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Espécies Florestais

Sabugueiro: um arbusto nativo, uma cultura com potencial

O sabugueiro é uma espécie nativa que cresce espontaneamente no nosso país. É considerada uma planta medicinal e é cultivada em Portugal e pela Europa sobretudo pelas suas bagas. Fique a conhecer mais sobre a espécie neste artigo em colaboração com Bruno Cardoso.

O sabugueiro é um arbusto ou pequena árvore que cresce um pouco por toda a Europa. As suas folhas, flores e bagas têm várias aplicações, embora o interesse pela espécie esteja atualmente mais concentrado nas suas bagas. Com potencialidade de utilização na medicina, nutracêutica e alimentação saudável, a espécie começa a despertar interesse como cultura alternativa e complementar em explorações agrícolas e agroflorestais, em particular no norte do país.

De nome científico Sambucus nigra, o sabugueiro pertence ao género Sambucus e à “nova” família Adoxaceae. Tradicionalmente, o género Sambucus pertencia à família Caprifoliaceae, mas após uma revisão científica que lhe identificou características distintivas, passou a integrar a família Adoxaceae juntamente com o género Viburnum – ao qual pertence o folhado.

Os exemplares do sabugueiro crescem, normalmente, até aos quatro a cinco metros de altura, podendo elevar-se ao dobro em áreas cultivadas. A sua copa é densa e arredondada, apoiada por um tronco irregular e inúmeros ramos flexíveis, cobertos por uma casca rugosa e acinzentada. O interior dos ramos (medula) é branco e esponjoso.

Com folhas compridas (cerca de 12 centímetros), de margem finamente dentada e extremidade pontiaguda, o sabugueiro é uma espécie caducifólia (perde a folha no outono), que se identifica mais facilmente na primavera pelas suas flores brancas, dispostas em amplos grupos perfumados.

Com cinco pétalas brancas e anteras amarelas (pontos minúsculos no topo dos estames), cada uma das flores é muito pequena, com cerca de meio centímetro de diâmetro, mas o facto destas flores se disporem em conjuntos coesos e aplanados (chamados corimbos, em botânica) faz com que as inflorescências cheguem a ter mais de 20 centímetros de diâmetro, sobressaindo entre o verde da folhagem.

Os frutos, vulgarmente conhecidos por bagas de sabugueiro (que são na realidade drupas), são esféricos, com cerca de sete milímetros de diâmetro. Amadurecem entre agosto e setembro, época em que ganham uma tonalidade púrpura ou arroxeada muito escura, quase preta, sinal de que se encontram maduras. Tal como as flores, também os frutos se encontram agrupados em cachos ou infrutescências pendentes.

Flores de sambucus nigra e de sambucus ebulus

Da mesma família do Sambucus nigra – a família Adoxaceae – temos em Portugal espécies como o Sambucus ebulus, também chamado de sabugueirinho ou sabugueiro-anão, e o Sambucus lanceolata, endémico da Madeira, ou seja, que apenas existe naturalmente nesta Ilha. À mesma família pertencem também o Viburnum trealeasi, que é endémico dos Açores, o Viburnum lantana, muito raro em Portugal, o Viburnum opulus, a que também chamam noveleiro, e o Viburnum tinus, conhecido como folhado e muito usado como arbusto ornamental.

As bagas de sabugueiro são comestíveis e constituem uma importante fonte de alimento para aves e outros animais. São  usadas para produzir sumos, geleias, licores. Apesar de haver a ideia antiga de que algumas bagas podem ser tóxicas, a sua segurança para a saúde humana encontra-se confirmada, pois apesar de conterem um alcaloide tóxico, a quantidade em que ele está presente não apresenta riscos, concluiu a análise efetuada às bagas portuguesas no âmbito do projeto Sambucus Valor.

Especialmente importantes para os polinizadores, as flores servem também para aromatizar bebidas e para fazer infusões, além de serem, elas mesmas, comestíveis.

As folhas, flores e bagas podem ser usadas para produzir corantes e têm características medicinais, sendo tradicionalmente usadas para tratar diabetes, cólicas, diarreias, queimaduras, inflamações, entre outros males.

Sabugueiro: uma espécie versátil e viável em terrenos marginais

A área de distribuição natural do sambucus nigra é difícil de definir porque o sabugueiro foi amplamente cultivado ao longo da história devido ao interesse nos seus frutos.

