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Cultura e Floresta

8 provérbios sobre a floresta e o que nos transmitem

Condensam observações, saberes antigos, experiências práticas ou lições de vida e são, normalmente, expressões curtas com significados que vão muito para além do seu sentido literal. Falamos dos ditados e, neste caso, dos provérbios sobre a floresta, que se tornaram parte da nossa cultura e sabedoria popular.

Quem vive nas cidades talvez não conheça muitos provérbios sobre a floresta, mas há uma série de frases e ditados que, de tanto repetidas, se tornaram parte deste património oral, transmitido de geração em geração.

Não se sabe quem os disse pela primeira vez, nem em que contexto, mas todos estes provérbios trazem consigo ideias que nos convidam a refletir para além da floresta, sendo metáforas de força, resistência ou verticalidade.

Eis oito destes provérbios sobre a floresta, numa seleção de José Neiva Vieira, um apaixonado e divulgador da floresta e da história florestal que, além de ter dedicado a sua vida profissional aos Serviços Florestais em Portugal, colecionou conhecimentos e memórias, criando um imenso acervo particular com estes e muitos outros registos da cultura florestal nas suas diferentes dimensões.

Tome nota e descubra os seus significados.

“O maior carvalho saiu de uma bolota”

A bolota é tão pequena que pode parecer insignificante, mas guarda em si o potencial de uma grande árvore.

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Além de ser um dos provérbios sobre a floresta tipicamente portuguesa (neste caso, as florestas de carvalhos, com árvores que pertencem ao género botânico Quercus), esta é uma forma de ilustrar como grandes realizações podem nascer de algo pequeno, sugerindo que é necessária paciência e perseverança.

Esta é também uma forma de nos alertar para não negligenciarmos as pequenas coisas da vida, pois, quando acarinhadas, podem tornar-se grandiosas como os maiores carvalhos.

“Não há madeira sem nó”

Todas as madeiras, mesmo as mais nobres, têm irregularidades naturais, como os veios, o grão ou o fio, que fazem parte da sua composição e estrutura. Algumas dificultam o trabalho dos carpinteiros ou marceneiros, mas são essas imperfeições que lhes dão a sua originalidade.

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Este sentido literal pode ser extrapolado para nos recordar que não existem pessoas perfeitas – mesmo as melhores pessoas têm defeitos e podem falhar – nem progresso sem obstáculos.

Os problemas ou falhas com que nos deparamos nas pessoas e na vida existem naturalmente. Aceitá-los, aprendendo a viver com eles, ou ultrapassá-los, caminhando para os objetivos traçados, faz parte do processo de crescimento.

“Árvore velha não é fácil de arrancar”

O passar dos anos contribui para o estabelecimento de um sistema de raízes mais estruturado, pelo que que se torna mais difícil remover uma “árvore velha” pela raiz.

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As árvores, tal como as pessoas e as instituições, tendem a reforçar o seu enraizamento e, depois de muito tempo, torna-se mais difícil mudá-las.

É isto que nos diz este provérbio, ensinando-nos que aquilo que está mais solidamente estabelecido é mais difícil de mudar, seja arrancar uma velha árvore, alterar o modo de trabalho de uma instituição antiga ou transformar um preconceito social há muito enraizado.

“De ruim madeira sai, às vezes, boa cavaca”

No sentido literal, o provérbio indica que, mesmo de um tronco ou tábua que parece não ter qualquer valor, pode obter-se boa lenha (cavaca), por exemplo, para nos aquecermos. A metáfora aplica-se tanto a materiais e objetos como a situações de vida que, apesar de parecerem pouco promissoras, podem ser valorizadas.

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No conceito de economia circular, esta é uma ideia a reter, para reduzir o desperdício, reutilizar e promover uma utilização das matérias-primas em cascata de valor, ou seja, privilegiando uma sequência de aplicações com valor decrescente. No caso da madeira, a última utilização seria o aproveitamento da madeira (da cavaca) para produção de energia.

“A árvore esconde, muitas vezes, a floresta”

Quando a nossa atenção se foca apenas num detalhe (a árvore), é fácil perdermos a visão do conjunto (da floresta) e de um contexto mais amplo.

Esta visão demasiado afunilada impede-nos, muitas vezes, de olhar para a realidade em toda a sua complexidade ou de abordar os desafios em toda a extensão e perspetivas.

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Este é um dos provérbios sobre a floresta que importa aplicar à própria realidade florestal, para que a encaremos nas suas múltiplas funções – não apenas como um destino de lazer, nem como local de recolha de matérias-primas, nem unicamente como espaço de conservação. Mas a frase extravasa a temática florestal e é um convite para olharmos para qualquer tema nos seus múltiplos ângulos (não apenas no mais óbvio), perspetivando o todo e não apenas uma das partes.

“As árvores morrem de pé”

Metáfora de coragem e resistência, a frase tornou-se familiar em Portugal há já muitas décadas. Decorria o ano de 1966, quando a peça do dramaturgo espanhol Alejandro Casona (assim intitulada), a introduziu nos serões das famílias portuguesas, animadas por um único canal de televisão, em que passavam as noites de teatro – a preto e branco, claro.

“Morta por dentro, mas de pé, de pé, como as árvores” é a frase mais emblemática, já no final da peça, a lembrar aqueles que enfrentam adversidades sem desistir, mantendo a firmeza e a dignidade até ao último momento.

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Esta firmeza caracteriza muitas das árvores que se aproximam do seu final de vida, seja pelo passar do tempo ou, por exemplo, pelo efeito da seca, “teimando” em manter a sua verticalidade até ao final.

“Escrever um livro, plantar uma árvore e fazer um filho”

Esta é talvez a frase mais conhecida desta seleção e, provavelmente, todos já a ouvimos. De tão conhecida, tornou-se proverbial, como metáfora de realização pessoal e de sentido para a vida. Apesar disso, não se conhece a sua origem com exatidão. Alguns atribuem-na ao filósofo e escritor cubano José Martí (1853-1895), outros dizem que traduz uma ideia já patente em escritos religiosos e éticos muito mais antigos.

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Seja qual for o seu autor ou a época em que foi dita, transmite a ideia central de que qualquer vida deve ser plena e construtiva. E, embora a realização pessoal possa passar por outros elementos, neste exemplo ela estrutura-se em três pilares que devem ser entendidos para além do seu sentido literal: nos contributos para a transmissão do conhecimento (simbolizada pelo livro), a renovação da natureza (árvore) e a continuidade da sociedade (filho).

“Uma árvore que cai faz mais barulho do que uma floresta que cresce”

Este provérbio sobre a floresta, que alguns dizem ser de origem africana e outros de origem chinesa, ilustra como uma fragilidade (a árvore que cai) atrai, por vezes, mais atenção do que os aspetos positivos construídos ao longo de toda uma vida (a floresta que cresce).

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É uma frase que apela à identificação daquilo que é realmente importante e que nos faz refletir sobre as nossas prioridades: será que não estamos a dar demasiada atenção aos detalhes negativos, maioritariamente irrelevantes, em vez de valorizarmos os aspetos positivos e estruturais?

Curioso é que, na floresta, uma árvore que cai mantém um elevado valor ecológico. Por exemplo, fornece habitats para muitas espécies e dá um importante contributo para a formação de matéria orgânica que irá reforçar a estrutura e a fertilidade do solo.