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Espécies Florestais

Nogueira: uma árvore de frutos e madeira nobres

Reconhecida há muito pela madeira e pelas nozes, a nogueira é uma das árvores de fruto que se cultiva há mais tempo na Europa. O seu nome científico Juglans regia – que remete para Júpiter, o rei dos deuses na mitologia Romana - revela bem a importância que lhe é atribuída desde a antiguidade. Conheça mais sobre a espécie neste artigo em colaboração com Albino Bento e Maria Patrício.

Conhecida como nogueira, nogueira-comum ou nogueira-europeia, esta é uma espécie há muito plantada, tanto pela sua madeira, cuja qualidade é valorizada no mobiliário, como pelos seus frutos comestíveis e muito apreciados, as nozes.

De nome científico Juglans regia L., em tributo ao rei dos deuses da mitologia romana, pertence ao género Juglans e à família Juglandaceae, a mesma das suas parentes Carya illinoinensis, que tem como fruto a noz-pecã, ou da nogueira-americana (Juglans nigra).

É uma árvore de copa larga e ramificada que pode crescer até aos 25 a 30 metros de altura. Em zonas com clima e solo adequado, tem um crescimento relativamente rápido e uma significativa longevidade, que ronda as três centenas de anos.

As folhas da nogueira são caducas, grandes (cerca de 30 centímetros) e, compostas normalmente por sete subdivisões (folíolos). Em vez de sete, cada folha pode ter entre cinco e nove destas subdivisões, que têm uma forma ovalada, sendo os folíolos terminais habitualmente maiores.

A floração acontece entre abril e maio e esta é uma espécie monoica. Quer isto dizer que cada nogueira tem flores masculinas e femininas. As flores masculinas surgem agrupadas em cachos pendentes (amentilhos), de cor amarela-esverdeada, e as femininas, também amareladas, são mais pequenas, passando por vezes despercebidas no final dos rebentos do ano.

Nogueira

Sabe-se que a nogueira é uma espécie originária de partes do Mediterrâneo e Ásia Central, mas a sua plantação é tão antiga que a sua área exata de distribuição natural continua por determinar. Em Portugal, apesar de ser uma espécie exótica (não nativa do território) adaptou-se bem e naturalizou-se, de tal modo que a consideramos nossa.

Apesar de as flores femininas poderem ser fertilizadas pelo pólen das flores masculinas presentes na mesma nogueira (característica das espécies autocompatíveis), como existe algum desfasamento entre a floração feminina e masculina, parte da reprodução acaba por resultar da fecundação cruzada entre diferentes nogueiras.

O fruto é, sem dúvida, a parte que melhor se identifica na nogueira. A noz é um tipo de drupa, carnuda e de cor verde, que começa a surgir em maio-junho e que vai escurecendo à medida que seca e se desfaz, libertando a noz entre setembro e outubro, altura em que, normalmente, é feita a colheita.

Nogueira
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Os frutos surgem em diferentes partes da copa, consoante a variedade da nogueira cultivada, de acordo com três principais tipos de frutificação: em posição terminal, intermediária e lateral. Na frutificação em posição terminal ou apical, os gomos femininos aparecem nas extremidades dos raminhos do ano anterior e é aí que vão depois formar-se as nozes. Inversamente, há variedades de cultivo (cultivares) cujas flores e frutos surgem em posição lateral, nas axilas de folhas de ramos do ano anterior, e são estas as que apresentam maiores frutificações e frutos mais distribuídos na copa. A posição intermédia é também uma realidade noutras variedades de cultivo.

As variedades de nogueira para cultivo estão classificadas de acordo com as regiões de seleção: variedades francesas, californianas, do Oregon e centro-europeias. De acordo com o Manual para “A cultura da noz”, da AJAP – Associação dos Jovens Agricultores de Portugal, estão indicadas, para o nosso país, as variedades californianas Chandler e Howard ou a também americana Lara, todas combinadas com variedades específicas para serem usadas como polinizadoras.

Nogueira precisa de frio para produzir frutos

A nogueira cresce melhor em locais abrigados, onde o ar é seco no verão e os invernos são frios e chuvosos.

Apesar de precisar de frio durante o inverno, de não dispensar a chuva e de ser tolerante à humidade do ar, é sensível a geadas, principalmente aos gelos repentinos a seguir a um período quente. Estas geadas repentinas são perigosas e podem provocar feridas e mesmo a morte das árvores. Em contrapartida, se as geadas surgirem progressivamente, a nogueira pode suportá-las. A espécie é igualmente sensível a ventos fortes e a temperaturas elevadas, que podem queimar-lhe o tronco.