Considera-se que é uma espécie nativa da Europa central e oriental (que cresce naturalmente desde a Escócia e sul da Escandinávia até à Grécia), da Ásia ocidental e norte de África. No entanto, a sua longa história de cultivo tornou-o comum noutros locais do mundo – na América do Norte, por exemplo – onde se tornou uma espécie naturalizada.

Em Portugal, o sabugueiro cresce espontaneamente um pouco por todo o país, sendo mais expressivo a Norte do rio Tejo, em zonas de baixa e média altitude (é pouco comum acima dos mil metros de altura).

É considerada uma espécie ripícola, ou seja, uma espécie dos habitats associados às margens de cursos de água, que ocorre também de forma dispersa nos limites dos bosques húmidos. Em ambientes mediterrânicos, surge ainda na base de vales, mesmo que distantes de cursos de água.

Bem-adaptada às condições do nosso país, consegue crescer em solos pobres, indiferente à sua natureza mineral, e com diferentes condições climáticas. É resistente ao frio e tolera alguma sombra, embora dificilmente resista à seca ou ao encharcamento. Ainda assim, o sabugueiro desenvolve-se melhor em solos ricos, soltos e húmidos, de locais frescos e ensolarados.

Distribuição do sambucus nigra

Sendo uma espécie versátil, com algumas características de espécie pioneira, cresce e pode ser plantada em zonas marginais, como uma alternativa e complemento às culturas agrícolas, agroflorestais e silvopastoris, em áreas onde outras espécies mais exigentes têm dificuldade em subsistir. Não é, por isso, incomum, ver sabugueiros ao longo de caminhos, em sebes e bordaduras de campos agrícolas e até em quintais abandonados.

A sua cultura beneficia de invernos frios, que favorecem a floração, e de verões quentes, que aumentam o teor de açúcar das bagas. Como a sua floração é relativamente tardia, entre abril e agosto, as geadas já não costumam afetá-la, mesmo nestas zonas de invernos rigoroso. Por outro lado, os frutos amadurecidos depois de verões quentes, como os que temos em Portugal, beneficiam de maior teor de açúcar ao qual correspondem valores superiores dos compostos bioativos com benefícios para a saúde.

O cultivo e as variedades de sabugueiro para produção de baga

É também no Norte do país que a plantação de sabugueiro é mais expressiva, com a área desta cultura a estender-se por pelo menos 400 hectares, 80 dos quais em regime de monocultura. Estima-se que existam cerca de 600 produtores, com uma área média de exploração inferior a um hectare.

A região vitivinícola Távora-Varosa, entre o Douro e o Dão – abrangendo os concelhos de Tarouca, Tabuaço, Moimenta da Beira, Armamar e Lamego – é a que tem mais área de plantação de sabugueiro, embora já existam várias outras zonas de cultivo dispersas no território.

A plantação pode ser feita com varas provenientes da poda, ou seja, com os ramos cortados que, uma vez colocados na terra, voltam a ganhar raízes. Para obter estas varas deve privilegiar-se o corte de ramos que produziram fruto nesse ano, deixando no arbusto as varas novas, que os irão produzir no ano seguinte.

A espécie pode ser cultivada em sequeiro, mas vê a produtividade da sua baga incrementada em cerca de 30% pela rega. Neste caso, tem de se evitar o encharcamento, que é prejudicial.

A data mais adequada para a apanha do fruto é aquela em que as bagas contêm maior teor de açúcares, um conhecimento que pode ser apoiado pela utilização de um refratómetro, aparelho que ajuda os produtores a estimar este teor e a programar a data de colheita mais adequada para obter bagas de melhor qualidade.

Embora o sabugueiro possa viver cerca de 35 anos, o seu tempo de produção é relativamente menor – cerca de 20 anos -, já que só a partir do terceiro ano se colhem as primeiras bagas e são necessários mais dois para alcançar o pleno rendimento. Uma boa produtividade do sabugueiro pode variar entre os oito e os 12 quilogramas de baga, por pé.

A produção média em Portugal ronda as 2000 toneladas de baga fresca, a que acrescem 400 toneladas de baga desidratada e 400 toneladas de flor fresca. Em 2023, devido à falta de chuva, a produção ficou-se pelas 500 toneladas de baga. O valor médio do quilograma de baga fresca é de 50 cêntimos, o da baga desidratada de 3 euros e o da flor é 5,50 euros.

