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Solo

Solo, a “pele” do planeta que a floresta protege

O solo é a camada superficial do nosso planeta. Apesar de desempenhar funções ambientais, sociais e económicas essenciais à vida na Terra, nem sempre lhe é reconhecido o devido valor. Conheça a grande diversidade de solos no planeta e o papel essencial que as florestas desempenham na conservação deste recurso finito e não renovável.

A palavra solo deriva do latim solum, que significa terra ou chão. Ainda hoje a expressão “solo da casa” é usada nalgumas zonas do interior do país. Para a maioria das pessoas, o solo é apenas um suporte físico, mas existem diferentes perspetivas sobre esta associação de partículas rochosas, material orgânico, ar e água que reveste a camada superficial do planeta. Por exemplo, para o geólogo é um conjunto de partículas soltas que existem sobre o material rochoso originário; para o agricultor é o substrato essencial para a produção de alimentos; e para o engenheiro civil é uma camada superficial cujas características físicas devem ser cuidadosamente avaliadas como material ou suporte para a construção de diferentes estruturas. De facto, o solo é tudo isto e muito mais.

O solo é a “camada superior da crosta terrestre, formada por partículas minerais, matéria orgânica, água, ar e organismos vivos” e “constitui um interface entre a terra, o ar e a água e aloja a maior parte da biosfera”, define a Estratégia Temática de Proteção do Solo da União Europeia. Nesta ampla perspetiva, é a camada superficial do nosso planeta; uma espécie de “pele” viva que respira, que afeta e é afetada pelas interações entre a atmosfera, o clima, a vegetação, os animais e a geosfera (as rochas e sedimentos que formam as camadas superficiais da crosta terrestre).

Composição do solo

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Além de ser também um importante reservatório de biodiversidade, que funciona como um órgão fundamental na sustentabilidade do planeta, a referida Estratégia Temática relembra também uma outra característica importante: o solo é um recurso finito, limitado e não renovável. As suas taxas de formação e regeneração são muito longas se pensarmos à escala de tempo humana. Por exemplo, a formação de cerca de 30 cm de solo pode levar entre mil e 10 mil anos, dependendo do local. Ou seja, a atividade humana tem vindo a exercer maior influência na sua exploração e menos na sua formação.

A diversidade do solo no mundo

A superfície da Terra – a crosta terrestre – reflete um equilíbrio dinâmico entre forças provenientes do interior do planeta (endógenas) e aquelas que têm origem no exterior (exógenas), referentes à interação entre ar, água, organismos e rochas (atmosfera-hidrosfera-biosfera-litosfera). Processos como tremores de terra, atividade vulcânica, alteração, desagregação e transporte de materiais pelo ar, água ou gelo vão desintegrar, arrastar e redistribuir rochas e sedimentos que vão ficar à superfície, influenciando a formação e a tipologia do solo.

Na realidade, o solo resulta da ação e interação de vários fatores de formação: rocha-mãe (material de origem), clima, organismos, relevo e tempo. O clima (com destaque para a temperatura e a precipitação) e os organismos atuam sobre o material de origem numa determinada condição de relevo, transformando-o em solo com o decorrer do tempo. Estes processos originam diferentes tipos de solo, sendo cada um caracterizado por uma sequência de camadas (horizontes), com determinadas propriedades morfológicas, físicas, químicas e biológicas.

Perfil do solo

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O perfil do solo – um corte vertical no terreno – permite estudar o conjunto dos horizontes do solo, desde a superfície até ao material de origem.

Temos, por isso, uma grande diversidade de solos no mundo. Geralmente cada país adota um sistema nacional para os classificar. Todavia, a FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura e a IUSS – International Union of Soil Sciences desenvolveram um sistema internacional de classificação de solos: o WRB – World Reference Base for Soil Resources).O WRB compreende 32 grupos de solo no seu nível de categoria mais elevado, que se combinam, num segundo e terceiro níveis, com diferentes qualificadores, originando centenas de tipologias. A base de dados mundial harmonizada (Harmonized World Soil Database) contém mais de 15 mil unidades diferentes.