A nogueira é uma planta exigente em frio durante o inverno: precisa de ter um número mínimo de horas com temperaturas inferiores a 7ºC para produzir frutos. Em média, são necessárias 700 horas de frio, embora algumas variedades precisam de apenas 300. Esta é umas das características desta espécie que pode vir a tornar-se crítica, tendo em conta o menor arrefecimento invernal resultante dos efeitos das alterações climáticas.

A nogueira consegue crescer em solos diversos, demonstrando capacidade de adaptação. Contudo, quanto mais profundos e frescos forem os solos, melhor se desenvolvem as árvores, que são exigentes em sais minerais – particularmente azoto – quando o objetivo é a colheita de fruto. O pH mais adequado situa-se entre 6,5 e 7,5.

Esta espécie não se desenvolve bem em solos compactos, argilosos ou com uma camada impermeável a baixa profundidade, nem em solos arenosos e limosos com má estrutura, pois eles limitam o crescimento das raízes e a circulação de ar, água e nutrientes.

Nogueira
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Solos muito húmidos e encharcados também não são adequados, pois a má drenagem facilita a podridão radicular (causada pelo fungo Armillaria mellea) e aumenta a suscetibilidade à doença da tinta (provocada pelo fungo Phytophtora cinnamomi). Em solos menos profundos, precisa de chuvas bem distribuídas (ou de ser apoiada por rega).

Quando a produção de nozes é o objetivo, em condições favoráveis e com a gestão adequada, a nogueira começa a dar fruto, normalmente, por volta dos sete anos. Aos 10 anos, atingem-se produções de cinco quilos por árvore, quantidade que pode duplicar aos 20. O máximo produtivo, de cerca de 18 quilogramas, acontece entre os 30 e os 50 anos da árvore.

Recorde-se que a nogueira tem sido cultivada de forma intensiva para produção de noz, de forma mais extensiva com a dupla vocação de produzir nozes e madeira, ou na chamada arboricultura de lenho, em que o povoamento é gerido e conduzido apenas para obter madeira de elevada qualidade.

Nogueira: nome de árvore e de madeira de elevada qualidade

Embora seja cultivada principalmente para a produção de fruto, a nogueira produz uma madeira de elevada qualidade, quando é devidamente gerida. Para obter esta maneira nobre, é necessário um investimento de longo prazo – pelo menos 50 anos – e a nogueira tem de ser gerida desde muito jovem, com cortes de formação e desrama, para que se obtenha um tronco longo e limpo, sem defeitos, com pelo menos cinco a seis metros.

Nogueira

A qualidade e raridade da madeira é valorizada no mobiliário desde, pelo menos, o século XVI (Renascimento) e ainda hoje a elevada procura faz com que possa ser comercializada a madeira de árvores isoladas e de pequenos bosquetes. Além da qualidade, a madeira da nogueira tem fácil polimento, o que a mantém atrativa para o fabrico de móveis.

Esta madeira é ainda usada em revestimentos e pavimentação e especialmente apreciada para folheados decorativos, sendo valorizadas as porções mais figurativas, incluindo os cepos. Dela produzem-se também outros objetos de reconhecido valor, incluindo instrumentos musicais, relojoaria e caixas de joias, coronhas de armas de fogo e partes para automóvel de luxo.

Embora seja uma das madeiras mais valiosas das regiões temperadas, as plantações para produção de lenho têm de ser instaladas em locais com boas condições e requerem uma gestão intensiva. Estas condicionantes, aliadas ao longo tempo necessário para que haja retorno do investimento, tornam a opção pelos pomares para produção de fruto mais apetecíveis em termos económicos.

Uma história de cultivo com pelo menos 8 mil anos

A nogueira é uma espécie com uma longa história de cultivo e, devido à ação humana, a sua área de distribuição natural torna-se ainda mais difícil de determinar. Pensa-se que seja nativa de partes do Mediterrâneo e Ásia central, pois cresce como espécie selvagem em florestas mistas desde o sudoeste europeu à India.

As montanhas que integram a cadeia do oeste dos Himalaias – em Caxemira, no Tajiquistão e Quirguistão – são consideradas o centro da origem. Nesta área há populações com características diferentes: árvores altas com troncos direitos (e não ramificados, como habitualmente) e árvores mais baixas, com grandes produções de nozes.

