021. Entre as principais justificações para esta redução da capacidade da floresta como sumidouro de carbono estão o envelhecimento das florestas, o aumento da taxa de cortes florestais e os crescentes impactes e pressões das perturbações naturais relacionados com as alterações climáticas (como cheias, tempestades e fogos).

Refira-se que para alcançar as metas europeias da neutralidade carbónica as remoções líquidas de GEE no sector LULUCF precisam de voltar a aumentar para os 310 Mt CO2 eq à escala da União Europeia até 2030 – cada país terá, por isso, objetivos obrigatórios a cumprir. Diferentes projeções indicam, no entanto, que, a manterem-se as práticas correntes, a capacidade das florestas e solos europeus para absorver CO2 continuará a decair, estimando que em 2030 as suas remoções possam reduzir-se às 200 Mt de CO2 eq.

CO2 removido pela floresta portuguesa rondou as 5,5 megatoneladas por ano

De 1990 até 2021, as áreas florestais portuguesas deram um contributo positivo para a remoção de gases com efeito de estufa em 27 dos últimos 32 anos analisados. A exceção vai para 1990, 2003, 2005, 2016, 2017 e 2018. Nesses anos, devido aos incêndios – dos quais resultam valores elevados de biomassa queimada –, a floresta acabou por gerar mais emissões do que aquelas que foi capaz de remover da atmosfera.

Os dados integram o Relatório Nacional de Inventário 2023 (NIR – National Inventory Report), que reporta os indicadores portugueses às autoridades europeias e revela: em 2021, as emissões GEE em Portugal totalizaram 56,5 Mt CO2 eq, valor que se reduz para as 50,5 Mt CO2 eq se considerarmos as remoções (6 Mt CO2 eq) conseguidas pelo sector LULUCF – Uso do Solo, Alterações do Uso do Solo e Floresta.

As áreas florestais foram responsáveis por um sequestro médio anual de 5,58 Mt CO2 eq entre 1990 e 2021, valor que se reduz para uma média de 2,84 Mt CO2 eq (emissões líquidas) se forem consideradas outras fontes de emissões relacionadas com a floresta, principalmente a queima de biomassa associada aos incêndios.

Em 2021, o CO2 removido pela floresta portuguesa foi de 4,86 Mt CO2 eq, quantidade que diminui significativamente, para os 2,24 Mt CO2 eq (remoções líquidas), quando são consideradas outras fontes emissoras relacionadas com as áreas florestais (a queima de biomassa é, também, a principal em 2021).

Em termos líquidos, as zonas de prados e matos arbustivos (2,82 Mt CO2 eq), florestas (2,24 Mt CO2 eq) e áreas de cultivo (1,58 Mt CO2 eq) aportaram os maiores contributos para a remoção de carbono, em 2021, de entre os vários elementos integrados no sector LULUCF.

Evolução das emissões e remoções das várias componentes no sector LULUCF, em Portugal (Mt CO2 eq) 1990 a 2021

Fonte: NIR – National Inventory Report 2023 Portugal, Agência Portuguesa do Ambiente.

Considerando o total de emissões com o sector LULUCF, estes 50,5 Mt CO2 eq obtidos em 2021 representam um decréscimo de 5,5% face a 2020 e de 24,3% face a 1990. Refira-se que as emissões totais em Portugal, seja sem ou com o sector LULUCF, decresceram anualmente desde 2018 a 2021 e registaram em 2020 e 2021 os valores mais baixos de sempre, recordes que estarão influenciados pelas condicionantes e confinamentos impostos pelo Covid-19. Poderão voltar a subir em 2022, ano que ainda não consta deste Inventário.

Entre 1990 e 2021, o sector LULUCF, no seu todo, foi um reservatório líquido em 27 dos 32 anos analisados, com uma remoção média estimada em mais de 4,0 Mt CO2 eq. Os anos de maiores remoções (acima das 10 megatoneladas) foram 1995, 1997, 1999 e 2009. Já os anos em que o sector passou de sequestrador a emissor foram 1990, 2003, 2005, 2016 e 2017.

Total de emissões sem e com o sector LULUCF em Portugal, 1990 – 2021

Fonte: NIR – National Inventory Report 2023 Portugal, Agência Portuguesa do Ambiente.

Nota: valores negativos representam um contributo negativo, em que o sector LULUCF emitiu GEE

Fonte: NIR – National Inventory Report 2023 Portugal, Agência Portuguesa do Ambiente.

Em 2017, o sector LULUCF foi um emissor líquido, responsável pela emissão de 21,5 Mt CO2 eq para a atmosfera, o equivalente a 23,2% de todas as emissões portuguesas nesse ano. É um valor de exceção, que decorre da maior área ardida desde que há registo em Portugal e que o Inventário Nacional 2023 associa “a um ano excecionalmente seco e a temperaturas elevadas, ocorrendo principalmente fora do período de verão normal” e também “aos ventos excecionalmente fortes, nomeadamente do furacão Ophelia, que atingiu a costa da Península Ibérica em outubro de 2017, um fenómeno que pode estar relacionado com as mudanças climáticas”.