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Serviços do Ecossistema

Valor de serviços dos ecossistemas europeus estimado em 234 mil milhões de euros

Um novo relatório, desenvolvido no âmbito do projeto europeu INCA, estimou em 234 mil milhões de euros o contributo que os serviços do ecossistema prestados pelas florestas e outras áreas florestadas, prados, charnecas e matos, áreas agrícolas, rios, pântanos e outros ecossistemas trazem à União Europeia.

Os ecossistemas e serviços por eles fornecidos estão na base da vida no planeta e da atividade humana, tendo um valor essencial para o bem-estar social e para o desenvolvimento da economia. Com esta ideia em mente, o mais recente relatório do projeto europeu INCA sobre contabilidade ambiental estimou que, em 2019, o valor de dez serviços de diferentes ecossistemas da União Europeia ascendia a 234 mil milhões de euros.

Esta estimativa “é comparável ao valor acrescentado bruto gerado pela agricultura e silvicultura (cerca de 224 mil milhões de euros para a UE28” em 2018, refere o relatório “Accounting for ecosystems and their services in the European Union (INCA)”. O mesmo documento considera que o valor dos ecossistemas pode aumentar no futuro, já que a recuperação de ecossistemas degradados pode vir duplicar a contribuição da natureza para a economia e sociedade na União Europeia.

A contabilização do valor dos ecossistemas incluiu as contas referentes a dez serviços, ou seja, os bens e serviços imateriais que a humanidade retira dos ecossistemas. Nas áreas florestais, os benefícios considerados incluem o fornecimento de madeira, o sequestro de carbono, a purificação de água, a proteção contra inundações e o lazer ou uso recreativo.

O documento resume os principais resultados do projeto europeu INCA, lançado em 2015, e que contou com a colaboração de cinco parceiros: Eurostat, Joint Research Centre, Agência Europeia do Ambiente, Direção-Geral do Ambiente da Comissão Europeia e Direção-Geral da Investigação e da Inovação da Comissão Europeia.

O valor dos ecossistemas: 10 serviços avaliados

Esta estimativa de valor compreende um subconjunto dos serviços do ecossistema e é baseada em pressupostos que ajudam a determinar quanto podem valer os serviços providenciados pelos ecossistemas no ano de 2019. Embora seja uma estimativa que tem como base preços de 2019 e um conjunto de serviços de ecossistema mais abrangente do que os valores estimados em 2012 que lhe serviram de base, esta contabilização deve ser encarada como uma “prova de conceito” e deve ser interpretada com cautela. Os valores estimados para cada país dependem dos recursos naturais existentes e da sua valorização por parte da sociedade.

O sistema de contabilização do capital natural baseado nos ecossistemas foi desenvolvido na UE a 28, já que a maioria do trabalho foi realizado antes da saída do Reino Unido.

De acordo com o relatório, em 2012, os ecossistemas da UE geraram um fluxo anual de 172 mil milhões de euros, o qual aumentou significativamente em sete anos, para os 234 mil milhões em 2019, revela agora o relatório “Accounting for ecosystems and their services in the European Union”.

As florestas e outras áreas arborizadas foram responsáveis por quase metade do montante calculado para 2012: mais de 80 mil milhões de euros. O seu principal contributo, acima dos 30 mil milhões de euros, vai para o uso recreativo, seguido da purificação da água, com 15,3 mil milhões, e do fornecimento de madeira, controlo de cheias e sequestro de carbono, valorizados em 14,7, 11,3 e 9,1 mil milhões de euros, respetivamente.

As estimativas para 2019 usaram os valores de 2012 como ponto de partida, atualizando os preços para 2019 e alargando o âmbito do uso recreativo da natureza usado em 2012 (áreas naturais com maior valor localizadas a uma distância máxima de 4 km das áreas urbanas). Por outro lado, foram utilizados preços de carbono mais elevados para refletir o aumento de importância das ações e políticas climáticas tomadas nos últimos anos. Foram ainda considerados mais três serviços do ecossistema: fornecimento de água, purificação do ar e captura marítima de peixes. O fornecimento de água foi estimado tendo como base a água (subterrânea) potável extraída para consumo humano; para a purificação do ar foi considerada a remoção de partículas finas de dimensão inferior a 2,5 micrómetros (mm) ou 0,0025 mm pelas áreas arborizadas; para a captura marítima de peixe foram considerados os valores de peso vivo dos desembarques.