Em Portugal, destacam-se três cultivares (variedades de cultivo) de entre 17 identificadas: Sabugueira, Bastardeira e Sabugueiro, indica o livro “A cultura do sabugueiro”. Embora não se conheça a origem destas cultivares, admite-se que sejam variedades silvestres, selecionadas e postas em produção, eventualmente em mistura com alguma variedade melhorada e procedente do exterior.

– Sabugueira: Variedade temporã, ou seja, precoce na maturação. As folhas têm forma ovalada, com o extremo aguçado (lembrando uma lança) e tom verde-claro. A medula das varas ocupa praticamente todo o diâmetro. Os cachos têm o pé branco e a baga pode medir em média 0,72 centímetros de comprimento e 0,68 de diâmetro.

– Bastardeira: Variedade média quanto à maturação. As folhas são lanceoladas (lembrando uma lança), de tom verde-claro. A medula das varas é idêntica à anterior. Os cachos têm o pé arredondado com estrias e a baga pode atingir 0,85 centímetros de comprimento e 0,75 de diâmetro.

– Sabugueiro: Variedade tardia quanto à maturação. As folhas são ovaladas e de tom verde-escuro. A medula das varas ocupa aproximadamente 70% do seu diâmetro. Os cachos têm o pé avermelhado e as bagas atingem os 0,65 centímetros de comprimento e 0,5 de diâmetro.

Globalmente, a procura por bagas do sabugueiro (não apenas de Sambucus nigra) tem vindo a aumentar. Estima-se que o valor do mercado mundial de produtos que as integram tenha passado de cerca de 500 milhões para 600 milhões de dólares entre 2017 e 2022, e a previsão é de que continue a reforçar-se, podendo representar 267 milhões de dólares adicionais em 2027.

– Tradicionalmente, as bagas de sabugueiro foram usadas para dar cor ao vinho?

Esta prática foi há muito proibida. Na primeira metade do século XVIII, a procura por Vinhos do Porto era tão grande que levou muitos produtores a usar a baga de sabugueiro para dar cor a vinhos de fraca qualidade que, depois desta coloração, eram vendidos como genuínos. Por isso, o Marquês de Pombal proibiu o cultivo de sabugueiro e, na tentativa de acabar com as adulterações, os sabugueiros foram arrancados a tal escala que a espécie quase foi erradicada, ficando, na altura, em vias de extinção em Portugal.

– As bagas de sabugueiro contêm elevadas quantidades de compostos fenólicos (flavonóides)?

Estes compostos estão associados à prevenção e tratamento de doenças crónicas devido às suas propriedades antioxidantes. Adicionalmente, 10 gramas de baga desidratada são suficientes para satisfazer 28% das necessidades diárias de fibra e manter o sistema digestivo a funcionar de forma eficiente. Por lhe serem reconhecidos estes e outros benefícios, as bagas das diferentes espécies de sabugueiro têm como principal aplicação, a nível global, os produtos de saúde e bem-estar. A indústria das bebidas vem a seguir e a alimentar em terceiro lugar.

O nome científico Sambucus poderá relacionar-se com instrumentos musicais antigos que usavam a madeira de sabugueiro?

Pensa-se que o nome Sambucus possa derivar do grego “sambike” ou grego antigo “sambúkē”, um instrumento musical fabricado com os ramos do sabugueiro aos quais era removida a medula, ou do latim “sambuca” (que poderá vir do grego “sambýk”,), que era inicialmente o nome dado a um instrumento musical de cordas (tipo harpa) de origem Asiática e depois também a instrumentos de sopro. Já o nome específico latim “nigra” refere-se à cor negra das drupas maduras.

Os ramos do sabugueiro eram usados antigamente para criar “brinquedos”?

Como a medula se consegue extrair dos troncos com relativa facilidade, os troncos ocos eram usados para fazer flautas e zarabatanas com que os mais novos brincavam.

*Artigo em colaboração

Bruno Cardoso e licenciado em Política Social, pelo ISCSP – Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, e Presidente da Inovterra, além de ser produtor de sabugueiro e responsável pelos intercâmbios que mobilizam centenas de jovens anualmente para Tarouca.