Essencial ao funcionamento dos ecossistemas

Para além do papel de suporte à produção agrícola, florestal e agro-silvo-pastoril e de fonte de matérias-primas para atividades humanas – da olaria à construção civil e conservação de património geológico e arqueológico -, o solo tem outras funções ecológicas nos ecossistemas, nomeadamente como:

. Importante reservatório de carbono;
. Regulador hídrico (permite a infiltração, escoamento superficial, distribuição e qualidade da água da chuva);
. Reservatório orgânico e mineral de elementos essenciais para as plantas e outros organismos que dele dependem;
. Base de biodiversidade (em termos de habitats, espécies e genes).

Depois dos oceanos, o solo constitui um dos maiores reservatórios de carbono do planeta. Aumentar o armazenamento líquido do carbono no solo representa um potencial significativo de mitigação da emissão de gases com efeito de estufa. Neste sentido, durante a Conferência do Clima de Paris (COP21), foi lançado o movimento ”4 per 1000”, com o objetivo de aumentar o stock de carbono no solo em 4‰ (quatro partes por mil) por ano em relação ao teor de 2021, de modo a limitar o aquecimento global.

O solo tem um importante papel ecológico nos ecossistemas florestais. É o recurso que possibilita a produção lenhosa, providenciando nutrientes, água e suporte físico às plantas. As suas características condicionam o tipo de vegetação que suporta. Funciona também como recetor e filtro de substâncias indesejáveis e possibilita a acumulação de materiais orgânicos como folhas, cascas e raízes e a sua transformação em elementos minerais, disponibilizando-os para as plantas. Os solos com maior potencial produtivo são, geralmente, utilizados para a agricultura, e os menos férteis, mais pedregosos e de menor profundidade efetiva, são normalmente usados para a floresta.

Florestas ajudam a proteger o solo

A floresta tem uma ação direta sobre o ambiente, e em especial sobre o solo, capaz de provocar modificações no ecossistema. A cobertura florestal serve-lhe de proteção natural a fenómenos de erosão e evaporação excessiva. A estrutura da árvore evita o impacte direto da água da chuva, protege-o dos raios solares, do vento e das variações bruscas de temperatura. Por sua vez, a presença das raízes melhora a sua estrutura, promovendo o arejamento e a infiltração da água.

As árvores favorecem também o enriquecimento do solo em matéria orgânica e nutrientes, assim como as relações simbióticas entre os organismos que nele vivem – bactérias, fungos e minhocas, entre outros. À superfície, a riqueza vegetal sustenta ainda a vida animal (diversas espécies de mamíferos, répteis, batráquios, aves e insetos), contribuindo para o equilíbrio do ecossistema.

Acresce que, nas florestas, onde o solo habitualmente não é mobilizado durantes longos períodos de tempo, o seu desenvolvimento é beneficiado. Em paralelo, a quantidade de biomassa que é produzida e retida na floresta e a sua reciclagem através da biota do solo, fazem com que os solos de ocupação florestal sejam um dos grandes reservatórios de carbono do planeta.

A aptidão florestal de um solo, ou seja, a sua capacidade de promover a produção silvícola (também conhecida como qualidade da estação), depende das suas características morfológicas e físicas, como profundidade efetiva, textura, compacidade (grau de compactação do solo) e pedregosidade.  São estas características que vão condicionar o crescimento das raízes, determinar o encharcamento (ou não) do solo e influenciar os seus teores de ar e água. Por sua vez, a fertilidade natural do solo vai afetar o teor em matéria orgânica (que tem influência na humidade do solo) e a disponibilidade de nutrientes.

As propriedades do solo influenciam os ciclos da água, dos nutrientes e do carbono, bem como a composição e funcionalidade das comunidades de seres vivos (designadas de biota) que nele habitam, fatores fundamentais para o crescimento das plantas. Num exemplo de economia circular natural, as plantas, e em especial as árvores – pela sua dimensão -, beneficiam os solos, dos quais também dependem.

O solo é um sistema dinâmico e a sua degradação influencia todo o ecossistema. A perda de matéria orgânica e mineral, a redução da biodiversidade e fenómenos de impermeabilização, entre outros, levam à perda da capacidade produtiva e de funcionalidades ecológicas. Embora exista conhecimento sobre os impactes económicos da degradação do solo, os seus custos reais são de difícil quantificação. Um estudo de 2018 tentou determinar os custos diretos da erosão do solo na Europa e chegou a um valor de 1,25 mil milhões de euros só em perdas de produtividade de solos agrícolas.