Estimativa provisória de valores de serviços de ecossistemas para UE28 em 2019

Serviço do ecossistemaValor estimado em 2019
(Mil milhões de euros)
Colheitas agrícolas23,145
Fornecimento de madeira16,379
Polinização4,977
Sequestro de carbono13,271
Redução da probabilidade de cheias18,016
Purificação da água61,882
Uso recreativo da natureza80,262
Fornecimento de água4,887
Purificação do ar10,446
Captura marítima de peixes1,042
Total234,307

Fonte: Pilot aggregated EU ecosystem services accounts
Nota: Os valores para 2019 foram estimados com base nos serviços do ecossistema de 2012 relatados no projeto INCA.

O serviço que mais contribuiu para o valor total dos ecossistemas continua a ser o uso recreativo da natureza, mais de 80 mil milhões de euros num total de 234 mil milhões, seguido pela purificação da água, com um valor de cerca de 62 mil milhões de euros.

Os dois países que mais contribuem para o total da UE28 – Alemanha e França – são também os países cujo sector da silvicultura e exploração florestal cria mais Valor Acrescentado Bruto (VAB) na Europa, o que pode explicar o peso que os serviços relacionados com as áreas florestais têm – fornecimento de madeira, sequestro de carbono, purificação da água e uso recreativo da natureza.

Olhando para os dados de Portugal, o serviço com valor mais elevado é o uso recreativo da natureza, cerca de 2,3 mil milhões de euros (54% do valor total dos serviços dos ecossistemas do nosso país), seguindo-se o fornecimento de madeira, com um valor de 480 milhões de euros (11% do valor total do país) e o sequestro de carbono, responsável por 344,7 milhões de euros (8% do valor total do país). Se juntarmos a estes serviços a redução da probabilidade de cheias e a purificação do ar, as florestas e áreas florestadas estão relacionadas com 75,2% do valor total dos serviços dos ecossistemas no nosso país, reforçando uma vez mais o seu importante papel.

Contribuição de cada país para estimativa de valores de serviços de ecossistemas

Valor estimado em 2019 - milhões de eurosSequestro de carbonoRedução da probabilidade de cheiasUso recreativo da naturezaColheitas agrícolasFornecimento de madeiraPolinizaçãoFornecimento de águaPurificação do arCaptura marítima de peixesPurificação da águaTotal
Áustria12810811187211548128106114-13484852
Bélgica967861441305212324411323214267306
Bulgária19575166458426832211222673121
Chipre16-90-3040256172
Rep. Checa1854841179613879433635-4603915
Alemanha1605416617289380528424697532843-3953943310
Dinamarca11324133349721118739619243264
Estónia7749380134208544253917
Grécia9538102067282319631-12152820
Espanha1111537555811555427984621056280584617345
Finlândia122690096526617941864401-48156449
França19532595884036011532668727296883920132168
Croácia17958300-926219814247978
Hungria138197343810981621182312-2915476
Irlanda94176503120128139773612232397
Itália82654481601008708324101111251751280326685
Lituânia312217598163445865-12761830
Luxemburgo14185101-272120-146486
Letónia2003911875092869552581652
Malta0-26--01031848
Países Baixos6211341831491104321195186424736692
Polónia11161556553315541724367863341108713358
Portugal3457723251184802105122436514322
Roménia76324930731983607404236322977466
Suécia12081476191637721303414493410182010048
Eslovénia15511730829110311541184953
Eslováquia2031342089245177111412-1783063
Reino Unido85577289291466219411725399257918223214
Total13271180168026223145163794977488710446104261882234307

Variações nos ecossistemas ao longo do tempo

Destinado a um público abrangente, desde investigadores a responsáveis pelo desenvolvimento de políticas, o relatório “Accounting for ecosystems and their services in the European Union” foca também algumas das principais mudanças que ocorreram no uso do solo e condições dos respetivos serviços do ecossistema nos últimos anos:

  • Em 2018, terras agrícolas e áreas florestais representam cerca de 72% da área total considerada, aproximadamente 4,4 milhões de quilómetros quadrados. Cada uma destas ocupações de solo representa aproximadamente 1,6 milhões de quilómetros quadrados (cerca de 36% da área total);
  • Dos restantes tipos de ecossistemas, apenas a área de prados excede os 500 mil quilómetros quadrados, ou seja, cerca de 11% da área total;
  • Os ecossistemas urbanos ocupavam 222 mil quilómetros quadrados em 2018 (cerca de 5%), com os restantes ecossistemas terrestres a variarem em extensão entre aproximadamente 60 mil e 180 mil quilómetros quadrados;
  • A extensão das águas marinhas e de transição é de aproximadamente 25 mil quilómetros quadrados.
  • De modo geral, entre 2000 e 2018, os vários ecossistemas apresentam variações reduzidas na sua extensão, com exceção dos ecossistemas urbanos que registaram um incremento de 5,8%, sobretudo em regiões com grandes áreas costeiras (por exemplo, o Mar Mediterrâneo), em virtude do desenvolvimento em torno do turismo;

Relativamente às condições dos diferentes ecossistemas, refira-se a apreciação feita neste documento relativamente às áreas florestais, agrícolas, rios e lagos:

Florestas

  • Os níveis de nutrientes (como o azoto e o fósforo) acumulados nos cursos de água que induzem o crescimento de algas e plantas aquáticas, reduzindo a sua qualidade (eutrofização), as concentrações prejudiciais de ozono e a acidificação estão a diminuir nos países da UE28, mas os níveis absolutos destes poluentes ainda são elevados e há uma grande probabilidade de deterioração contínua destes ecossistemas;
  • Entre 2010 e 2020 aumentou a pressão resultante dos efeitos das alterações climáticas nas florestas, um fenómeno evidente, entre outros fatores, pelo aumento da evapotranspiração nas florestas e pela diminuição da precipitação efetiva, nomeadamente na região mediterrânea;
  • Uma tendência que gera particular preocupação é o nível estimado de desfolha. Na EU28, em 2017, o nível médio de perda de folhagem das árvores foi de 21,7%, uma percentagem que está a aumentar;
  • A densidade da área florestal permaneceu praticamente constante desde 2010.

 

Zonas agrícolas

  • A biodiversidade de aves comuns e borboletas nas terras agrícolas apresenta uma tendência decrescente, entre 2010 e 2017, após uma perda de mais de 30% entre 1990 e 2010;
  • Os solos agrícolas têm vindo a perder carbono orgânico entre 2010 e 2017, a uma taxe de -0,4% por década.

 

Rios e lagos

  • A qualidade química dos rios e lagos está a melhorar em toda a UE, com as concentrações de poluentes como azoto e fósforo a diminuir;
  • Mais de 60% da rede de rios europeus tem o seu fluxo regulado por barragens;

 

O crescente aumento da população, da urbanização e do consumo estão a exercer uma maior pressão sobre os ecossistemas e os serviços que prestam. Neste sentido, a nova Estratégia de Biodiversidade para 2030 da União Europeia tem como objetivo colocar a biodiversidade da Europa numa trajetória de recuperação até 2030, em benefício das pessoas, do clima e do planeta.

Integrar o capital natural nas Contas Económicas Europeias

Apesar do papel crucial dos ecossistemas e dos seus benefícios para a economia e a sociedade, existe ainda um caminho a percorrer para estabelecer um padrão para avaliar a extensão, condição e mudança dos ecossistemas ao longo do tempo, bem como a quantidade de serviços que esses ecossistemas fornecem.

A contabilidade de ecossistemas é um campo emergente que visa abordar essa lacuna e fornecer uma orientação acordada internacionalmente para medir e registar alterações nos ecossistemas e nos seus serviços de forma consistente e comparável.

A Comissão Europeia vai propor a revisão do Regulamento das Contas Económicas Europeias do Ambiente para alargar a sua cobertura e incluir um novo módulo sobre a contabilidade do capital natural, compatível com o enquadramento das Nações Unidas. Esta medida está em consonância com a recomendação do Tribunal de Contas Europeu e a recente revisão intercalar da Estratégia Europeia para as Contas Ambientais (ESEA) 2019-2023 e pode posicionar a Europa no primeiro continente do mundo a reportar mudanças nos ecossistemas e nos seus serviços.

Em 2021, a Comissão apresentará uma proposta que estabelece objetivos de restauração vinculativos para diferentes tipos de ecossistemas. As contas sobre o valor dos ecossistemas são uma ferramenta útil para monitorizar o impacto dessas ações.