A nogueira é cultivada na bacia do mediterrâneo desde a antiguidade, pelas civilizações gregas e romanas, em zonas agrícolas, bordaduras de campos de cultivo, lameiros e em hortas e pomares. Registos de pólen e cascas encontradas mostram sinais de cultivo em Itália há cerca de seis mil anos e na Anatólia, Grécia e Croácia há cerca de quatro mil anos.

Desde a antiguidade, o cultivo estendeu-se pelo hemisfério norte, pelo que a nogueira pode ser encontrada entre os 30º e 55º de latitude Norte (de Marrocos à Dinamarca, abrangendo grande parte da Europa, Ásia e América do Norte) e no hemisfério Sul entre 30º e 40º latitude (sul da Austrália, Nova Zelândia, África do Sul, América do Sul, nomeadamente no Chile e Argentina).

Distribuição da nogueira na Europa

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Sabia que…

  • O nome científico da nogueira deriva da expressão em latim “jovis glans, a noz de Júpiter/Deus, e “regia”, real. Era considerada uma árvore do rei dos deuses, pela sua produção de nozes e madeira.
  • Pensa-se que o primeiro povo a plantar nogueiras terão sido os Gregos, que as usaram não apenas pelas suas nozes, mas também como remédio e corante. Os Romanos terão seguido o exemplo, elegendo as nozes como um fruto luxuoso e também na Pérsia estariam reservadas à realeza. Nas ruínas de Pompeia, sob a lava do Vesúvio (que entrou em erupção em agosto de 79 d.C) foram encontradas nozes inteiras (sem casca) entre os alimentos presentes à mesa no Templo de Ísis. O mais antigo sítio arqueológico onde foram escavadas localiza-se onde é hoje o norte do Iraque.
  • A designação inglesa para noz, walnut, deriva do inglês antigo walhnutu, que significava noz estrangeira. Não sendo uma espécie original do Norte da Europa, esta designação servia para as diferenciar das nativas avelãs (hazel nuts). O nome latim das nozes, nux Gallica, remetia também para um dos seus locais prováveis de origem, a Gália – hoje França.
  • A nogueira mais velha de que há registo é espanhola e pensa-se que tenha cerca de 530 anos, muito mais do que qualquer outra velha nogueira registada entre as árvores monumentais e do que a longevidade média desta espécie, de cerca de 300 anos.
*Artigo em colaboração

Albino Bento e Maria do Sameiro Ferreira Patrício

Albino Bento é licenciado em Engenharia Agrícola, mestre em Proteção Integrada, doutor em Ciências Agronómicas e agregado em Engenharias Agronómicas, no IPB – Instituto Politécnico de Bragança, de que Professor Coordenador Principal.

A nível internacional e nacional, participou em 52 projetos de investigação e desenvolvimento experimental, publicou 17 livros ou capítulos de livros, 125 trabalhos em revistas com arbitragem científica, 40 trabalhos em atas de congressos e 18 publicações técnicas. Participou ainda na organização de 18 congressos e simpósios com caráter e fez parte da comissão científica de 10 congressos. É Presidente do Centro Nacional de Competências dos Frutos Secos.

 

Maria do Sameiro Ferreira Patrício é licenciada em Engenharia Florestal, pela UTAD -Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, mestre em Produção Vegetal pelo ISA – Instituto Superior de Agronomia (Universidade de Lisboa), e doutorada em Engenharia Florestal mesma instituição. Docente da Escola Superior Agrária, do Instituto Politécnico de Bragança, desde 1990, é responsável de unidades curriculares como Silvicultura Geral, Silvicultura Avançada, Legislação e Certificação Florestal, Produção de Biomassa e Bioenergia, Dendrometria e Inventário Florestal, Recursos e Tecnologia dos Produtos Florestais, Silvicultura Tropical e Atividades Agrárias.

Participou em vários projetos de investigação e desenvolvimento experimental com carácter nacional ou internacional e tem artigos publicados em revistas com arbitragem científica. Integra ainda a área “Ecology and Silviculture of Chestnut” na IUFRO – União Internacional de Organizações de Pesquisa Florestal, e é investigadora do CIMO – Centro de Investigação da Montanha, e do SusTEC – Laboratório Associado para a Sustentabilidade e Tecnologia em Regiões de Montanha.