Na União Europeia, estima-se que 52 milhões de hectares de solo, o correspondente a 16% da sua área total, se encontrem em risco de degradação. Em Portugal, atendendo à geomorfologia da paisagem e especificidade das condições ecológicas das regiões mediterrâneas, parte dos solos apresentam risco elevado de erosão consoante a existência ou não de cobertura vegetal, tipo de uso e práticas de gestão.

A preocupação com a saúde dos ecossistemas florestais deu origem a um programa desenvolvido pela Comissão Europeia e pelo programa ICP Forests – International Co-operation Programme on the Assessment and Monitoring of Air Pollution Effects on Forests que resultou no primeiro levantamento paneuropeu dos solos florestais na década de 1990, abrangendo 28 países. Os resultados mostram uma correlação entre a química do solo e a deposição atmosférica de azoto, acidez e metais pesados, indicando que a poluição atmosférica é um fator de stress para os solos e ecossistemas florestais.

Medidas de proteção a adotar

Atualmente, as atividades de silvicultura florestal incluem várias medidas de proteção do solo, especialmente no que toca à mitigação da erosão. Entre elas incluem-se a preparação do solo em curvas de nível (ou seja, segundo linhas de igual altitude do terreno), a inclusão de faixas de proteção de vegetação natural, as técnicas de cultivo mínimo (preparação do terreno apenas na linha de plantação) e cobertura com sobrantes do corte, a utilização de materiais genéticos adequados, o estabelecimento de plantações com diferentes espécies, a utilização de mosaicos agrossilviopastoris e a redução de queimadas.

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), adotados pelas Nações Unidas em 2015, perspetivam o estabelecimento de sistemas sustentáveis de produção vegetal, o reforço da capacidade de adaptação às alterações climáticas e eventos extremos, a promoção da biodiversidade e o progressivo aumento da qualidade dos solos.

Dado que a humanidade e a economia dependem das várias funções e serviços do solo, o desafio que se coloca à nossa sociedade reside em encontrar um equilíbrio entre o uso que lhe damos como recurso de produção, fonte de matérias-primas e outros serviços do ecossistema.

As Diretrizes Voluntárias para a Gestão Sustentável dos Solos, adotadas em 2016, fornecem recomendações sobre a forma como a gestão sustentada do solo pode ser alcançada e constituem um contributo para atingir os ODS. Indicam 10 objetivos a alcançar para reforçar a capacidade de adaptação aos efeitos das alterações climáticas, melhorar a qualidade do solo, combater a desertificação, promover a recuperação de solos e travar a perda de biodiversidade:

– Minimizar a erosão;
– Aumentar o seu teor de matéria orgânica;
– Favorecer o equilíbrio de elementos nutritivos e o ciclo de nutrientes;
– Prevenir, minimizar e mitigar a salinização/alcalinização do solo;
– Prevenir e minimizar a sua contaminação;
– Evitar e minimizar a sua acidificação;
– Preservar e reforçar a biodiversidade do solo;
– Minimizar a sua impermeabilização;
– Evitar e reduzir a compactação;
– Melhorar a gestão da água no solo.

10 factos e curiosidades sobre o solo 

1. Uma amostra de solo tem, idealmente, 45% de minerais, 25% de água, 25% de ar e 5% de matéria orgânica.
2. O horizonte ou camada mais superficial é o mais rico em matéria orgânica e nutrientes.
3. A formação natural de dois centímetros desta camada superficial pode demorar mais de 500 anos.
4. A distribuição de 10 toneladas de solo num hectare (o equivalente a cerca de um campo de futebol) corresponde a uma camada de um milímetro de espessura.
5. Um hectare de solo pode conter, nalguns casos, até cinco toneladas de organismos vivos.
6. Os organismos decompositores (como fungos e bactérias) promovem a transformação da matéria orgânica no solo em matéria mineral.
7. As minhocas digerem a matéria orgânica, reciclam nutrientes e tornam a camada superficial do solo mais rica.
8. As raízes melhoram a estrutura e o arejamento do solo.
9. Um solo funcional minimiza o risco de inundação e preserva as massas de água subterrâneas, neutralizando e filtrando potenciais poluentes; pode armazenar até 3750 toneladas de água por hectare.
10. Estima-se que, anualmente, o solo capture aproximadamente 20% do carbono emitido para a atmosfera pelas atividades humanas.